23 de novembro de 2010

Crenças Céticas - IV Onde está fundamentada a autoridade da Ciência?


Mas, estamos certos dos fatos observados? Homens de Ciência são muito rápidos em pontificar que devemos estar certos dos fatos antes de se embarcar em uma teoria. Felizmente, os que dizem isso não o fazem na prática. Observação e teoria funcionam de forma ótima quando integradas, uma ajudando a outra na busca da verdade.  É uma boa recomendação não confiar demais em uma teoria até que tenha sido confirmada pela observação. Espero não chocar os físicos experimentais ao dizer que também é uma boa regra não confiar demais nos resultados da experiência até que eles tenham sido confirmados pela teoria. Sir Arthur Stanley Eddington (1882-1944) Astrônomo e físico inglês.

Embora seja possível ter uma postura dogmática sem apelar para a Ciência, isso raramente acontece na atualidade, visto que a ciência moderna, dado seu alto grau de especialização e sucesso em desenvolvimentos tecnológicos e nas descobertas da Natureza, é invocada pelo pseudoceticismo para invalidar ou sustentar certas proposições a respeito do mundo.

Não há espaço aqui para um estudo profundo sobre os fundamentos da Ciência, o que é feito por um campo da filosofia conhecido como Epistemologia da Ciência. Importa muito mais saber sobre onde repousa a autoridade da ciência, visto que o que é invocado pelo pseudoceticismo é a sua autoridade, muito mais do que seu conteúdo de conhecimento.

Isso é importante, visto que o conhecimento pode ser fundamentado de diversas maneiras, ou seja, podemos sustentar determinada posição a respeito do mundo tanto usando um apelo à autoridade (como fizeram autoridades da Igreja no caso de Galileu Galilei, ao invocarem as Escrituras Sagradas, para invalidarem a tese do movimento da Terra) ou fundamentar a autoridade no próprio conhecimento. Em suma:

* Conhecimento baseado na autoridade: certas proposições sobre as ocorrências do mundo são de uma determinada maneira porque alguém disse que é assim. Exemplos: recorrer à Bíblia para proibir  práticas ou posturas, ou dizer, de certa forma, que 'a Ciência não comprova isso ou aquilo' como querendo implicar que 'os cientistas não acreditam nisso'. Nesse último caso, Ciência é confundida com a 'opinião dos cientistas', que, tanto quanto diz a lógica não tem autoridade fora do campo de estudo a que se dedicam;

* Conhecimento baseado no próprio conhecimento: aqui a fundamentação é algo mais sutil e pouco conhecida. A autoridade da Ciência tem como escopo os objetos de estudo de uma determinada ciência em particular. Dentro desse escopo (e isso é muito importante) a autoridade das doutrinas científicas está baseada nas próprias teorias, ou seja, na capacidade demonstrada dessas teorias em prever acontecimentos e explicar fatos. Exemplo: é certo que a Terra gira em torno do Sol em órbitas elípticas porque o movimento dos astros em seus mínimos detalhes, como vistos desde a Terra pode ser explicado dessa forma. Ao se tentar explicar de outra maneira, as explicações falham em determinados aspectos (mas não em todos!). Por lógica, a explicação mais abrangente e capaz de prever ocorrências não observadas (predições da teoria) é a de maior autoridade.

Muita gente invoca a autoridade da ciência como que fundamentada na opinião dos cientistas. Um exame detalhado de como a Ciência se estabeleceu ao longo de sua história mostra que essa opinião é deficiente. Acreditamos na Ciência porque ela é capaz de nos trazer uma descrição satisfatória a respeito de certos fenômenos que estuda (e não, como pretendem alguns, 'uma visão do mundo').

Acreditar que a Ciência nos traz uma visão de mundo que se pode generalizar para todos os aspectos, mesmo aqueles que ela não estuda e que, por extrapolação, são explicados dentro de determinadas creças, é uma postura chamada 'cientificismo'.

Cientificistas acreditam não só que a Ciência é o caminho a ser usado para estudar qualquer coisa, mas que a Ciência atual já consegue explicar qualquer coisa (teoria de tudo). De fato, podemos dizer que é razoável esperar que a Ciência seja o caminho a ser seguido para se estudar os mais variados fenômenos (mesmo aqueles que não fazem parte do grupo de fenômenos estudados pela comunidade científica presentemente, mas novos fenômenos em estudos de fronteira). Entretanto, será que o conhecimento científico atual pode ser usado para explicar tudo?

É certo que os desenvolvimentos da Ciência revelaram aspectos da estrutura do mundo que merecem a atenção de todos que pretendem estudar novos fenômenos, inclusive anomalias:

* Há uma lógica inerente nas leis da Natureza. O universo conhecido (ou seja, aquele que é objeto de estudo sistemático) pode ser descrito por meio de leis que determinam como os fenômenos ocorrem sob determinads condições ou contextos;

* Acaso e aleatoriedade desempenham um papel importante, embora existam questões profundas relacionadas aos fundamentos do acaso - sobre se ele é 'irredutível' ou não - ou seja, sobre se essa aleatoriedade não se deva antes a ignorância de fatores e não a um caráter inerentemente estocástico das leis da Natureza;

* 'Não existem milagres'. Por definição, um milagre é uma derrogação das leis da Natureza. Como não podemos dizer que temos o conhecimento completo a respeito dessas leis, a ideia de se utilizar milagres para explicar certos fenômenos não pode ser bem vista. O mais correto é assumir que não conhecemos tudo e uma ocorrência 'milagrosa' é uma ocorrência natural de causa e condições de ocorrência desconhecidas;

* O Universo é muito grande. Tanto em termos de suas dimensões físicas e temporais (muito antigo e de futuro desconhecido), como também em sua distribuição hierárquica de dimensões. As variadas escalas de ocorrência dos fenômenos (desde o microcosmo quântico até a escala cosmológica) atestam uma hierarquização extraordinária na maneira como as leis físicas operam. Também a 'grandeza do Universo' implica em nossa incomensurável ignorância a respeito do funcionamento mais íntimo de muitos eventos naturais. A postura correta para se conhecer a verdade é a humildade diante dos fatos naturais e não a arrogância;

* A pesquisa científica é o veículo de busca do conhecimento a respeito das coisas da Natureza. Entretanto, não existe um 'método' ou 'receita' para se fazer ciência. Cada fenômeno, assim como cada objeto de estudo tem seu próprio método ou ferramenta de pesquisa. Querer forçar as coisas, utilizar procedimentos e regras específicas para estudar ocorrências desconhecidas é um erro. Mas erro pior é tirar  conclusões a respeito de certos fenômenos com base numa aplicação incorreta de um método. Por exemplo: eventos psíquicos não podem ser reproduzidos em laboratório. Isso é uma característica do fenômeno que exige condições especiais de ocorrência. Muitos céticos dogmáticos concluem pela inexistência dessas ocorrências psíquicas por causa de sua não reprodutibilidade. A falta de conhecimento a respeito das condições é um entrave ao desenvolvimento da Ciência, tanto no estudo de fenômenos muito conhecidos como com as ocorrências mais raras.

De todas essas considerações, a falha em compreender a última colocação acima tem sido um obstáculo ao desenvolvimento da ciência dos fatos espíritas. Grande parte da retórica pseudocética gira em torno da reprodutibilidade dos fenômenos anômalos exigindo condições descabidas para sua ocorrência. Isso decorre de uma postura tendenciosa de se repelir sistematicamente fatos que não se enquadrem em uma visão preconcebida do mundo que os pseudocéticos dificilmente reconhecem.

Em resumo: a autoridade da ciência está fundamentada em sua própria capacidade de explicar os fenômenos que estuda e não na opinião dos cientistas. Não há como fundamentar a verdade em 'comitês' ou 'grupos de pesquisa', 'associações' ou 'academias'. Para verificar isso é só observar os inúmeros exemplos da História da Ciência, de como a opinião apressada ou sem reflexão de cientistas famosos prejudicaram o desenlvimento dessa própria Ciência. A Natureza guarda suas verdades que somente podem ser reveladas com muito trabalho, esforço, compreensão e proposição audaciosas de novas teorias.

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