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25 de fevereiro de 2016

Arquivos históricos com imagens de periódicos espiritualistas antigos.

Imagem  do "Almanaque del Espiritismo", edição de 1873 (ano I) editado em Madri (1).
Fonte: Biblioteca Nacional de Espanha.

A IAPSOP (2, International Association for the Preservation of Spiritualist and Occcult Periodicals) ou "Associação Internacional para preservação de periódicos espiritualistas e de ocultismo" disponibiliza uma página na internet com diversas imagens de periódicos antigos e raros relacionados aos temas espiritualistas. 

O acesso se dá por um link em língua inglesa:

http://www.iapsop.com/archive/materials/index.html (acesso em Fevereiro de 2016)

Dentre as preciosidades, podemos acessar:


dentre outros. Tais referências são fontes relevantes para pesquisadores em diversas áreas e representam memória importante, em particular, para o movimento espírita e espiritualista ao longo dos séculos XIX e XX.

Agradeço ao Chyristiann Lavarini por nos comunicar o link.


Referências

1 -Ver:
 http://www.iapsop.com/archive/materials/almanaque_del_espiritismo/almanaque_del_espiritismo_1873.pdf
2 - http://www.iapsop.com/ (acesso em fevereiro de 2016)

23 de junho de 2014

O cérebro como a última fronteira da ciência: perspectivas recentes e a visão espírita (2)

Continuação do post contendo o artigo "Le cerveau comme ultime frontière de la science: perspectives récentes et vision spirite" que foi publicado na revista Revue Spirite, número 93 (Revue trimestrelle: 157 année - Revue Spirite - Journal d'Études Psychologique.). Agradeço ao Leandro Pimenta e ao Jérémie Philippe pela oportunidade dessa publicação. Para ver a primeira parte, clique aqui.

A fenomenologia psíquica que expande a variedade de experiências conscientes
Muito antes que as primeiras teorias modernas sobre a consciência fossem desenvolvidas, o espiritualismo no século XIX já considerava a existência de uma rica variedade de experiências de consciência que se manifestam como uma forma expandida das experiências ordinárias descritas anteriormente. Consideremos, por exemplo, a diferença entre a perspectiva de primeira e terceira pessoa na descrição dos estados mentais. É amplamente aceito que apenas eu tenho lucidez plena de minhas sensações, memórias e percepções (que é a própria definição de translucidez). Entretanto, médiuns de efeitos inteligentes descrevem sensações e cognições experimentadas por indivíduos já falecidos que puderam ser verificadas por seus parentes mais íntimos. Em um nível mais elementar, as experiências de ‘transmissão de pensamento’ (ou telepatia) permanecem como instâncias de acesso privilegiado ao campo mental, mesmo entre os vivos, desafiando o conceito de translucidez. Consideremos os casos de fobias em crianças como descritos por I. Stevenson (1990), que se manifestam como origem em memórias de vidas passadas. É bem aceito que muitas emoções (como o medo) têm como base determinadas crenças (memórias), mas o que dizer de fobias a partir de memórias inexplicáveis como a de vidas passadas? Nesse sentido, a variedade dos fenômenos psíquicos aumenta o conjunto das experiências ordinárias de duas formas: como uma expansão dos sentidos ordinários (novas sensações, percepções e emoções) e como uma não conservação da informação mental (se a consciência tem origem no cérebro, por conservação de informação, ela não pode manifestar conhecimentos localizados fora dela tanto no espaço como no tempo). Infelizmente, ainda não existe uma medida generalizada da informação que seja suficientemente aplicável a todas as experiências da consciência. Esse problema contribui, por exemplo, para o desprezo acadêmico dos relatos de sensações e percepções mediúnicas ou de memórias de vidas anteriores. Não se trata de um problema simples, porque o reconhecimento da não conservação da informação pressupõe o próprio reconhecimento da informação que, por sua vez, exige um paradigma completamente novo para a consciência.

Kardec, de forma pioneira, considerou muitos dos fenômenos de consciência expandida, conforme podemos ler no Cap. VIII de ‘O Livro dos Espíritos’ (Kardec, 1949). É possível, por exemplo, fazer um paralelo entre os fenômenos de visitas espíritas entre pessoas vivas, transmissão oculta de pensamento, letargia, catalepsia, sonambulismo com o artigo recente de M. Nahm (2011) “Reflections on the Context of Near-Death Experiences”, que trata do ambiente ou contexto de muitas experiências de quase-morte (NDE). Esses relatos envolvem experiências fora do corpo que foram reciprocamente confirmadas, sonhos e NDE compartilhados, relações entre lembranças de vidas passadas, NDE e mediunidade, lucidez terminal e visões de leito de morte. Toda essa rica fenomenologia atesta para a existência de um segundo corpo que sobrevive à morte do corpo material e que manifesta a independência de estados mentais da fisiologia do cérebro. Conforme comenta Nahm:
A hipótese de que uma NDE não depende do estado da organização orgânica no cérebro constitui um modelo explicativo capaz de lidar com o enigma sobre porque as experiências NDE podem ser tão notavelmente similares sob condições tão variadas da fisiologia do cérebro.
Surge a física quântica

A existência de estados mentais que parecem não depender do estado fisiológico do cérebro, bem como a possível extensão das propriedades desses estados através do aparecimento de novas percepções forma uma rica fenomenologia que contrasta fortemente com os modelos reducionistas da mente. Em pelo menos um fenômeno, o da transmissão de pensamento, estados mentais são vistos como transcendendo ao aparelho físico de onde, ordinariamente, parecem surgir. Mesmo fora das considerações espiritualistas, não parece ser possível associar a dinâmica determinista dos neurônios com as experiências de cognição, sensações e percepções que são vividas em primeira pessoa pelo ser pensante. Tudo isso fez com que se procurassem um novo arcabouço físico capaz de acomodar algumas das propriedades mais estranhas dos estados mentais. A física quântica, com suas bizarras manifestações no reino microscópio, é vista como um desses arcabouços potencialmente férteis em torno do qual uma nova ciência da mente poderia ser construída.

Fundamentalmente, a física quântica tem como objetivo explicar o comportamento da matéria, principalmente em seu nível microscópio. Não há nada nela que preveja a existência de um elemento mental independente (Chalmers, 1995). Os estados quânticos são estados da matéria e são descritos por um formalismo especial muito diferente do formalismo da física clássica que a antecede. Portanto, as interpretações não ortodoxas da física quântica, que são vistas como promissoras para o desenvolvimento de uma nova teoria da consciência, não abandonam o monismo necessariamente, embora o papel do observador – como responsável pelo ‘colapso da função de onda’ – seja privilegiado (Wigner, 1961). O mainstream acadêmico dentro das neurociências não aceita o papel da física quântica como fundamental na explicação da dinâmica do cérebro porque não se encontrou um mecanismo para sua atuação, embora algumas propostas já tenham sido feitas (Hameroff e Penrose, 1996). Isso não impede, porém, que sejam feitos paralelos entre interpretações da física quântica e sua aplicação a estados mentais. Esse paralelo se estabelece de duas formas: através de um possível papel privilegiado do observador no fenômeno do colapso da função de onda – que faria com que indivíduos conscientes determinassem a realidade até certo ponto (e, principalmente, os estados microscópicas das células nervosas, encontrando-se lugar para o livre-arbítrio intrínseco no cérebro) e no fenômeno da não localidade, que fornece subsídios para se entender o acesso privilegiado a estados mentais de terceiros como uma manifestação de emaranhamento quântico. É preciso que o leitor compreenda, porém, que essas propostas se dão em um nível heurístico – elas são propostas de interpretação – não se constituindo teoria geral para os estados de consciência em termos do formalismo da física quântica. Essas são propostas que permitem que se discuta academicamente a ‘fenomenologia das anomalias mentais’ ou outros fenômenos pouco aceitos, diante de uma teoria dominante para a qual nada disso existe. Desprovido de exageros, esse talvez, seja a principal vantagem do uso heurístico da física quântica na abordagem dos problemas da consciência.

Discussão final

Não obstante toda a sofisticação dos métodos modernos de exame neurológico e teorias matemáticas em inteligência artificial, o problema da consciência permanece não resolvido. Esse problema se agiganta quando consideramos as múltiplas variedades de experiências mentais anômalas que são conhecidas desde os primeiros dias do Espiritismo. Heurísticas de interpretação de fenômenos mentais que se baseiam nos fundamentos da física quântica abrem perspectivas acadêmicas – embora com pouco apoio formal – na consideração justa de fenômenos mentais anômalos. A existência da fenomenologia psíquica coloca severos limites às teorias reducionistas da mente que têm na complexidade, não linearidade e realimentação das células neurais os principais fundamentos dessa abordagem reducionista. O reducionismo fisicalista, da forma como é concebido hoje, não é completo o suficiente para abarcar todos os fenômenos mentais existentes. No nosso ponto de vista, o maior problema para o desenvolvimento de uma correta ciência da mente a partir de tais modelos reducionistas está na inexistência de uma definição suficientemente abrangente para a informação, de como ela pode ser gerada e armazenada. De um ponto de vista puramente acadêmico, temos certeza de que, entendido o cérebro como um sistema fechado, será possível demonstrar a não conservação de informação em muitos fenômenos mentais relevantes, indicando que a consciência não se encontra limitada ao cérebro, que funciona como órgão transmissivo da informação mental e das diversas manifestações conscientes.

Referencias

Chalmers, D. J. (1995). The conscious mind, in search of a theory of conscious experience. Dep. of Philosophy, Univ. of California.

Haykin, S. (1994), Neural Networks, a comprehensive foundation. Prentice-Hall, Inc.

Hopfield, J. J. (1982). Neural networks and physical systems with emergent collective computational abilities. Proceedings of the National Academy of Sciences of the USA. 79, p. 2554.

Hameroff, S. e Penrose, R. (1996).  Conscious Events as Orchestrated Space-Time Selections. Journal of Consciousness Studies 3(1) , p.36.

Hopfield, J. J. e Tank, T. W. (1986). Computing with neural circuits: a model. Science, 233, p. 625.
James, W. (n.d.), Human Immortality. Texto digital disponível em: http://godconsciousness.com/humanimmortality.php (acesso em 2013).

Kardec, A. (1949), O Livro dos Espíritos, Ed. Federação Espírita Brasileira.

Kardec, A. (1986). A Gênese, os milagres e as predições segundo o Espiritismo. Gênese orgânica, o homem corporal, Parágrafo 30. Trad. Victor Tollendal Pacheco. São Paulo: Ed. NG Promoções editoriais, 

Maslin, K. T. (2001), An introduction to the philosophy of mind, Blackwell publishers Inc.  

McCulloch, W. S. e Pitts, W. (1943). A logical calculus of the ideas immanent in nervous activity. Bulletin of Mathematical Biophysics. 5, p. 115.

Nahm, M. (2011), Reflections on the Context of Near-Death Experiences, Journal of Scientific Exploration, 25(3), pp. 453.

Rosenblatt, F. (1958). The perceptron: a probabilistic model for information storage and organization in the brain. Psychological review, 65, p. 386.

Searle, J. (1989), Mind, Brains and Science: Reith Lectures, Harmondsworth: Penguin.

Stevenson, I (1990), Phobias in Children who claim to remember previous lives, Journal of Scientific Exploration, 4(2), p. 243.

Wigner, E.P. 1961. Remarks on the mind–body question. In (I.J. Good, ed.) The Scientist Speculates. New York: Basic Books.

25 de abril de 2014

O cérebro como a última fronteira da ciência: perspectivas recentes e a visão espírita (1)

Tivemos a satisfação de ter publicado o artigo "Le cerveau comme ultime frontière de la science: perspectives récentes et vision spirite" na revista Revue Spirite, número 93 (1). Agradeço ao Leandro Pimenta e ao Jérémie Philippe pela oportunidade dessa publicação. Com a devida autorização da revista, numa série de dois posts que se inicia com este, apresentaremos o texto integral em português desse artigo. ATENÇÃO: as referências do artigo serão apresentadas no final post final.

Conteúdo do artigo
  • Introdução 
  • As diversas abordagens da mente que não consideram a fenomenologia psíquica 
  • A fenomenologia psíquica que expande a variedade de experiências conscientes 
  • Surge a física quântica 
  • Discussão Final 
  • Referências.
O Espiritismo e o materialismo são como dois viajantes que caminham juntos, partindo do mesmo ponto; chegados a certa distância, um diz: “Não posso ir mais longe”; o outro continua sua rota e descobre um mundo novo. Por que, pois, o primeiro diz que o segundo é louco, pois este, entrevendo novos horizontes, quer franquear o limite onde o outro acha conveniente se deter? (A. Kardec)
Introdução

Desde seu aparecimento com Allan Kardec, o Espiritismo expandiu consideravelmente nossa compreensão a respeito de uma multiplicidade de fenômenos naturais e ocorrências anômalas, antes consideradas como pertencente ao reino do maravilhoso e do sobrenatural. Alguns desses fenômenos foram, em parte, considerados recentemente na parapsicologia, mas são sistematicamente desprezados pelo status quo acadêmico, que está exclusivamente voltado para o desenvolvimento de seus próprios paradigmas. Diante da proposta espírita, que tem na imortalidade e reencarnação suas maiores bandeiras, como podemos compreender as pesquisas recentes no campo da consciência e da mente? Que contribuições se pode esperar do Espiritismo para as futuras teorias da mente? A física quântica representa uma nova abordagem em direção a vias não materialistas de se compreender a mente? Este texto tem como objetivo dar subsídios ao leitor na tentativa de resposta a algumas dessas questões. Embora não tenhamos hoje uma teoria suficientemente abrangente para a mente, defendemos aqui a noção de que não é possível desprezar os fenômenos psíquicos (mediunidade, experiências fora do corpo, experiências de quase morte etc) que terão papel fundamental na gênese de abordagens científicas completas para o fenômeno da consciência, que surge como última fronteira ainda inexplorada da ciência. 

As diversas abordagens da mente que não consideram a fenomenologia psíquica.

Teorias recentes sobre o cérebro consideram seu funcionamento dentro do paradigma materialista, que é essencialmente monista, ou seja, consideram a consciência como uma consequência, como algo que resulta de outro, não como causa ou princípio irredutível. A consciência é vista como produto de atividades básicas do cérebro, onde neurônios, sinapses e, principalmente, o arranjo das ligações entre um número muito grande de estruturas cerebrais fundamentais têm papel fundamental. À complexidade dos sinais que se propagam através de vias de comunicação do cérebro e do sistema nervoso é creditada a variedade, colorido e exuberância das experiências da consciência. Também chamada de teoria da identidade mente-cérebro, sua maior promessa é reduzir todas as múltiplas experiências mentais a funções mais ou menos elementares entre os diversos constituintes do cérebro. Assim, da mesma forma como a função do estômago é produzir a digestão, o do cérebro seria produzir a experiência consciente. A força da abordagem monista da mente está no sucesso recente do fisicalismo e do reducionismo, que possibilitaram desenvolver métodos e explicações para muitos fenômenos da matéria. É uma crença nas neurociências que essa redução a leis e interação entre átomos, que teve tanto sucesso na explicação do comportamento da matéria bruta, possa ser estendida com igual sucesso para a ‘matéria pensante’.

Consideremos brevemente o paradigma mais recente das redes neurais como modelo de ‘processamento’ que ocorrem em todo o sistema nervoso central e periférico. Esse paradigma engloba em parte a noção de ‘inteligência artificial’ (Haykin, 1994; McCulloch e Pitts, 1943). Um neurônio é, essencialmente, uma unidade de processamento elementar que integra sinais elétricos que chegam a ele (por meio das chamadas ‘entradas sinápticas’) e que retorna um sinal elétrico de saída que se propaga ao longo de uma fibra da célula nervosa chamada axônio. No corpo celular, onde se dá a integração dos sinais provenientes das sinapses, ocorre o processamento das entradas e o sinal de saída depende de um potencial interno de ativação. Ao se agrupar conjuntos de neurônios em camadas – cada neurônio recebendo as mesmas entradas – é possível modelar o processo de aprendizado que se reduz a um problema de otimização (Rosenblatt, 1958). Acredita-se que o cérebro, sendo formado por aglomerados compactos de bilhões de células nervosas, opere em escala microscópica o processamento de sinais que chegam a cada um dos nervos do sistema nervoso periférico. Desenvolvimentos recentes em redes neurais mostraram que essas redes podem ser classificadas em dois tipos: redes de propagação avançada (feedforward propagation) e redes recorrentes. Essas últimas diferem das primeiras por permitirem que sinais de saída de um dado neurônio alimentem, como entrada, outros neurônios de uma mesma camada e o próprio neurônio. Em outras palavras, redes recorrentes admitem feedback ou realimentação. Neurônios biológicos são todos do tipo recorrente, ou seja, o processamento da informação (que, segundo esse modelo está armazenado nos pesos sinápticos e potenciais de ativação de cada célula nervosa) faz uso maciço de realimentação. Além disso, ele também utiliza processamento paralelo. Embora a eficiência computacional de redes neurais seja inferior a outros tipos de processadores (numa comparação com processadores eletrônicos), acredita-se que a quantidade gigantesca de células e conexões neurais, o paralelismo e uso de realimentação torne o cérebro um dispositivo único, no que diz respeito ao tratamento de grandes quantidades de informação. Os desenvolvimentos em redes neurais mostraram que é possível dividir o processo de aprendizado em vários tipos (com ou sem supervisão externa) e os estudos mais interessantes ocorreram no campo da neurodinâmica, com aplicações em redes recorrentes. Acredita-se que a nonlinearidade intrínseca das redes com realimentação e seu elevado número de conexões seja a principal fonte de riqueza de informação no cérebro (Hopfield, 1982). Essa não linearidade é fonte de caos clássico, sendo possível encontrar descrições deterministas da dinâmica entre neurônio, onde o processo de lembrança é visto como um problema de convergência de estados mentais em torno de mínimos de energia e bases de atratores caóticos (Hopfield e Tank, 1986). O determinismo implícito nesses modelos de dinâmica entre neurônios é pontuado pela influência do ruído, que é tomado como fonte de aleatoriedade e, portanto, origem do livre-arbítrio do ser pensante na visão reducionista da mente. 
Um diagrama esquemático de uma rede neural com realimentação. Os sinais de entrada (x1, x2 e x3) são misturados aos sinais de realimentação que vêm de cada neurônio (cujos centros são representados pelos círculos com o sinal de "+"). As saídas, y1, y2 e y3 são, portanto, não apenas função da entrada. Esse tipo de arranjo (conhecido como "rede de Hopfield") cria não linearidades e comportamento aleatório, fornecendo um paradigma para explicar, talvez, o livre arbítrio (?). Embora sua simplicidade, esse tipo de rede estaria na base de todas as estruturas do sistema nervoso.
Embora o grau de sofisticação dos modelos numéricos em neurodinâmica, o problema central da consciência permanece, uma vez que não é possível associar o trânsito de informação (na forma de sinais elétricos) entre neurônios, com a riqueza exibida pelos estados de consciência, conforme explicaremos mais adiante.  Assim, em paralelo com os recentes desenvolvimentos das neurociências, permanece o paradigma dualista como abordagem alternativa para a consciência. Diferente da abordagem monista, para a qual a consciência é um produto de arranjos específicos entre elementos fundamentais que formam o cérebro, no dualismo não se pode reduzir a mente a um arranjo desses elementos, por mais complexos que sejam. O ser humano (e, muito possivelmente a imensa maioria dos animais) é, em essência, um sistema dual, composto de matéria, que forma a contraparte tangível, e espírito (ou a mente) que interage, através de um mecanismo especial, com a matéria, mas que é, ele mesmo, intangível. Isso significa que não é possível registrar o espírito da mesma forma como se faz com a matéria, apenas suas manifestações são percebidas. Em uma variedade especial de dualismo, o espiritualismo admite que esse princípio, que carrega a consciência, é independente da matéria, o que possibilita ao primeiro sobreviver à decomposição da última com o fenômeno chamado ‘morte’.

Em princípio, seria possível contrapor o dualismo ao monismo fisicalista, considerá-los como duas explicações antagônicas para a mente, mas, isso não é verdade. O grande psicólogo americano William James brilhantemente construiu um paralelo para explicar como o cérebro pode ser visto como um órgão transmissivo da consciência, que existiria em um espaço inacessível, mas que, por meio do cérebro, se manifesta no mundo. Ele considerou o exemplo do prisma óptico, que é capaz de separar a luz branca em suas cores fundamentais. A luz é a verdadeira causa do espectro que, apenas pelo prisma pode ser decomposta. Assim, também, a consciência é uma manifestação, através do cérebro, do espírito que, de outra forma, não pode se manifestar. Portanto, considerar a consciência como origem no cérebro é tão equivocado quanto acreditar que o prisma gere as cores do espectro da luz branca. Modernamente, esse paralelo ganhou novas versões através dos dispositivos de telecomunicações. Portanto, à crítica materialista de que o cérebro é a verdadeira fonte da consciência porque, uma lesão nele, leva a sequelas mais ou menos graves nas manifestações da consciência, pode-se contrapor a noção do cérebro como órgão de transmissão das funções da consciência, que têm sua origem em uma mente fora do cérebro. Alias essa noção já se encontra bem desenvolvida em ‘O Livro dos Espíritos’ (Kardec, 1949), conforme se pode ler no Capítulo VII, ‘Da volta do Espírito à vida corporal’, ‘Influência do organismo’ (Questões 367-370 e 375). Portanto, há uma dinâmica de sinais entre neurônios, no cérebro, que é necessária para facultar a manifestação do verdadeiro ser pensante que é a fonte da consciência.

De um ponto de vista puramente filosófico, o reducionismo fisicalista e o dualismo permanecem como as principais teorias da mente, embora outras abordagens também existam como o Behaviorismo analítico, o funcionalismo e o monismo não redutivo (Maslin, 2001). Todas elas mais ou menos pregam o caráter irredutível da mente, sem postular a existência de um elemento independente da matéria. Uma teoria suficientemente abrangente da mente deve ser capaz de explicar os diversos aspectos da consciência que, conforme Maslin (2001), podem ser sumariamente descritos por: 

i) sensações (dores e prazeres, por exemplo); 
ii) cognições (acreditar, saber, compreender, raciocinar etc); 
iii) emoções (medo, ciúme, inveja, raiva etc); 
iv) percepções (visão, audição, paladar etc); 
v) estados de quase percepção (sonhar, imaginar, ‘ver com os olhos da mente’ etc) e 
vi) estados conativos (querer, intentar, desejar etc). 

No caso das sensações, por exemplo, essa teoria deve explicar e justificar a existência e variedade dos qualia ou modo peculiar pelo qual as sensações se apresentam ao ser pensante. Tal tarefa presentemente nem de longe foi realizada, considerando outros aspectos da experiência consciente, além dos qualia, tais como: não localidade (embora seja possível localizar alguns sensações, não tem sentido falar em localização das emoções, dos estados de quase percepção etc); caráter disposicional de crenças, memórias e conhecimentos (em um dado instante, é possível saber algo sem se estar ciente disso naquele instante); intencionalidade (que é característico dos estados conativos, mas, por exemplo, não das sensações); perspectivas de primeira e terceira pessoa (só eu, por exemplo, sei das minhas próprias experiências, mas apenas conheço as manifestações da consciência dos outros por meio das minhas percepções e cognições); além do aspecto de translucidez, que está intimamente associado ao caráter de primeira pessoa da experiência consciente e do caráter holístico dos estados intencionais que estão ausentes, por exemplo, nas sensações (Searle, 1984).

Próximo post: A fenomenologia psíquica que expande a variedade de experiências conscientes.

Nota

(1) - Revue trimestrelle: 157 année - Revue Spirite - Journal d'Études Psychologique.
(2) - http://www.larevuespirite.com/home.php

22 de agosto de 2013

Sobre cartas psicografadas: artigo na Revue Spirite 2013 (Tradução Leandro S. Pimenta)


O amigo e pesquisador Leandro S. Pimenta traduziu para o francês um artigo de nossa autoria com o título original: "Estatística de Cartas Psicografadas" que será publicado na edição mais recente da Revue Spirite. Esse artigo é um resumo de um trabalho apresentado durante o 8o. ENLIHPE que ocorreu em 2012

O título do trabalho presente na revista é "À Propos de Lettres Psychographiées' e está na página 13 da Edição do Segundo Trimestre de 2013, na seção "Dossier: La recherche Spirite".

Esta edição também traz o trabalho "Las chercheurs du Spiritisme Réunis!" por Leandro Pimenta que é um resumo sobre a LIHPE e sua história.  

Quem conhece a língua francesa e quiser conhecer o trabalho, pode seguir as direções para pedidos de aquisição de exemplares da "Revue Spirite" aqui

Agradecemos aqui ao Leandro o trabalho excelente de tradução.

Outras referências



21 de abril de 2012

Nova performance do fragmento mediúnico de sonata de Mozart (Érico Bomfim)

O Espírito de Mozart acaba de ditar ao nosso excelente médium, Sr. Bryon-Dorgeval, um fragmento de sonata. Como meio de controle, este último o fez ouvir por diversos artistas, sem lhes indicar a origem, mas lhes perguntando apenas o que achavam do trecho. Cada um nele reconheceu, sem hesitação, o estilo de Mozart. O trecho foi executado na sessão da Sociedade de 8 de abril último, em presença de numerosos conhecedores, pela senhorinha de Davans, aluna de Chopin e distinta pianista, que teve a gentileza de nos prestar o seu concurso. Como elemento de comparação, a senhorinha de Davans executou antes uma sonata que Mozart compusera quando vivo. Todos foram unânimes em reconhecer não só a perfeita identidade do gênero, mas ainda a superioridade da composição espírita. A seguir, com o seu talento habitual, a mesma pianista executou um trecho de Chopin. (A. Kardec, Revue Spirite, Maio de 1859)
Em comemoração à edição de 'O Livro dos Espíritos' em 18 de abril, apresentamos nova performance, por Érico Bomfim, do famoso fragmento de sonata atribuído ao Espírito de Mozart. Essa composição foi recebido pelo médium Brion D'Orgeval e tocada pela primeira vez pela Mlle. De Davans à Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas em abril de 1859, coordenada, na época, por Allan Kardec. De Davans foi aluna de Frédéric Chopin.

A música corresponde ao mesmo fragmento que foi queimado no Auto da Fé de Barcelona (Nota 1), Espanha, a 9 de outubro de 1861.


O Manuscrito

O manuscrito original chegou a ser vendido a 2 francos na época (1860) conforme consta em diversos trechos de artigos da Revue Spirite (Janeiro de 1860): 
O do Sr. Oscar Comettant (vide le Siècle de 27 de outubro último, e nossa resposta na Revista de dezembro de 1859), produziu a venda, em poucos dias, na casa Ledoyen, de mais de cinquenta exemplares da famosa sonata de Mozart (que custa 2 fr., preço líquido, segundo a importante e espirituosa observação do Sr. Comettant).
Ou, em outro trecho:
Nota - O fragmento de sonata ditado pelo Espírito de Mozart acaba de ser publicado. Pode-se procurá-lo, seja no Escritório da Revista Espírita, seja na livraria espírita do senhor Ledoyen, Palais Royal, galeria de Orléans, 31 - preço: 2 francos. - Será remetida franqueada, contra remessa de uma ordem dessa quantia.
Hoje em dia, o manuscrito original pode ser comprado por centenas de libras em antiquários europeus (Nota 2 e figuras abaixo).
Capa do manuscrito original
Fragment de Sonate, dicté par l’Esprit Mozart à 
Monsieur Brion d’Orgeval, médium (Année 1859)


Parte I da imagem do fragmento de sonata com compassos numerados (clique na imagem para ampliar).

Parte II da imagem do fragmento de sonata com compassos numerados (clique na imagem para ampliar)

Referências
Sobre Érico Bomfim.

Nascido em 1991 no Rio de Janeiro e cursando (2012) o último ano de bacharelado em piano pela UFRJ. 






Nota 1
"Hoje, nove de outubro de mil oitocentos e sessenta e um, às dez e meia da manhã, na esplanada da cidade de Barcelona, no lugar onde são executados os criminosos condenados ao último suplício, e por ordem do bispo desta cidade, foram queimados trezentos volumes e brochuras sobre o Espiritismo, a saber:

“A Revista Espírita, diretor Allan Kardec;

“A Revista Espiritualista, diretor Piérard;

“O Livro dos Espíritos, por Allan Kardec;

“O Livro dos Médiuns, pelo mesmo;

“Que é o Espiritismo, pelo mesmo;

Fragmento de sonata ditada pelo Espírito de Mozart;

“Carta de um católico sobre o Espiritismo, pelo Dr. Grand;

“A História de Joana d’Arc, ditada por ela mesma à Srta. Ermance Dufaux;

“A realidade dos Espíritos demonstrada pela escrita direta, pelo Barão de Goldenstubbe.

“Assistiram ao auto de fé:

“Um sacerdote com os hábitos sacerdotais, com a cruz numa mão e uma tocha na outra;

“Um escrivão encarregado de redigir a ata do auto de fé;

“O secretário do escrivão;

“Um empregado superior da administração da alfândega;

“Três serventes da alfândega, encarregados de alimentar o fogo;

“Um agente da alfândega representando o proprietário das obras condenadas pelo bispo.

“Uma inumerável multidão enchia as calçadas e cobria a imensa esplanada onde se erguia a fogueira.

“Quando o fogo consumiu os trezentos volumes ou brochuras espíritas, o sacerdote e seus ajudantes se retiraram, cobertos pelas vaias e maldições de numerosos assistentes, que gritavam: Abaixo a Inquisição!

“Várias pessoas, a seguir, aproximaram-se da fogueira e recolheram cinza”. (A. Kardec, Revue Spirite, Novembro de 1861)
Nota 2  Entretanto, uma cópia do manuscrito apareceu em uma versão espanhola recente da Revue Spirite, volume 2 de 1859, p. 366-369 conforme a Ref. 2.