23 de novembro de 2011

Livro III - O Que Acontece Quando Morremos (Dr. Sam Parnia)

"Of course it is happening inside your head, Harry, but why on earth should that mean that it is not real?" J. K. Rowling, em "Harry Potter and the Deathly Hallows"

O Dr. Sam Parnia é conhecido pesquisador da área médica, especialista em cardiologia, com uma grande virtude: tem interesse declarado pelas ocorrências de 'experiências de quase morte' (EQM ou NDE - ver vocabulário abaixo para os termos comumente usados em inglês). Em seu livro 'O que acontece quando morremos - Um estudo sobre a vida após a morte', ele nos fornece um relato interessante de suas primeiras pesquisas no fascinante mundo das experiências de quem esteve a um passo de se encontrar com a 'morte', mas voltou para nos contar como é.

Embora o subtítulo sugestivo da edição em português 'um estudo sobre a vida após a morte', o livro é, em essência, uma introdução ao tema discorrendo de forma paralela como um relato em primeira pessoa do interesse do autor pelo assunto. A 'vida após a morte' aqui é uma referência ao curto estado em que passam determinados pacientes em coma profundo que descreveram posteriormente NDEs. Do ponto de vista espírita, uma EQM é um evento de desdobramento espontâneo causado pela parada cardíaca que revela de forma independente a natureza dual do ser humano.

Divisão de capítulos

O livro está dividido nos seguintes capítulos: 1 - Experiências de quase morte: da antiguidade aos dias atuais; 2 - Organizando o estudo de Southampton; 3 - Como é morrer?; 4 - Paradoxo científico; 5 - Compreendendo a mente, o cérebro e a consciência; 6 - Os ingredientes da vida; 7 - Isso é real; 8 - A Horizon; 9 - Implicações para o futuro. 

Faremos alguns comentários breves sobre alguns capítulos, enfatizando o que acreditamos ser mais relevante no que é apresentado pelo Dr. Parnia. O Capítulo 1 é, na verdade, uma introdução ao assunto, revelando que, desde cedo (adolescência), o autor teve grande interesse pelas questões relacionadas à "tanatologia". Há poucos relatos de NDE em 'casos da antiguidade' conforme relatado no Capítulo, exceto por uma citação de Platão (*). Os exemplos históricos de eventos de NDE fornecidos são muito mais recentes.  Mas o Capítulo 1 não deixa de ser interessante, pois o autor faz um resumo das teorias existentes para explicar as NDEs. Antes disso, convém apresentamos grosso modo uma visão cética sobre o assunto:
Todas as sensações de espiritualidade que sentimos ocorrem na mente. Os cientistas já provaram esse fato, e afirmam que isso tudo não passa de reações químicas, falta de oxigênio ou qualquer outro distúrbio mental que provoca alucinações, sensações de expansão da consciência, e outras variedades dos chamados " fenômenos espirituais; sendo assim, a viagem para fora do corpo poderia ser explicada como um fenômeno mental....também! (retirado da Internet: ver Blog 'Crônicas do Frank')
Para essa crítica, 'todas as sensações de espiritualidade que sentimos ocorrem na mente'. E as sensações "reais" ocorrem onde? Para muitos que não conseguem ver o problema de forma mais profunda, elas ocorrem no mundo externo... Para sabermos se os cientistas "estão realmente provando isso" convém consultarmos Parnia. Ele relaciona nos seguintes grupos as explicações chamadas 'ortodoxas' para o fenômeno:
  • Teoria das alucinações;
  • Teoria do cérebro moribundo (depleção de oxigênio);
  • Teoria do dióxido de carbono;
  • Teoria das drogas (e seus efeitos);
  • Teoria dos receptores químicos do cérebro;
  • Teoria da epilepsia do lobo temporal;
  • Teorias psicológicas;
Se existisse qualquer consenso aceito para o fenômeno, então não haveria tantas explicações propostas. O conjunto de 'explicações não ortodoxas' (na verdade só existe uma) é chamada por Parnia de 'teorias transcendentais'. Trata-se daquela que postula a continuidade da vida após a morte e que explica as NDEs como relatos de experiências reais passadas pelo indivíduo (NDEr).  Das explicações acima, a mais aceita nos meios acadêmicos (e que constantemente se vê colocada como uma 'explicação' para os fenômenos pela grande mídia) é a 'teoria do cérebro moribundo' que supostamente explica a NDE como efeito de falta de oxigênio. Entretanto, Parnia vai a fundo na questão e pondera:
Do ponto de vista médico, a falta de oxigênio é um problema corriqueiro num hospital. Muitos médicos operando em emergência deparam com o problema frequentemente, particularmente com pacientes cujos pulmões ou corações não estão funcionando muito bem, por exemplo, em casos de asma ou falência cardíaca. Cuidei de mais de 100 pacientes com falta de oxigênio. Quando os níveis caem, os pacientes ficam confusos e bastante agitados. Esse 'estado agudo de confusão', como é conhecido na medicina, é muito diferente da experiência de quase morte. (Parnia, 2008, p. 44)
Parnia argumenta que as 'teorias químicas do cérebro' (todas baseadas em alguma modificação severa nos níveis de substâncias presentes no tecido cerebral, seja oxigênio, drogas, receptores químicos etc) não são boas explicações porque elas não preveem as condições em que os NDE ocorrem. Em outras palavras, eventos de NDE não são observados costumeiramente quando essas condições estão presentes. Experiências de quase morte são eventos singulares, únicos, imprevisíveis, mas com estatística de ocorrência alarmante para serem desprezados. De nossa parte nos perguntamos: será que isso demonstra que os NDE não são produzidos apenas a partir de condições endógenas (e. g. parada cardíaca etc) mas também exigem fatores externos (independentes do indivíduo) para acontecer? Isso certamente explicaria a aleatoriedade dos eventos.

Quanto às 'teorias psicológicas', elas se aglomeram em torno da tese de que as experiências seriam supostamente produzidas pela mente como resposta a uma situação potencialmente traumática. Para lidar com a situação, o cérebro supostamente inventa toda cadeia de eventos relatados pelos paciente que passa por uma NDE. Parnia chama a atenção que muitas teorias simplesmente partem do pressuposto de que os relatos são invenções e alucinações, descartando anomalias observadas durante as ocorrências. 

O Capítulo 2 (Organizando o estudo de Southampton) é uma descrição algo irônica das dificuldades de se estudar esse tipo de fenômeno na prática. Nesse capítulo, Parnia descreve com humor sua tentativa frustrada de iniciar um estudo das EQM por meio de cartazes fixados em salas de UTI no hospital de Southampton. A ideia é que, se as visões de NDErs forem reais (no sentido de se referirem a eventos externos), eles seriam capazes de ver e descrever posteriormente o que está escrito nesses cartazes, fixados de forma que os dizeres se voltam para o teto. A narrativa de Parnia mostra que um estudo considerado minimamente 'científico' exige tratar  fatores que vão muito além daqueles disponíveis quando se manipulam coisas simples de laboratório. Esse é mais um exemplo que mostra que a chamada 'metodologia científica', se exportada ou extrapolada sem modificações e cuidados, nunca irá funcionar de forma satisfatória. A cada fenômeno, um método.

Relatos infantis de EQMs

No Capítulo 4 (paradoxo científico), Parnia descreve vários relatos de crianças (com idade que pode chegar a 6 meses de vida) que passaram por experiências de quase morte. Esses são, para mim, os relatos mais impressionantes.  Em muitos desenhos feitos posteriormente, é possível ver que a criança reproduz a situação de se ver a si própria fora do corpo, em outro corpo e de se encontrar com outros seres ou pessoas, gente 'morta' como elas mesmas relatam posteriormente.
Desenho infantil como um relato de uma EQM. É possível ver como a criança se vê, 
estendida sobre a mesa e flutuando acima dela. Fonte: HubPages.
No que consiste esse 'paradoxo científico' ? O Dr. Richard Mansfield, colega de Parnia, nos conta um caso de um paciente que sofreu parada cardíaca por mais de 20 minutos e permaneceu por 15 minutos totalmente sem assistência de ressuscitação. Segundo Mansfield:
Quando o vi, ele me contou que tinha visto tudo de cima e descreveu em detalhes absolutamente tudo o que aconteceu. Disse tudo o que eu tinha dito e feito, como checar seu pulso, decidir parar com a ressuscitação, sair do quarto, voltar depois, olhar para ele, checar novamente seu pulso e não recomeçar o processo de ressuscitação. Ele contou todos os detalhes de forma correta e precisa, o que era impossível, uma vez que não apenas ele estava sob parada cardíaca, e não possuía pulso durante a parada, mas sequer estava sendo ressuscitado por cerca de 15 minutos depois. O que ele me contou realmente me arrepiou, e até hoje eu nunca havia contado a ninguém porque sabia que não conseguiria explicar...  (Parnia, 2008, p. 103) 
De outra forma, se a consciência é produto da atividade cerebral, como pode alguém ficar privado de oxigênio por quase meia hora e se lembrar de detalhes durante o ocorrido? Se a consciência é simples produto de atividade de circuitos neuronais, como alguém pode ter consciência perfeita de acontecimento quando seus circuitos neuronais sequer tem energia para cumprir os processos primitivos de controle metabólico? O paradoxo está na consciência anômala adquirida pelo paciente quando da parada cardíaca, consciência que se manifesta inclusive como total ciência, visão e audição dos eventos ao redor, produzindo informação verificável. Portanto, na medida em que se consideram muitos detalhes nos eventos de EQM (ou seja, que se estudem a fundo esses fenômenos), descobre-se que elas não são meras alucinações ou invenções do cérebro. 

O Capítulo 5 (Compreendendo a mente, o cérebro e a consciência) é uma introdução ao conhecimento presente sobre as teorias de funcionamento do cérebro e da mente. O estilo de Parnia é bastante livre e ele consegue passar de uma descrição autobiográfica para técnica em poucas linhas. Nesse capítulo, o autor discorre sobre limitações das teorias convencionais do cérebro e adentra no campo da filosofia e de física quântica, esta última entendida como explicação não convencional. O Capítulo 6 (Os ingredientes da Vida) é uma extensão do capítulo anterior e o autor descreve alguns fundamentos de física quântica que ele entende serem importantes para tentar responder às questões fundamentais. Na verdade, esse capítulo descreve que o que entendemos como 'matéria' não é algo tão 'tangível' como se pode pensar e que é possível, portanto, que no nível mais elementar, a mente seja formada por outro tipo de coisa.

A realidade 

No Capítulo 7 (Isso é real?), Parnia se põe a discutir métodos ou meios pelos quais seria possível separar uma experiência real de algo imaginário. A maior novidade na discussão são as propostas de  metodologias baseadas em imagens de tomografia que permitem observar em tempo real as áreas que são ativadas no cérebro quando um indivíduo está realizando uma atividade ou simplesmente pensando em algo.  Como vimos, a maior parte das teorias ortodoxas para as NDEs parte da hipótese de que as experiências não são reais, mas alucinações. Segundo Parnia:
Isso é uma maneira bem simplista de se olhar um assunto complexo que precisa de mais esclarecimentos e explicações. O que muitos que apoiam este argumento não mencionam é que exatamente as áreas do cérebro envolvidas com alucinações estão igualmente envolvidas com muitas das experiências 'reais' e 'normais' e emoções como o amor, ódio etc. Por conseguinte, simplesmente identificar essas áreas do cérebro como aquelas envolvidas em EQM não pode nos dizer se são experiências reais ou alucinações. (Parnia,  2008, p. 166)
De outra forma: exames de tomografia do cérebro não permitem que se diferenciem experiências 'privadas' das experiências 'públicas'. Os circuitos neuronais envolvido na atividade de se contemplar uma lâmpada acesa são os mesmos de simplesmente imaginar ver uma cena com essa lâmpada acesa. Não parecem existir bases em mapeamento neuronal suficientemente seguras para se caracterizar determinadas experiências como alucinações ou experiências reais. Isso complica bastante os métodos laboratoriais de pesquisa no assunto, já que não é possível diferenciar um caso de outro e todo o assunto, por essa via, parece muito complexo. Mais uma vez estamos diante de um objeto de estudo que escapa aos métodos presentes de pesquisa considerados científicos.

A Horizon (Capítulo 8) é uma fundação criada por Parnia que tem como objetivo apoiar estudos na área de EQM. De certa forma, essa foi a solução encontrada pelo autor para dar vazão à pesquisa na área, ainda incipiente ou pouco tolerada pelo meio acadêmico convencional. Há vários projetos em andamento e é bom sempre verificarmos esse link para sabermos das novidades na fascinante área da pesquisa das experiências de quase morte. 

Finalmente, no último capítulo (9 -Implicações para o futuro), Parnia  faz um resumo do que apresentou anteriormente, traça planos para o futuro e discute as consequências para  a humanidade de uma aceitação global do pós-vida a partir de evidências fornecidas pelas EQMs. Não seria apenas uma nova ciência, mas uma revolução como nunca antes vista:
Isto levaria a um estudo objetivo do que comumente é considerado assunto religioso e filosófico e, portanto, terminando muitos desacordos e levando, por conseguinte, a uma sociedade muito mais tolerante. Da mesma forma que a ciência revolucionou nossa compreensão do mundo externo, ela também poderia revolucionar nosso entendimento do mundo subjetivo dentro de nós.
De certa forma, isso já está acontecendo. Em síntese, o livro de Parnia é bastante elucidativo, trazendo discussões e contra argumentos ao ponto de vista cético padrão de considerar as EQM como meras alucinações. Certamente, as experiências de quase morte são uma via alternativa através da qual podemos acessar parte da realidade maior em que estamos envolvidos. Para a imensa maioria dos que passaram por essa experiência, hoje não há mais dúvidas: elas existem e são reais.

(*) A citação está no livro 'A República', Livro X, última parte onde Platão narra a fábula de Er. Parnia não fornece a referência completa. Ver o blog  Rotas Filosóficas.
  
Dados sobre o livro

O que acontece quando morremos - Um estudo sobre a Vida após a Morte.
Autor: Sam Parnia (2008).
Ed. nacional com tradução de Emanuel Mendes Rodrigues.
ISBN: 978-85-7635-360-7
Número de páginas: 246.
Editora Larrouse, São Paulo, SP.

Vocabulário

NDE (inglês) - 'Near Death Experiences'  ou experiências de quase morte (EQM em português) são relatos de vítimas de coma ou 'instâncias de quase morte' (em geral sobreviventes de paradas cardíacas) que mantem entre si determinadas características comuns. Dentre as mais marcantes está a de separação do corpo, sensação de grande paz, presença de pessoas já falecidas, visualização de uma luz ou tunel de onde retornam para continuar a presente existência. A experiência é descrita como não traumática e de grande impacto na vida do paciente. 
NDEr (inglês): É o indivíduo que passa por uma EQM.

Outros artigos de Parnia e colaboradores (ver www.horizonresearch.org)
  • Parnia S, Fenwick P, Near Death Experiences in Cardiac Arrest: Visions of a dying brain or visions of a new science of consiousness. Resuscitation 2002 Jan 52, 5-11;
  • Parnia S, Fenwick P: Do reports of consciousness during cardiac arrest hold the key to discovering the nature of consciousness? Medical Hypothesis 2007;
  • Parnia S, Waller D, Yeates R, Fenwick P, A qualitative and quantitative study of the incidence, features and aetiology of near death experiences in cardiac arrest survivors. Resuscitation, Feb 2001 48, 149-156.
Outros links

Outra página de referência (em inglês) é a da Near Death Experience Research Foundation.

16 de novembro de 2011

Aniversário do EE - Principais Posts do Blog (até Novembro 2011)

16 Novembro 2010: Primeiro post do blog! Bem vindo à Era do Espírito.

Segue abaixo uma lista dos principais posts do blog em 1 ano de trabalho.

A maioria dos 'posts' segue mais a estrutura de artigos, com vários links para outras referências que você pode utilizar para conhecer mais sobre um determinado assunto. As palavras-chave também servem para orientar, além da busca (pesquisa de postagens).

Os três artigos mais acessados até Novembro 2011
  1. Crenças Céticas X - Positivismo lógico e indutivismo: as duas bases do ceticismo dogmático.
  2. Obras históricas raras sobre materializações e fenômenos de efeitos físicos.
  3. Pragmática e intenção nas psicografias de Chico Xavier.
Artigos

  1. Pragmática e intenção nas psicografias de Chico Xavier (1/3)Pragmática e intenção nas psicografias de Chico Xavier (2/3)Pragmática e intenção nas psicografias de Chico Xavier (3/3).
  2. II/1 - Como se deve entender a relação entre o Espiritismo e a Ciência.II/2 - Como se deve entender a relação entre o Espiritismo e a Ciência.II/3 - Como se deve entender a relação entre o Espiritismo e a Ciência.;
  3. I/2 - Considerações sobre as ideias de verdade e controvérsias em torno dos ensinos dos Espíritos.II/2- Considerações sobre as ideias de verdade e controvérsias em torno dos ensinos dos Espíritos.
  4. Novo Jornal de Estudos Antropológicos
  5. Nova Edição de Paranthropology (Vol. 2, Número 1) - Destaque: ectoplasmias recentes no FEG.
  6. Anomalias nos sinais elétricos do Cérebro com a morte do corpo;
  7. Fim da Religião ou do Irracionalismo Religioso?
  8. Usos e mal usos da palavra 'energia' entre espiritualistas.
  9. Kardec sobre o Ceticismo.
  10. Pragmática e intenção nas cartas psicografadas de Chico Xavier.
  11. Uma abordagem estatística para a determinação do tempo de vida entre encarnações sucessivas.
  12. Usos e mal usos da palavra 'energia' entre espiritualistas.
  13. Obras históricas raras sobre materializações e fenômenos de efeitos físicos.
Entrevistas
Sobre o ceticismo dogmático: Série Crenças Céticas

XIV- "Afirmações extraordinárias requerem evidências extraordinárias."
XVI - O ceticismo dogmático como charlatanismo intelectual.
XVII - Teoria das evidências fotográficas e de outros tipos.

Comentários sobre Livros

I - Introdução à Ciência Espírita de Aécio P. Chagas

9 de novembro de 2011

Crenças Céticas XVII - Teoria das evidências fotográficas e de outros tipos.


Não há dúvida que vivemos numa época de grandes inovações tecnológicas. A começar pelo uso de recursos de imagem e som e de manipulações de elementos desse tipo, o que é hoje parte da grande indústria cinematográfica. Mas, poderiam imagens serem usadas como evidência da realidade de fenômenos insólitos?

Nossa principal tese neste texto é demonstrar que a alegação cética que rejeita a proposição de fotos ou imagens para demonstrar a existência de fenômenos paranormais (transporte de objetos, telecinese, materializações etc) também pode ser usada com objetivo oposto: a de negar a validade da argumentação cética que consideram tais fenômenos como fraude. Nesse assunto, a solução não é tão simples como proponentes ou críticos frequentemente imaginam. A base ou fundamento de nossa tese é uma concepção apropriada de imagens, filmes e sons  no contexto em que são muitas vezes apresentados. 

Veja que não estamos a propor que não existem fraudes. Mas, diante da complexidade que a Natureza exibe, com uma diversidade de fenômenos e interações, será que o 'método cético' é realmente eficiente? Será que ele realmente leva a conhecer a verdade? Será que devemos apenas acreditar naquilo que nossos sentidos aprovam? Reiteramos que não é razoável insistir em teorias de fraude com certas evidências para desqualificar fenômenos considerados insólitos, que requerem condições especiais de ocorrência. Justamente por ser muito fácil 'fraudar' uma evidência, esse tipo de prova não pode ser usada para se negar um determinado fenômeno, embora seja possível usá-las para se afirmar dentro de determinadas circunstâncias. 

Do ponto de vista lógico, assim, muitos céticos não percebem que as condições que pregam para 'validar' o que considerariam contra-evidências, extrapola certos aspectos lógicos não explícitos em cada caso, tornando-se uma tentativa condenada desde o princípio. 

Prova fotográfica

Para começar, analisemos o que é uma 'prova' fotográfica. Uma vez que recursos técnicos podem ser usados para múltiplas imagens, as mesmas considerações que fazemos aqui para fotos também valem para filmes. A fig.1 abaixo mostra uma imagem razoavelmente compreensível de um evento singular.

Trata-se da imagem de um avião 'tentando' decolar mas demonstrando certa dificuldade, talvez na iminência de um desastre total. Se nos perguntarmos sobre a 'validade' dessa imagem, uma pesquisa feita com a maioria das pessoas não demonstraria nenhuma dificuldade em aceitar que se trata, realmente, de um avião tentando decolar com dificuldade, com parte de sua asa quebrada etc. Em suma, um flagrante de um acidente.
Fig. 1 Um avião na iminência de um desastre?
Entretanto, essa imagem é uma fotomontagem (isto é, uma fraude). Ela é o produto de alterações feitas por um programa de computador que é capaz de manusear parcelas da imagem e integrá-las de forma a constituir um todo final convincente.  

Uma imagem está assim longe de ser uma evidência autosuficiente. Há algo mais, externo à foto que deve existir para que seja considerada verdadeira. O que é isso? Uma pista para conhecer esse algo mais é se questionar sobre onde esse algo fica. A resposta simples é que ele fica na cabeça de quem vê a imagem. Por causa disso, uma imagem ou reprodução fotográfica de um objeto externo não existe por si mesma:
I) Uma imagem ou filme é, em essência, uma representação de um objeto que só existe na mente de quem o contempla.
É importante que esse 'algo' realmente 'exista', onde por 'existir' entendemos a noção interna de quem observa, que obrigatoriamente teve uma experiência sensorial com o objeto representado. Podemos clamar sobre a existência de outros tipos de entidades não sensoriais, que existem sem nenhuma relação com nossos sentidos. Mas, então, o que seria uma imagem ou foto de uma entidade desse tipo? Quanto mais próximo a representação dessa 'coisa' estiver da experiência sensorial, tanto mais realística será a impressão causada, tanto maior será a 'força' expressiva da representação, tanto maior será a crença na validade da representação. 

Alguns fatos validam essa noção:
  • Uma vez que as crianças - principalmente com menos de 5 anos de idade - ainda não tem experiência sensorial plenamente formada, elas tendem a ver o mundo de forma diferente dos adultos. A 'representação da realidade' para as crianças não precisa ter os mesmos detalhes de um adulto. Desenhos simples ou bonecos já são suficientes para se manipular conceitos e idéias na mente infantil;
  • A busca pelo realismo incentiva o desenvolvimento de novas tecnologias, como a do cinema ou televisão 3D;
  • Ilusões de óptica: a existência de imagens dúbias e mutantes sugere que o que se vê está mais dentro da mente do que fora;
Exemplo de Ilusões de óptica: o que se vê depende do que estamos acostumados a ver. Esta imagem não é um 'gif' animado.
Onde está a verdade então sobre a foto que analisamos? Sendo a representação de um objeto externo, não temos dificuldades em identificar do que se trata. Ainda que não tenhamos contemplados fisicamente decolagem de aviões, já os temos visto muitas vezes em outras ocasiões, seja na tv ou e filmes de cinema ou internet que também são representações assertivamente válidas no contexto em que são apresentadas.

Surge assim o segundo elemento importante em nossa análise:
II) O contexto de uma imagem ou filme é o segundo elemento que determina a escolha que o observador faz internamente sobre a validade da representação (imagem ou vídeo).
Em outras palavras, não é razoável que duvidemos de toda e qualquer foto ou filme de desastre de avião só porque mostramos um exemplo forjado. Nosso princípio I não é suficiente para garantir a validade da representação apresentada como imagem. Desastres de avião são eventos raros e mais rara ainda é a chance de se registrar um evento desse tipo. O fato de ser fácil forjar imagens de desastres de avião utilizando tecnologia de ponta não significa que tais desastres não ocorram ou que seja impossível registrá-los. 

Esse é um exemplo clássico que demonstrar a dificuldade de se utilizar evidências de foto ou filme em determinados casos. Imagine que, se para 'demonstrar' que desastres de aviões existem, tivéssemos que reproduzir essa ocorrência em seus mínimos detalhes para convencer os céticos desses desastres.

Aplicação para fenômenos insólitos

Fig. 2  'Raio verde'. Fenômeno raro que pode
ocorrer durante o ocaso ou nascer do sol. 
No que segue, por 'fenômenos supostamente insólitos' não nos referimos apenas aos fatos registrados na fenomenologia psíquica. Um fenômeno supostamente insólito parece ter as seguintes características:
  1. Uma ocorrência imprevisível (condições de ocorrência desconhecidas);
  2. Uma ocorrência rara (a frequência com que ela ocorre é muito pequena);
  3. De difícil registro fotográfico ou filmagem (no sentido de não serem frequentes as oportunidades de registrá-lo, ou porque ele ocorre sob condições em que não é possível usar com facilidade métodos de registro fotográfico ordinário);
  4. Diz respeito a um objeto ou coisa para o qual não existe uma 'representação local e privada' para a maioria dos observadores;
  5. Não existe um contexto estabelecido que apoie a aceitação de sua ocorrência.
Fig. 3 Raríssimas nuvens do tipo 'mamatus' .
O objetivo de toda evidência parece ser a característica 5, ou seja, reunir 'provas' que ajudem a criar o contexto de aceitação. Uma 'prova fotográfica' é, assim, uma peça ou material que pretende formar uma opinião, um contexto, a respeito de um determinado fato. A tarefa é simples com eventos ordinários. Por exemplo, no caso do uso de uma filmagem como testemunho de um crime: aqui é fácil ver que não obstante se cumpram quase todos os quesitos, um crime de difícil solução não tem a característica 4, ele não se refere a objetos ou coisas para as quais a imensa maioria não dispõe de uma 'representação local e privada'. Um crime é uma ocorrência suficientemente ordinária para que essa característica não se aplique.   

O que distingue um fenômeno supostamente insólito de outras ocorrências raras mas ordinárias é sua causa considerada insólita. A característica 4 implica que não existe um objeto conhecido que possa ser usado como referência. Por causa disso, para os céticos sobre determinados fenômenos, o mais próximo que se chega para cumprir a exigência 4 é imaginar que uma fraude está envolvida. Uma fraude é uma ocorrência ordinária, facilmente concebível que torna nulo o requisito 4 e que, portanto, desqualificá-lo o fenômeno no discurso do cético dogmático.

Entretanto, há uma imensa classe de fenômenos naturais que se enquadram nesse tipo de fenômeno. Com são eles justificados? A partir de teorias ou modelos científicos que permitem prever sua ocorrência. A Fig. 2, por exemplo, traz um registro fotográfico do 'raio verde' ou 'flash verde' provocado pela refração excessiva, assim como absorção de comprimentos de onda longos de raios solares durante o nascer ou ocaso do sol. Trata-se de um fenômeno raro que dura somente alguns instantes. Para alguém que desconheça totalmente o fenômeno, esta imagem pode ser resultado de alguma edição digital, já que é fácil preencher digitalmente com cores variadas determinadas porções de uma imagem. Já a Fig. 3 trás uma foto das núvens tipo 'mamatus'. Para quem nunca contemplou o fenômeno, pode se tratar de uma montagem fotográfica feita com superposição de um fundo de algum líquido ou fumaça sobre uma imagem ordinária de uma paisagem. Mas, a existência dessas nuvens é validada pela fluidodinâmica aplicada a condições meteorológicas especiais (anda que o mecanismo exato de sua formação  seja presentemente desconhecido). 

Nesses casos extraídos das ciências naturais, as imagens apenas fornecem registros de ocorrência de fenômenos que são concebíveis. Portanto, as imagens não constituem 'prova' no sentido de validarem o contexto. Em outras palavras, a ordem com que se apresentam as circunstâncias está invertida: com tais fenômenos, o contexto (a teoria) vem primeiro, as evidências são colhidas depois. 

Conclusões

O que podemos dizer então da negativa sistemática das evidências tão comumente encontrada no ceticismo dogmático? Na análise de toda crítica cética - principalmente se ela se faz em tom agressivo ou debochado - o mais importante é considerar os aspectos não aparentes da crítica, quais suas reais intenções e objetivos. Esse é o contexto ou 'pano de fundo' que irá determinar como uma evidência proposta será considerada. Não importa o quão 'séria' e 'científica' ela pretenda se apresentar, na imensa maioria das vezes isso se dará de forma negativa por razão muito simples.

Por definição, para o ceticismo dogmático qualquer 'prova' será sempre suspeita até que se cumpram determinados requisitos, todos eles frequentemente considerados 'imprescindíveis', mas que fazem parte de uma estratégia maior de desqualificação de fenômenos. Quase sempre o cumprimento de determinadas exigências será virtualmente impossível, o que, para os céticos dogmáticos, facilita a tarefa de desqualificação dos fenômenos. É importante considerar a intenção: para esse tipo de ceticismo, por definição, determinados fenômenos não existem. É preciso entender que o cético dogmático é alguém que acredita que a Natureza não tem segredos para ele. Considera que não há mais nada 'debaixo do sol', o que serve para justificar sua crença. Logo todas as evidências que se apresentem são forjadas. Partindo-se desse princípio, explicações são formuladas para ou invalidar a ocorrência ou a evidência fornecida, o que é muito mais fácil.

Em síntese: se uma imagem é o que está na cabeça de cada um, qualquer 'evidência' fotográfica que se apresente será sempre uma fraude na cabeça do cético, por princípio, porque ele entende que nada pode existir que ele já não conheça.

Os fenômenos psíquicos, por outro lado, não pertencem à classe das ocorrências ordinárias. Portanto, tais como fenômenos físicos de natureza material (raros e contextualizados por uma teoria), eles não podem ser facilmente negados pela invalidação de evidências fotográficas que se apresentem. O que torna os fenômenos psíquicos tão especiais são as condições de ocorrência que são, na sua imensa maioria, desconhecidas e totalmente não aparentes.

A possibilidade de existência de fraude está sempre garantida para todos os fenômenos, inclusive os de natureza material. Como haveremos então de nos posicionar quanto à realidade dos fatos? Se isso não é uma questão de resposta simples, mesmo com os fenômenos naturais que são objeto de pesquisa científica de causas materiais reconhecidas, podemos fazer ideia do grau de dificuldade que encontramos com os fenômenos supostamente 'insólitos' ou 'sobrenaturais'. Eles exigem a aceitação tácita de teorias bem fundamentadas, sem as quais é impossível avançar na compreensão desses fatos.

2 de novembro de 2011

Vídeo III - 'Visitantes da outra margem' - Fenômenos de Materializações descritos por Tom Harrison (Inglaterra)

Escrita direta obtida pela mediunidade de Minnie Harrison.
Os versos abaixo são de autoria de Jack Bessant, irmão de Minnie Harrison e foram obtidos através dessa médium em 1954. (ver original em Inglês abaixo)

Não chorem por mim, meus amados, pois estou ao vosso lado.
Não fui arrebatado a reinos desconhecidos ou levado por ignotas marés.
Não vos deixei sem cuidados - nunca pensem que vos faria isso;
Secai vossas lágrimas, levantai e sorride, ainda estou convosco.

Meu olhos que se fecharam agora estão abertos, minha visão clara e brilhante;
Onde dantes podia ver por janelas esfumaçadas, agora vejo a perene luz.
O véu simplesmente se levantou e os meus amados que se foram
Agora esperam por mim como nos velhos tempos de então.

O amor deles ainda me cerca. Seus Espíritos não se perderam;
E, agora, sei como sou conhecido - NÓS VIVEMOS! Não há morte!
Então, confortai vossos corações, livrai-vos da dúvida e do pavor;
Vivemos e caminhamos ao vosso lado - os vossos amados estão aqui.

Não vos aflijais por mim, meus queridos, livrem-se dessas lágrimas;
Caminharei convosco pelas escuras noites terrenas até o amanhecer de um novo dia.
Levantai vossos corações em agradecimento para vos unir a nós e cantar:
Ó, túmulo, onde está a tua vitória? Ó morte, onde está o teu aguilhão?

Fenômenos de escrita direta e aparições de luzes

Terceira parte do vídeo Visitantes da 'outra margem' com entrevista de Tom Harrision.


Conteúdo (5' 18'')

00:00 Continuação da palestra de Tom Harrison sobre voz direta obtida por meio de uma corneta;
01:33 Continuação da entrevista para Pat Hamblig;
02:22 Nova palestra onde Harrison descreve os primeiros fenômenos luminosos e de escrita direta obtidos no grupo;

Outros Vídeos


Referência
  • Visits By Our Friends From the "Other Side". Tom Harrison. Saturday Night Press Publications; Revised edition edition (February 23, 2011)
Original em Inglês

Mourn not for me my loved ones, For I am by your side,
I have not sped to realms unknown or crossed the rolling tide.
I do not leave you comfortless—think not I ever will;
So dry those tears, look up and smile, for I am with you still.

My eyes once closed are opened, my vision clear and bright;
Where once I looked through darkened glass, I see perpetual light.
The veil has just been lifted and my loved ones gone before
Are waiting now to welcome me, as in the days of yore.

Their love is still enfolding me, Their spirits have not fed;
And now I know as I am known—WE LIVE! There are no dead!
So let your hearts be comforted, cast out all doubt and fear;
We live and walk beside you—your loved ones still are near.

Grieve not for me my dear ones, just dry those tears away;
I'll walk with you through Earth's dark night until the break of day.
So lift your hearts in thankful praise and join with us to sing—
Oh, Grave where is thy victory? Oh, Death where is thy sting?