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15 de novembro de 2018

A natureza do argumento espírita


É vaidade imaginar que se pode introduzir 
uma nova filosofia ao refutar um ou outro autor. 
Primeiro, é necessário ensinar a reforma do espírito humano, 
e torná-lo capaz de distinguir a verdade da falsidade...o que só Deus pode fazer!

Galileu Galilei

É importante que o espírita, principalmente aquele que se dedica à argumentação nos tempos conturbados das opiniões democráticas das redes sociais, preste atenção antes de tudo à natureza do argumento espírita. Como bem demonstou Schopenhauer [1], para se vencer um embate argumentativo não é necessário estar certo. A vitória demonstrada por Schopenhauer depende do grau de sugestibilidade da plateia, em sua facilidade de convencimento por argumentos psicologicamente fortes, mas não necessariamente certos. Disso vem que o embate muitas vezes é aparentemente vencido por quem tem melhores predicados retóricos e não conhecimentos filosóficos ou científicos.

Como entendemos que o primeiro compromisso do espírita deve ser com a verdade, recomenda-se meditar profundamente sobre o tipo de argumento ou contra-argumento apresentado em qualquer discussão. Com relação aos embates que envolvem o Espiritismo - conforme apresentada por A. Kardec e os Espíritos - são escassas as chances de falha se o objetivo for defender a verdade e promover o progresso e não simplesmente ganhar uma discussão.  Em síntese: mais vale sair certo porém vencido em uma discussão do que vitorioso na mentira. 

Em que pese a divisão bastante didática apresentada por Kardec do Espiritismo como religião, ciência e filosofia, convem não se esquecer de que as bases sobre as quais se fundamenta todo esse alicerce é de natureza empírica. Não foi se não por meio de uma cadeia de raciocínios lógicos que Kardec chegou à conclusão de que seria possível questionar os Espíritos, que eram apenas as almas dos falecidos e não, como supunham as religiões dogmáticas, almas penadas ou demônios, iniciando uma revolução ainda não totalmente compreendida pelo pensamento humano. A sobrevivência da alma é um fator chave para a revolução desse pensamento, algo que não poderia se basear tão somente em uma assunção mantida pela afirmação de uma crença. Ela teria que ser demonstrada experimentalmente, de onde se extrai toda sua força.

A comunicabilidade (base empírica) levaria imediatamente à conclusão da sobrevivência (conhecimento) como corolário da interação entre humanos e desencarnados. Então, assim como é possível perguntar a um povo indígena recem descoberto sobre seus constumes e crenças, também seria possível perguntar aos Espíritos sobre sua condição de vida no além-túmulo. Eis ai a pedra de toque de Kardec: diante dela caem todos os argumentos daqueles que pretendem destruir o espiritismo filosofico fora do contexto "experimental" da sobrevivência. Essa é a razão também para se concluir, como fez Kardec, que o argumento espírita jamais terá natureza dogmática.

Dogmas são desnecessários quando se explicam as coisas em conformidade com as leis da Natureza [2].

Em suma, de que adianta contrapor milênios de crenças fundamentada em tradições, em conclusões aparentemente justas, mas baseadas em premissas imaginadas, se basta uma simples entrevista com um desencarnado para se conhecer o estado de ventura ou sofrimento a que a alma está sujeita conforme foram suas ações durante a vida? Por mais respeitáveis e bem apresentadas que sejam, tradição e cultura religiosas ou argumentação cética,  sejam elas oportunistas ou sinceras, de nada servem frente à manifestação de leis naturais que sempre existiram, mas que os homens, por ignorância, deixaram de valorizar porque suporam que jamais seria possível conhecer cientificamente tais assuntos. 

Assim, o Espiritismo representa verdadeiramente avanço no conhecimento humano tanto quanto foi um avanço perceber que seria possível usar as forças da Natureza (eletricidade, magnetismo, calor) em benefício da suavização do trabalho humano e do progresso material pela multiplicação dos meios de produção. À evolução do progresso material, o Espiritismo acrescentou a possibilidade da aceleração do progresso moral pelo conhecimento e bom aproveitamento das leis que regem as recompensas ou reparações em conformidade com as ações durante a vida. O Espiritismo forneceu assim as bases para a justificativa científica das máxima evangélicas, não como imposições de um Deus vingativo em que se acredita, mas como consequências lógicas da ação de leis automáticas de evolução incessante, que operam no âmago da consciência de cada indivíduo. 

Entretanto, parece pequeno o contingente de espíritas que conhecem a força do eixo empírico dado por Kardec a toda argumentação espírita. Ela torna quase que inabaláveis as deduções filosóficas e morais do Espiritismo. Uma prova dessa força se encontra na malícia de alguns inimigos do Espiritismo. Essa foi a razão para o surgimento de tantos "padre parapsicólogos" que passaram a  desconstruir aparentemente a descoberta espírita, dissemiando teorias ridículas, fantásticas ou aparentemente em "acordo" com a ciência, sendo que essa última nunca teve interesse em pesquisar seriamente a sobrevivência.  Sabiam eles que, destruidas as possibilidades de comunicação, a defesa de suas próprias concepções religiosas poderia ter alguma chance de triunfo. Tratava-se, porém, de uma velha tática sem sucesso, que já fora usada muitas vezes contra os próprios avanços da ciência material.

Entendemos a importância de muitos argumentos que têm por fundamento bases filosóficas e religiosas exclusivamente. Porém, tal como ocorreu nas ciências, o peso das descobertas sobre como realmente funciona a Natureza (do ser, da vida maior, da relação entre espírito e corpo etc) ainda terá que ser melhor valorizado pelos que gostam de debates sem levar em conta esses fundamentos. Uma vez convencidos de sua importância, nossa visão se aclara e reconhecemos os erros do passado e a pretenção dos que seguem as escuras sem as luzes providas pela evidências sobre como as coisas de fato acontecem no Universo. Além disso, os argumentos com base natural reforçam todos os outros dele derivados (seja filosóficos ou religiosos), provendo uma base ainda mais sólida para a crença, ou seja, uma base que não poderá ser abalada por qualquer descoberta científica, visto que ela mesma se baseia nessas descobertas.

Referências e notas

[1] A. Schoepenhauer (2003). Como vencer um debate sem ter razão. Ed. Topbooks. 1a Ed. Trad. O. de Carvalho.

[2] Disso segue também que dogmatismo nas ciências não tem sentido: é mais fruto da ignorância humana e do mau uso que faz do conhecimento. Quando a criatura é vaidosa ou arrogante, ela faz do pouco que sabe sua arma de auto-afirmação. Com isso passa a defender de forma dogmática esse  saber (ou o que ela aparenta saber de forma precária) como se a sua vida (na verdade, sua reputação) dependesse dele para existir.