No centenário de nascimento de Allan Kardec (2004), muitas obras foram publicadas em sua homenagem. Dentre elas, destaca-se a 'Introdução à Ciência Espírita' de Aécio Pereira Chagas. Com um estilo simples, o autor consegue abordar uma ampla gama de tópicos que fazem parte dos fundamentos da Doutrina Espírita, suas consequências morais e filosóficas. Um livro com 156 páginas - pouco se considerarmos a vastidão da temática espírita - é bem uma introdução ao assunto.
Para se ter uma ideia dos temas abordados por esta obra, basta que consideremos seu índice: 1 Introdução, 2 - Concepção espírita do ser humano, 3 - Fluidos - I (há dois capítulos separados para o tema 'fluidos'), 4 - Perispírito, 5 - Animismo, 6 - Mediunidade, 7 - Fluidos II, 8 - Efeitos Físicos, 9 - Fluidoterapia, 10 - Evolução e Tempo (que discorre sobre o importante princípio da reencarnação), 11 - Conclusão. Há ainda 2 apêndices: um sobre o conceito de religião e outro que trata de um resumo histórico do Espiritismo.
Antes do 1o Capítulo, no 'Prólogo', o autor, que é pesquisador acadêmico conceituado, discorre sobre a noção de 'ciência espírita'. Essa noção certamente tem consequências para a noção de universidade e centro de pesquisa acadêmico. De forma bem direta, o autor considera:
As universidades são importantes instituições de ensino e pesquisa, cujas atuais caracteristicas têm cerca de duzentos anos. Formaram-se após a Revolução Francesa (ou Burguesa) sobre as ruínas das universidades medievais. Estas eram centradas na teologia e as novas universidades centram-se nas ciências da matéria: física, química, biologia. Sua ideologia, ou seja, o conjunto de idéias que definem sua estrutura, objetivos, funcionamento etc, é praticamente positivista. Ela é, em sua essência, materialista. Creio que, dentro desta concepção de universidade, nela não cabe o espiritismo.
Essas considerações certamente têm consequências sobre a opinião particular dos que pensam ser possível acomodar a pesquisa espírita dentro dos modelos atuais de centro de pesquisa e universidades. Sendo, pois, a pesquisa acadêmica essencialmente centrada na busca e explicação de fenômenos materiais, é bastante lógico compreender porque existe grande resistência em meios acadêmicos a estudos de outras naturezas. O de uma determinada universidade estar vinculada a uma religião (como ocorre com as universidades católicas, por exemplo) em nada modifica esse quadro:
Existem universidades vinculadas a algumas religiões: universidades católicas, protestantes, judaicas, entre outras. Pergunto ao leitor, como são elas? No que diferem das universidades não confessionais?
Finalmente, ancorado nessa lógica o autor afirma: A ciência espírita foi feita e está sendo feita nos centros espíritas. O autor explica:
Acho que a pesquisa espírita não foi feita e não está sendo feita nos centros de metapsíquica ou de parapsicologia, que não satisfazem os requisitos da atividade científica, pois elas não contêm uma teoria. Muitos dos notáveis pesquisadores do passado, que trabalharam no estudo da fenomenologia mediúnica, não fizeram ciência espírita, ou melhor, não fizeram ciência nenhuma, pois não possuiam uma teoria. É interessante que alguns até se tornaram espíritas no fim de seus trabalhos.
Do ponto de vista das modernas teorias do conhecimento, a existência de uma teoria - que desenvolve e orienta a pesquisa - é um quesito fundamental para que haja verdadeira ciência. Em um ambiente cercado de ceticismo com relação ao objeto de estudo (que é o Espírito) como haverá de se desenvolver nosso conhecimento sobre o assunto? Este é um ponto fundamental que não pode ser desconsiderado.
Ao longo do livro, o autor discorre sobre vários conceitos espíritas - essencialmente fundamentados em 'O Livro dos Espíritos' e 'O Livro dos Médiuns' de A. Kardec por meio de muitas figuras (ou 'esquemas') que, embora não sofisticadas, conseguem explicar os conceitos e que dificilmente encontramos em outros obras. Além disso, o livro apresenta diversos 'exercícios' que orientam o leitor no estudo de obras complementares. Por exemplo, ao final do capítulo 6 (sobre mediunidade) são propostas várias questões. Destacamos uma delas: 6.3 - Um médium sonambúlico 'que vê' é vidente ou clarividente? Tal proposta faz de 'Introdução à Ciência Espírita' um livro diferente de muitos outros, um livro que tem uma proposta pedagógica.
Interessante e elucidativa é a proposta do autor de explicar os fenômenos físicos através de um capítulo dedicado. Por serem ocorrências que se distanciam dos fatos ordinários, esses são os mais considerados pelos adeptos da teoria do 'embuste'. Em particular, o autor esclarece os fatos da década de 60 em Uberaba, MG, em torno da mediunidade de efeitos físicos de Otília Diogo. Ele faz isso não como alguém que 'ouviu falar do assunto', mas como quem teve contato direto com testemunhas dos fatos:
Em uma dessas reuniões, esteve presente também uma equipe de repórteres da revista O Cruzeiro, na época, era o semanário de maior circulação no país. A primeira reportagem publicada pela revista foi fiel aos fatos observados. A segunda, uma semana depois, procurou apresentar tudo como se fosse uma fraude.
Mesmo assim, em determinados assuntos, sentimos que o autor foi algo resumido demais. Um exemplo, é o tema 'prece' do capítulo 9 'Fluidoterapia'. O assunto, em nossa opinião, é de certa importância e muito se beneficiaria de maior aprofundamento com o estilo didático do autor.
No último capítulo (11 - Conclusão), o autor trata da noção de prova científica de outras questões ligadas ao assunto e sua relação com os fatos espíritas. Basta considerarmos as perguntas feitas pelo autor no capítulo citado: 'Átomos e moléculas existem? Você já os viu ou os tocou? Como provar que eles existem?, para que tenhamos uma idéia de que a noção de prova na ciência e, principalmente, na ciência espírita, não tem o mesmo status das 'evidências' das ciências forenses ou criminais. O assunto requer muito estudo e uma visão dilatada que inclua a ideia de que muitas coisas no mundo existem apesar de não sensibilizam diretamente nossos sentidos ordinários.
'Introdução à Ciência Espírita' traduz em seu título, de uma maneira fiel, o que o autor desejou transmitir com ele: uma introdução didática a um tema que tem um grande futuro.
Detalhes bibliográficos:
Introdução à Ciência EspíritaAécio P. Chagas
156 páginas
Biblioteca de Ciência e Espiritismo
Editora Lachâtre (http://www.editora3deoutubro.com.br)
1a Edição (2004)
Boa dica de leitura, Ademir!
ResponderExcluirFiquei interessado neste capítulo sobre o caso das materializações de Uberaba. O professor Aécio chega a alguma conclusão sobre a possível existência de fraude por parte da médium?
Abraço!
Vital,
ResponderExcluirAcho que a opinião do prof. Chagas é a mesma exposta nesta entrevista:
http://espiritismocomentado.blogspot.com/2010/12/dr-cleomar-concede-entrevista-sobre.html
Devemos conceder maior validade à opinião de quem participou diretamente do ocorrido do que sobre o que se publicou a respeito dele.
Oi, Ademir!
ResponderExcluirCom certeza a opinião de quem participou tem o seu valor, embora haja outros elementos importantes para nossa análise.
Você sabia que o líder dos médicos nas experimentações, Waldo Vieira, tem a opinião de que a médium fraudava? E mesmo antes da sessão com os repórteres?
Abraço!
Ademir,
ResponderExcluirbela resenha. Quando comprei o livro Fundamentação da Ciência Espírita de Carlos F. Loeffler, pensei em comprar este, mas, a verba não deu. Agora, com um projeto em mãos, preciso deste livro, pois servirá como referência bibliográfica.
Obrigado por me apresentar melhor um livro que eu mal tinha folheado.
Um forte abraço!
Anderson
analisesespiritas.blogspot.com