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29 de setembro de 2019

O fenômeno das vozes eletrônicas

Fig. 1. Imagem de um espectrograma (Audacity) com a invocação de Kedar (seta) e a 'voz' inesperada (região circular)
Um sobrinho meu que mora nos Estados Unidos estava a gravar com o celular algumas músicas no estilo "Karaoke" em junho último. Kedar é um adolescente que conhece tanto português como inglês, que é sua lingua materna. Um pouco desligado da gravação, ele deixou  o celular gravando por algum tempo a mais. Para sua surpresa, uma voz desconhecida aparece em um trecho não esperado da gravação. Ao tentar outra vez, o fenômeno estranho se repete; desta vez um claro 'yes' surge após aproximadament 15 segundos de uma pequena invocação. Uma terceira tentativa e um 'I see' também é obtido. Um pouco assustado, ele abandona os experimentos com medo do fantasma, coisa de adolescente.

Quando fiquei sabendo da ocorrência, minha irmã me enviou dois arquivos mp4 que são facilmente abertos com o Audacity, um conhecido software para edição de arquivos de som. Um espectrograma de uma das experiências obtidas por Kedar é visto na Fig. 1. O gráfico representa a decomposição espectral do som obtido no experimento, onde a invocação inicial é vista nos primeiros segundos. A voz é um 'yes' muito baixo mas indubitável, com tons entre 1000-2000Hz compatível com a modulação de uma voz humana. Na segunda gravação a intensidade da voz anômala foi ainda maior.

O fenômeno das vozes eletrônicas

Tal como no caso de Kedar em 2019, o fenômeno teve seu início com F. Jürgenson (1903-1987) em 1959 quando tentava gravar canto de pássaros. No início, pensou-se que se tratava obviamente de interferência de estações de rádio. Entretanto, a repetição dos experimentos - inclusive no interior de 'gaiolas de Faraday' (para bloqueio da radiação eletromagnética externa), confirmou que algumas pessoas, em condições insuspeitas e na presença de equipamentos de gravação, conseguem obter vozes que parecem se comunicar, respondendo a invocações. Nomes como Konstantin Raudive (1909-1974) e P. Bänder [1] estão ligados à história dos 'Electronic Voice Phenomena' (EVP, fenômenos das vozes eletrônicas). Mais do que isso, no que parecia ser uma clara aceitação de algo que já sabiam, algumas autoridades do Vaticano passaram a apoiar a realização de experimentos de EVP e de que as vozes tinham origem no Purgatório. 

Aspectos do fenômeno

O fenômeno da EVP surgiu na década de 50 e foi interpretado como uma 'Nova Hydesville', conforme descreve Bänder [1]. Sem dispor de uma teoria eletrônica que descrevesse como as vozes podem ser captadas e amplificadas, a pesquisa seguiu um caminho puramente empírico. Diversas 'receitas' de se obter vozes foram sugeridas: com um simples gravador, com um gravador e um rádio sintonizado em ondas curtas, com um gravador e um gerador de ruídos etc. Logo entusiastas criaram uma tese que seria uma consequência natural desse desenvolvimento: com o aprimoramento da técnica, as EVPs representariam uma nova maneira de se comunicar com os Espíritos, uma em que a presença de médiuns seria desnecessária.

Fig. 2 Edison em uma foto de sua entrevista a Austin Lescaboura em 1920 sobre suas pesquisas de um dispositivo para se comunicar com os Espíritos.
Esse aspecto 'amediúnico' das comunicações eletrônicas (qualquer que seja ela), é um sonho de antigos pioneiros das telecomunicações. Logo ficou claro a personalidades como Thomas Edison (1847-1931), O. Lodge (1851-1940) e Nikola Tesla (1856-1943), que talvez fosse possível usar o rádio ou um circuito variante dele para se comunicar com os Espíritos. Edison mesmo chegou a trocar correspondência com William Crookes (1832-1919) sobre a possibilidade de se obter imagens de Espíritos. Em alguns dos trechos de sua entrevista à Scientific American [2] em 1920, Fig. 2, declara Edison:
Now, what I purpose to do is to furnish psychic investigators with an apparatus which will give a scientific aspect to their work.*  
My apparatus is along those lines, in that the slightest effort which it intercepts will be magnified many times so as to give us whatever form of record we desire for the purpose of investigation.** 
Em outros trechos Edison demonstra pouco conhecer das pesquisas da fenomenologia psíquica anterior. Em um artigo de divulgação, Zarrelli (2016) [3] declara que o 'spirit phone' foi a invenção mais 'infrutífera' de Edison. Provavelmente o foi por causa da ignorância de Edison e outros pesquisadores das condições em que o fenômeno se realiza. Em outros termos: só ter o aparato não é suficiente.

O princípio da comunicação amediúnica segue a ideia de Edison que, por meio de um sensor e um amplificador poderoso seria possível registrar oscilações (voz, imagem, pulsos etc) dos Espíritos. Aparentemente, isso foi o que Jürgenson e Raudive parecem ter conseguido, além de outros entusiastas das vozes eletrônicas desde então. 

Entretanto, demonstrar que não há influência de um humano na comunicação eletrônica é bastante difícil, pois sempre qualquer pesquisa será organizada e conduzida por uma pessoa ou um grupo. Não se pode, a priori, descartar a influênciado experimentador. 

Mediunidade eletrônica?

Alguns pesquisadores no passado conseguiram registros muito nítidos de vozes eletrônicas (que desqualificam hipóteses céticas de 'pareidolia'), outros conseguiram registros a partir de modulações de ruídos, enquanto que outros jamais conseguiram nenhum tipo de voz. A que se deve esse caráter mutante e incontrolável?

Contrário ao que se pensa, somos adeptos da idea de que as EVPs e seus correlatos são manifestações do que chamamos de 'mediunidade eletrônica'. Trata-se de uma variante moderna de efeitos físicos em que  um dispositivo eletrônico está envolvido. 

Essa nova mediunidade é potencializada pelo interesse ou envolvimento do 'pesquisador-médium' no fenômeno. O fenômeno é, assim, mais frequente na presença de certas pessoas com essa habilidade especial, razão porque as EVP jamais se tornaram um método 'sistemático e independente' da mediunidade. Elas não são reprodutíveis à vontade e, como tal, são seriamente limitadas na capacidade de transmissão de informação  - não há "bidirecionalidade". Claramente, essa mediunidade 'surgiu' com o desenvolvimento tecnológico. Suas características são:
  • Ela é inconsciente,
  • Não requer 'transe',
  • Um médium eletrônico sequer saberá que é médium a não ser pelos efeitos eletrônicos que produz. Sua mediunidade é validada pela alta correlação entre sua presença e a ocorrência do fenômeno.
  • Como é uma mediunidade, há possível influência do médium no fenômeno.
  • Como se trata de efeito físico, aplicam-se todos os comentários feitos por Kardec sobre esse domínio de fenômenos [4], inclusive sobre seu caráter subsidiário de demonstração da sobrevivência.
Do ponto e vista teórico, sendo a mediunidade eletrônica peculiar, ela não se liga a outras, por isso não basta que haja a presença de qualquer médium em um recinto para que o fenômeno ocorra. Médiuns de efeitos físicos provavelmente teriam mais facilidade em provocá-lo. Existem outros fatores que devem permanecer invariantes para que o uso de aparelhos possa ser eficientemente usado. Todas as vezes que uma nova 'técnica' é criada esses fatores mudam, o que reduz a eficiência da comunicação.

Esse princípio aponta para a importante orientação de que, não importará muito qual o tipo de circuito ou sistema eletrônico seja usado, desde que as experimentações sejam feitas na presença das pessoas capazes de intermediar o efeito. É provável, assim, que a ideia do 'spirit-phone' de Edison e tantos outros funcione, desde que sejam testados pelo experimentador certo.

Traduções

* Agora, o que pretendo fazer é prover aos investigadores psíquicos um aparato que conferirá um aspecto científioc ao trabalho que fazem.

** Meu aparato é nesse sentido: a menor perturbação que o interceptar será amplificada muitas vezes, de forma a nos dar qualquer registro para o objetivo da investigação.

Referências


1- P. Bänder (1976). "Os Espíritos Comunicam-se por Gravadores", São Paulo: Edicel, 2a Edição. 

2- A. C. Lescarboura (1920), "Edison's Views on Life and Death", Scientific American, Vol. 123, No. 18, pp. 446, 458-460


4 - Ver: "O Livro dos Médiuns" de A. Kardec, 2a Parte, Das Manifestações Espíritas", Cap. IV e Cap. V. 

4 de janeiro de 2016

S. José de Cupertino e a mediunidade de efeitos físicos


Não menos positivo é o fato do erguimento de uma pessoa; 
mas, é algo muito mais raro, porque é mais 
difícil de ser imitado. É sabido que o Sr. Home se elevou 
mais de uma vez até ao teto, dando assim volta à sala.
Dizem que S. Cupertino possuía a mesma faculdade, 
não sendo o fato mais miraculoso com este do que com aquele.

A. Kardec, "A Gênese", Cap. XIV, "Os fluidos", II - 
Explicação de alguns fenômenos considerados sobrenaturais.

Estaria o Século XXI pronto para confrontar 
o fenômeno destruidor de paradigmas, a levitação?  (M. Grosso, 1)

O fenômeno mediúnico manifesta-se das mais variadas maneiras, numa escala de força e tempo que ainda nos é desconhecida. Quando surgem as circunstâncias favoráveis, eclodem sem consideração por fé, crença ou ponto de vista. Se há manifestações tão singelas e apagadas que passam desapercebidas da maioria, por outro lado, há as que causam admiração e espanto, tamanho o grau de aparente desrespeito às leis naturais - porque representam operação  de leis desconhecidas - que imprimem as suas testemunhas. A revista "Edge Science" de Dezembro de 2015 (número 24, 1) traz um artigo interessante de Michael Grosso sobre uma figura lendária da Igreja, o santo S. José de Cupertino (160-1663). José de Cupertino (Giuseppe da Copertino) foi canonizado por Clemente XIII em 1767 e, até hoje, é adorado por Católicos que veem nele uma das 200 derrogações (ou suspensões) das leis naturais por obra direta de Deus que a Igreja conta entre seus santos. Por que? Eis uma das histórias que se conta, segundo M. Grosso (1):
Próximo ao natal de 1632, o Padre Giuseppe convidou alguns pastores a trazer seus instrumentos musicais para tocar na igreja de Grotella, na Itália. Ao entrarem na igreja, começou José a cantar e dançar. Mais tarde os pastores narraram sob juramento o que aconteceu: "Padre Giuseppe estava tão feliz que começou a dançar no centro da nave aos som das flautas. De repente, suspirou em voz alta e gritou, voando pelos ares como um pássaro, até metade da distância do teto, onde continuou a dançar acima do altar principal. Isso foi ainda mais formidável, pois o altar estava repleto de velas acesas e ele permaneceu entre elas sem derrubar nenhuma. Ficou naquela posição, com seus joelhos acima do altar, abraçado ao tabernáculo por cerca de quinze minutos e então retornou, sem causar qualquer transtorno. Seus olhos estavam cheios d'água e disse: 'Louvado seja Deus, meus irmãos'. Permanecemos todos em admiração e disse comigo mesmo: 'Isso sim é que é um milagre' " (2)
José de Copertino tinha a incrível capacidade de levitar, fenômeno que ocorreu por 35 anos ininterruptos até seu falecimento. Antes da manifestação de voo, José caia numa espécie de "êxtase", conforme descrito por seus biógrafos. O mais difícil é desacreditar as milhares de testemunhas que viram José levitar sob pena de se chegar a uma explicação ridícula ou anacrônica. Nas palavras de M. Grosso (1):
Poderíamos nos perguntar: dado que José era tão submisso e aparentemente pouco inteligente (6), como pôde ele enganar tantas pessoas, algumas inclusive bastante ilustres? De acordo com registros históricos, José levitou diante do Papa Urbano VIII, vários cardiais, médicos, o Rei da Polônia, o Duque de Brunswick, a Princesa de Savoia e numerosas outras personalidades VIPs. Podemos concluir que nenhum deles era esperto o suficiente para desmascarar esse impostor? Poderia José ter enganado o Papa Bento XIV (Prosper Lambertini), conhecido por ser um racionalista? A alternativa a essa explicação é que todos esses dignatários eram parte de uma ilusão em massa para criar a imagem de um padre voador. Mas, com que objetivo? E, por que, depois de tantos séculos, ninguém se apresentou para revelar a verdade sobre tal conspiração?
As evidências de levitação de José de Cupertino têm um peso ainda maior porque, segundo (1), durante a contra-reforma protestante, a Inquisição chegou a encarcerar José, proibindo-o de realizar a missa ou participar de procissões públicas. As autoridades inquisitoriais não queriam que a população o vissem voar e, assim, buscassem no padre curas e outros milagres, como está fartamente registrado em autos de várias paróquias como Grotella, Nápoles, Roma, Nardo, Pietra Rubbia, Osimo e Fossombrone (1). Pode-se dizer qualquer coisa da ética dos métodos e das motivações do tribunal do Santo Ofício, mas o fato é José foi preso justamente pela comoção pública causada por seus voos, e seria ele um caso de fogueira se descobrissem uma impostura. O estado de êxtase em que a população ficava ao ver o fenômeno alarmou outras paróquias que procuram na Inquisição uma maneira de parar as manifestações.  
"S. José de Cupertino voa 
diante da Basílica de Loreto" por 
Ludovico Mazzanti (1686–1775)

José de Cupertino e a mediunidade de efeitos físicos

Segundo M. Grosso em (1), a época de José de Cupertino era um tempo que pessoas eram queimadas vivas caso não tivessem as "credenciais de fé" necessárias. Portanto, os registros históricos confirmam a realidade do fenômeno da levitação e criam um problema difícil para os céticos. É o que chamamos de "anomalia". A explicação do fato, portanto, deve ser outra. Ainda segundo Grosso:
Quando olho para as fontes históricas das narrações sobre José, encontro registros bem documentados, narrativas que descrevem fenômenos estranhos, não somente levitação: histórias de fragrâncias inexplicáveis que persistiam por meses ou anos impregnadas a objetos, descrições sobre curas, do que hoje se chama de "telepatia" ou que, no Século XVII, era conhecido com "leitura dos corações" ou "discernimento" e, finalmente, a vida de José foi capaz de gerar muitos documentos que descrevem suas profecias e clarividência. Domenico Bermini, um historiador eclesiástico, afirma em uma biografia de José (de 1722) que ele registrou 22 profecias de pessoas que iriam falecer. (1)
Manifestações de efeitos físicos são pródigas em fenômenos de levitação (o caso das mesas girantes) e curas. E as tais "profecias" descritas pelos biógrafos de José de Cupertino atestam sua capacidade mediúnica intelectual, sua habilidade de ouvir ou receber informações dos Espíritos sobre fatos à distância - particularmente associados ao estado de pessoas próximas à desencarnação. Ainda que Espíritos não apareçam (6) no que se produziu dos relatos do santo (e não poderiam aparecer, pois aquela era uma época de perseguições aos que não estavam de acordo com a fé ortodoxa), o que temos dos relatos é suficiente para caracterizá-lo como um dos mais poderosos médiuns que já passou pela Terra. 

Sobre S. Cupertino, comenta Kardec (3):
Os fenômenos espíritas, bem como os magnéticos, antes que suas causas fossem conhecidas, tiveram que passar por prodígios. Ora, como os céticos, os espíritos fortes, isto é, os que têm o privilégio exclusivo da razão e do bom-senso, não creem que uma coisa seja possível desde que não a compreendem. É por isso que todos os fatos tidos como prodigiosos são objeto de suas zombarias. Como a religião contém grande número de fatos desse gênero, não creem na religião. Daí à incredulidade absoluta há apenas um passo. Explicando a maioria desses fatos, o Espiritismo lhes dá uma razão de ser. Ele, pois, vem em auxílio à religião, demonstrando a possibilidade de certos fatos que, por não mais terem caráter miraculoso, não são menos extraordinários; e Deus nem é menos grande, nem menos poderoso por não haver derrogado as suas leis. De quantos gracejos não foram objeto as levitações de São Cupertino? Ora, a suspensão no ar dos corpos pesados é um fato explicado pelo Espiritismo. Nós, pessoalmente, fomos testemunha ocular, e o Sr. Home, como outras pessoas de nosso conhecimento, repetiram várias vezes o fenômeno passado com São Cupertino. Assim, o fenômeno entra na ordem das coisas naturais.
Além da citação acima, Kardec mais de uma vez comentou sobre a descrença e escárnio que sempre acompanhava as referências a José de Cupertino. Na Revista Espírita de Outubro de 1859, artigo "Os Milagres", escreve: "De quantas graçolas não foram objeto as levitações de São Cupertino?" Tal fenômeno tem a mesma causa dos médiuns (4, 5) D. D. Home (1833-1886) e C. C. Mirabelli (1889-1951), por exemplo, que realizaram levitações no Século XIX na Europa e XX no Brasil, respectivamente. Mas, no artigo de M. Grosso, temos a confirmação da mediunidade de José de Cupertino, pela presença de outras manifestações espontâneas, típicas da mediunidade de efeitos físicos e intelectuais. 

Qualquer que seja o ponto de vista que se tenha sobre os voos de S. Cupertino, os registros históricos permanecem como seus testemunhos e não permitem fácil interpretação em termos de teorias de conspiração, alucinação em massa ou fraude. Fazem eles parte de uma época em que fraudes teriam vida curta, tanto por conta da existência de uma polícia doutrinária que punia severamente os que se aventuravam a zombar da fé hegemônica, como pela titularidade e inteligência dos notáveis que assistiram o fenômeno mais de uma vez.

Ilustração da levitação de D. D. Home. Fonte: Wikipedia
Continuarão os céticos a duvidar dentro de seu direito. No Século XXI,  qualquer registro fotográfico de um genuíno fenômeno de levitação seria facilmente explicado como manipulações de softwares como o "Photoshop". Céticos mais duros exigiriam, para sua aceitá-lo, um número arbitrário de demonstrações nas mais exóticas condições possíveis, que levariam o médium à loucura. De nossa parte, ficamos contentes em descobrir na história mais um exemplo de mediunidade rara de efeitos físicos, que confirma as regularidade - não obstante peculiaridade - das manifestações mediúnicas descobertas pelos pioneiros do Espiritismo. Podemos dizer que José de Cupertino, duzentos anos antes, antecedeu o fenômeno das mesas girantes do alvorecer do Espiritismo; tendo sido provavelmente ajudado por muitos Espíritos em suas manifestações de voo. Seu caráter piedoso o tornou insuspeito ao Santo Ofício, que procurou cercear entretanto as manifestações. Tivesse as mesas girantes surgido naquela época, tal como aconteceu no Século XIX, muitas pessoas teriam ido para a fogueira.

Referências

1. M. Grosso (2015) Ectasy and Gravitation: The Levitation of Joseph of Copertino. Edge Science, n. 24. Um publicação da Society for Scientific Exploration. A revista pode ser acessada em:

http://microver.se/sse-pdf/edgescience_24.pdf (Acesso: dez. 2015)

2 M. Grosso (2016). The Man Who Could Fly: St. Joseph of Copertino and the Mystery of Levitation. Rowman & Littlefield, p. 79.

3. A. Kardec (1860)  O Maravilhoso e o sobrenatural. Revista Espírita, Edição de setembro.

4. Outros médiuns menos conhecidos e associados à manifestações de levitação são: Amadee Zuccarini, Einer Nielsen, Boerge Michaelsen e Colin Evans, esse último, entretanto, considerado um impostor segundo os autores céticos da Wikipedia. Há ainda o caso de uma levitação do faquir  Subbayah Pullavar. 

5. Ver http://www.spiritarchive.org/levitation-of-humans.html

6.  De acordo com http://capuchinhosprsc.org.br/santos-capuchinhos-2/jose-de-cupertino-18:
Ele era carente de capacidade intelectual a ponto de chamar-se a si mesmo de “Frei Burro”. Mas, cheio de luzes sobrenaturais, discorria em profundidade sobre temas teológicos e resolvia intrincadas questões que lhe eram apresentadas. 




19 de julho de 2014

Artigo acadêmico sobre a acuidade mediúnica de Chico Xavier


A revista Explore (1) publicou um artigo de autoria de Alexandre Caroli Rocha, Denise Paraná, Elizabeth Schmitt Freire, Francisco Lotufo Neto e Alexander Moreira-Almeida contendo um interessante estudo sobre as cartas psicografadas de Chico Xavier.

Intitulado "Investigating the Fit and Accuracy of Alleged Mediumistic Writing: A Case Study of Chico Xavier’s Letters"  ("Investigando a adequação e acuidade da alegada escrita mediúnica: um estudo de caso das cartas de Chico Xavier"), o trabalho realizou uma análise, por meio de 13 cartas, do grau de acuidade da informação nelas contida frente à probabilidade do médium ter sido informado por meios considerados "normais". Como resultado, os autores declaram:
Identificamos 99 itens de informação verificável nessas 13 cartas; 98% deles foram classificados como "Adequação clara e precisa" e nenhum item como "Não adequado". Concluímos que explicações normais para tal acuidade de informação (i. e., fraude, sorte, vazamento de informação e leitura fria) são apenas remotamente plausíveis. Esses resultados parecem fornecer apoio empírico para teorias não reducionistas da consciência. (2)
O texto completo do artigo pode ser baixado aqui: http://www.explorejournal.com/article/S1550-8307(14)00108-6/abstract (é necessário autorização). O trabalho teve o apoio da FAPESP (3, processo 2010/11047-0).

Referências

(1) http://www.explorejournal.com/article/S1550-8307(14)00108-6/abstract

(2) Texto original em inglês: "We identified 99 items of verifiable information conveyed in these 13 letters; 98% of these items were rated as “Clear and Precise Fit” and no item was rated as “no Fit.” We concluded that normal explanations for accuracy of the information (i.e., fraud, chance, information leakage, and cold reading) were only remotely plausible. These results seem to provide empirical support for non-reductionist theories of consciousness."

(3) Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo: http://www.fapesp.br/

16 de março de 2014

Livro VII - Mediunidade Mensurável (de S. Fontana)


O pesquisador Sandro Fontana recentemente publicou o livro "Mediunidade Mensurável - um livro digital que resume uma pesquisa sobre a possibilidade de medir estimadamente a mediunidade de uma pessoa", disponível gratuitamente (1) e contendo sua pesquisa em mediunidade. Esse livro segue a publicação de seu artigo "Mensuração de nível estimado mediúnico" (2). Aqui tecemos alguns comentários sobre essa obra. Certamente, a iniciativa do autor é louvável, por representar uma iniciativa isolada de aplicar o que seria chamado "metodologia científica" a um vasto campo de estudo como é o da mediunidade. 

Essa iniciativa se destaca uma vez que constatamos que trabalhos semelhantes são escassos no meio espírita,  quase que totalmente voltado para o aspecto religioso do Espiritismo. Não podemos nos esquecer do tríplice aspecto, de forma que as questões e problemas relacionados à parte científica são igualmente relevantes.

O trabalho está dividido nas seguintes partes:
  • Introdução (p. 5);
  • Objetivo (p. 7)
  • Kardec e mediunidade (p. 9)
  • A verdadeira, a falsa e a mediunidade intermediária (p. 14)
  • A incógnita constante do médium (p. 21)
  • O surgimento dessa pesquisa (p. 24)
  • Iniciando a tabela (p. 26)
  • A lógica base (p. 28)
  • Expondo médiuns à formulação (p. 35)
  • Os níveis e os médiuns (p. 54)
  • Os tabus (p. 56)
  • A aplicação (58);
  • Conclusão (p. 60)
Logo na introdução, o autor destaca a justificativa do trabalho:
Acredito que o desafio aqui, algo que a necessidade demonstrou ser importante, é tentar ser o mais justo possível, dando um passo além para esse novo século onde o espiritismo precisa resgatar o lado da pesquisa. Hoje temos enraizado profundamente os sedimentos morais/religiosos de espiritismo, porém o lado científico ficou estagnado no tempo e, assim que conseguirmos avançar nele, conseguiremos reforçar, junto da filosofia espírita, os passos seguintes para progredir na marcha evolutiva.
Nada mais justo... Fazer crescer o aspecto científico do Espiritismo certamente é justificativa importante. Porém, não se pode esperar isso com abandono total do que foi construído, em que pese a aparência de "estagnação". Como ciência, o Espiritismo ainda é muito jovem (3) e não dispõe de orçamento próprio do Estado para seu desenvolvimento.

O autor se baseou na definição universal de Kardec para o vocábulo "mediunidade" (ver "Kardec e a mediunidade", p. 9). Um pouco depois, o autor comenta:
Alexandre Aksakof descobriu o efeito anímico no médium, ou melhor, depois de seus estudos, propôs a tese de que o médium, mesmo sem intenção, provoca um efeito que confunde-se com a comunicação mediúnica.
Em diversas partes da obra de Kardec já se afirmava sobre a existência de efeitos anímicos, que não receberam, obviamente, esse nome (4). Por exemplo:
Embora geralmente o sensitivo mediúnico esteja desperto, em certos casos, que se tornam cada vez mais frequentes, o sonambulismo espontâneo se declara no médium, e este fala por si mesmo, ou por sugestão, absolutamente como o sonâmbulo magnético se conduz nas mesmas circunstâncias. (5, grifos nossos)
Aksakof parece ter sido, na verdade, o primeiro pesquisador a diferenciar entre as explicações totalmente anímicas para a mediunidade (advindas quase que integralmente dos meios céticos) daquelas totalmente espíritas, e a ressaltar o papel da influência do médium em meios que não aceitavam as teses de Kardec.

Devemos considerar que os médiuns da época de Kardec talvez não apresentassem suas mediunidades no mesmo grau dos de hoje. Assim como houve redução drástica nas manifestações de efeitos físicos, é provável que efeitos anímicos tenham prevalecido posteriormente, o que torna a questão ainda mais complexa. 

As questões colocadas pelo autor na p. 12 são pertinentes:
Mas e se o médium não for confiável?
E o que o faz não ser confiável?
Até que ponto a comunicação está sendo verdadeiramente efetiva?
Essas parecem ser as questões que motivaram o autor a realizar sua pesquisa. Ou, de outra forma: seria possível desenvolver um método quantitativo para ajudar na resposta a essas questões? A divisão feita entre "mediunidade falsa" (chamada "anímica") da mediunidade intermediária (que seria verdadeira, mas com algum grau de animismo) parece justificar a busca por uma escala de classificação que  transcenderia Kardec. Por isso, na parte seguinte (p. 14), o autor deixa de seguir Kardec (6). 

A questão é que, para Kardec, métodos quantitativos seriam os últimos a serem buscados nessa empreitada. Mediunidade é, fundamentalmente, um fenômeno humano e, com esse tipo de efeito, métodos quantitativos se mostram problemáticos (7), de difícil senão impossível aplicação. O leitor de "Mediunidade mensurável" deve saber que nos movemos em uma região potencialmente infrutífera ao seguir esse caminho. 

 Proposta de quantificação de mediunidade

O autor estima que, na comunicação, 50% vem do "pensamento" do Espírito comunicante e outros 50% do médium (p. 29):
Dessa forma, eu dividi a comunicação em dois momentos, sendo 50% ao pensamento (espírito) e os outros 50% ao repassador/transmissor (médium).
É difícil entender qual foi o raciocínio necessário para propor essa divisão porque "pensamento" (do médium e do Espírito) é algo imensurável e não se pode definir percentagens com atributos imensuráveis. Como afirmamos acima, a palavra "animismo" é posterior à codificação, mas isso não significa que não tenha sido discutido por Kardec. Mais a frente, ainda na p. 29:
Kardec, em toda sua obra, não explicita tal condição de forma clara, acabei descobrindo isso (por acaso) em meus testes e observações. Na Codificação Espírita, ao lê-la, temos a impressão que o espirito não tem problemas em se comunicar e que tudo depende absolutamente da sensibilidade do médium.
Criar percentagens a atributos imensuráveis não tem sentido e esse seria um erro que Kardec não cometeria e não cometeu. Além disso, o problema aqui é que termos usados em meados do século XIX não têm o mesmo significado hoje em dia (como por exemplo, "sonambulismo espontâneo" que pode ser compreendido como "transe anímico"), de forma que não se pode dizer taxativamente que a noção de influência do médium esteja ausente da codificação.

A proposta do autor de quantificação segue uma fórmula (ver p. 30) que aparece como uma média ponderada (%Vm) de valores estimados de vários "atributos" (da mensagem e do médium). Embora o autor reconheça a diferença entre cada tipo de atributo, eles são misturados em uma mesma fórmula com pesos iguais (8), com índices negativos para médiuns considerados fraudulentos.

A aplicação da fórmula é exemplificada por vários casos que parecem seguir a opinião do autor a respeito de determinado médium. Uma vez calculados um índice (%Vm), uma proposta de quatro classes mediúnicas é finalmente apresentada na p. 54.

Claramente existiria uma grande vantagem se fosse possível identificar um bom médium por meio de avaliação quantitativa tão direta como a que é explicada em "Mediunidade Mensurável". Essas vantagens são discutidas nas p. 58-60. É perceptível o desejo do autor em colaborar com o desenvolvimento de novos estudos para a mediunidade, o que, por si só, é algo difícil de constatar nos meios dedicados ao assunto.  

Palavras finais

Mediunidade (assim como a inteligência e a beleza) parece ser uma faculdade humana intrinsecamente imensurável. Entretanto, podemos sim definir medidas quantitativas para o conteúdo da mensagem (9). Por exemplo, dada uma mensagem mediúnica, podemos fazer uma análise sintática e numérica dela, contando-se o número de substantivos, verbos etc. que ela contém. Podemos analisar mais profundamente seu conteúdo, buscando traçar a correspondência fato-informação para cada elemento de mensagem nela presente.

Como é que tal análise poderia caracterizar a mediunidade? Parece ser correto afirmar que, quanto maior a fidelidade do médium na transmissão do conteúdo, mais "desenvolvida" seria a sua mediunidade. Nesse sentido o autor de "Mediunidade Mensurável" identificou a relação entre conteúdo e excelência da fonte que o produz no caso de psicografias.

Entretanto, esbarramos em problemas grandes ao querer criar uma escala numérica de qualificação para médiuns. O problema é que a mediunidade psicográfica (ou psicofônica), apesar de produzir mensagens concretas, ainda é um fenômeno privado do ser humano. Como ponto para meditação, devemos considerar que é possível que o médium seja excelente (no sentido de entrar em contato com muita informação), mas não consiga corretamente colocar no papel todo o conteúdo.

Para exemplificar, imaginemos dois rádios de uma mesma marca. Um está de acordo com suas especificações de fabricação, enquanto que outro tem um problema em seu alto-falante, que não permite interpretar corretamente o que é transmitido. Então, nesse caso simples, não seria possível colocar o rádio defeituoso como uma "outra classe", ou dizer que o rádio perfeito é "superior". O máximo que se pode dizer é que existe um defeito em um dos rádios. Com isso queremos dizer que, no caso da mediunidade, dificuldades de transmissão de conteúdo podem não ser devidas a diferenças intrínsecas entre classes. Em suma, mediunidade ainda é algo bastante complexo para permitir avaliações quantitativas, mesmo nos casos mais concretos.

Referências e notas
  1. S. Fontana. Mediunidade Mensurável. Um livro digital que resume uma pesquisa sobre a possibilidade de medir estimadamente a mediunidade de uma pessoa. Digital e-book. Acesso em 2014. 62 páginas.
  2. Ver apresentação do autor (em 19/agosto/2012): https://www.youtube.com/watch?v=Pb5JSan2DUE
  3. Séculos foram necessários para dar à física a aparência de "modernidade"e para que ela fosse financiada com recursos públicos. Devemos nos confiar totalmente nas aparências?
  4. Ver, por exemplo: "O Livro dos Médiuns", Segunda parte - Das manifestações espíritas, Capítulo XX - "Da influência moral do médium", Questões diversas.
  5. Revista Espírita 1867, Junho, Dissertações espíritas - "O Magnetismo e o Espiritismo comparados".
  6. Essa ausência de quantificação possivelmente é vista pelo autor como um sinal de "estagnação" do método de Kardec.
  7. Veja, por exemplo, as controvérsias envolvendo a definição de um "quociente de inteligência": Mark Snyderman and Stanley Rothman, (1988), "The IQ Controversy, the Media and Public Policy", Transaction Books.
  8. É fato básico que só se pode somar, subtrair, multiplicar ou dividir "banana com banana" ou "maça com maça". 
  9. Ver projeto "Cartas psicografadas": http://eradoespirito.blogspot.com.br/p/projeto-cartas-psicografadas.html