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14 de fevereiro de 2021

Comentários sobre "Uranografia geral" de "A Gênese" de A. Kardec - II

Aparelho para produção de espectros (1878).



Comentários sobre "As leis e as forças"


8

O autor faz uso de uma bela comparação (que faz eco à alegoria da "caverna de Platão" [12]) para descrever o estado de conhecimento da ciência. Uma imagem em que seres oceânicos, deixando o fundo do mar, tomam conhecimento da realidade acima da superfície. O conhecimento que podemos fazer da Natureza que nos cerca está ainda no primeiro estágio, em que ainda apenas exploramos as cercanias das profundezas do oceano em que vivemos, muito longe da realidade acima da superfície. A comparação é clara e se aplica mesmo ao estágio de conhecimento em que chegamos. Por mais que tenhamos avançado, os passos são pequenos diante da grandiosidade do Universo. Kardec faz um comentário relevante sobre essa comparação em que ele a estende ao estado do conhecimento humano sobre a vida além da morte.

9

Explica-se aqui o escopo da discussão sobre "as leis e as forças". Como desencarnado, o autor está em uma posição privilegiada para estudar fenômenos inacessíveis para os encarnados. Mas, ao mesmo tempo, é um "ser relativamente ignorante em face da ciência real", o que reafirma seu despojamento e modéstia: ele não se apresenta como autoridade do assunto.

10 

Há um "fluido etéreo que enche o espaço e penetra os corpos". Hoje, algumas pessoas poderiam entender isso como ecos da "teoria do éter" de que falava os “eletricistas” do século XIX. Essa teoria soçobrou no início do século XX com a relatividade, que dispensou o "éter luminífero" para explicar o comportamento da luz e da radiação. Entretanto, cremos que se trata de uma interpretação precipitada e literal. O texto sequer toca em outros detalhes relevantes que conduziriam a essa conclusão. O éter luminífero postulado pela Física do século XIX era algo inerte, passivo, apenas imaginado como meio que facultava a propagação da radiação e nada mais.

Ao contrário, o autor descreve o fluido como uma substância em que:
...são inerentes as forças que presidiram às metamorfoses da matéria, as leis imutáveis e necessárias que regem o mundo.
Conceitos dominantes posteriormente, como a ideia de "campos", estavam em fase embrionária de desenvolvimento. O éter universal é aqui descrito como responsável pela "gravidade, coesão, afinidade, atração, magnetismo, eletricidade ativa", além de ser capaz de presidir "às metamorfoses da matéria". Isso seria, certamente, algo fantasioso para a época, mas hoje faz muito mais sentido. Para entender  isso, é preciso apreciar para onde conduziram as investigações da Física desde as descobertas da radioatividade no final do século XIX. 

Depois das investigações iniciais, ficou claro que os constituintes da matéria, os átomos, poderiam ser divididos em partículas menores. Essas, por sua vez, mostraram-se igualmente fluidas: por meio de colisões feitas em equipamentos especiais (aceleradores de partículas), uma vasta e complexa rede de “interações elementares” entre as partículas foi revelada. Algumas dessas interações ocorriam de forma espontânea: alguma coisa no “espaço vazio” provocava a decomposição “automática” das partículas que começaram a ser interpretadas como “estados ligados” de uma matéria ainda mais elementar [13]. 

Esse conhecimento finalmente transformou a ideia do antigo éter estático da propagação da luz na noção do "vácuo quântico" como uma substância que permeia todo o Universo, que não pode ser "esvaziado" de nenhum lugar e que tem papel fundamental na criação da matéria. O qualificativo "quântico" modifica completamente a noção de vazio como uma região do espaço onde toda a matéria tenha sido retirada e em que apenas propriedades geométricas podem ser associadas. Para a Física Quântica não é possível anular o conteúdo de energia de um sistema. Assim, o vácuo quântico é definido como o estado de menor energia possível para um "campo", o novo conceito que substituiu a noção de matéria clássica. Por isso, embora vazio de partículas "físicas", esse novo vácuo permite a criação incessante de partículas "reais " a partir de sua "energia de ponto zero".

O "efeito Casimir" é uma fraca força mecânica que aparece entre placas paralelas pela presença do vácuo quântico.

Além de suas ricas propriedades dinâmicas, como exemplo, citamos um dos efeitos notáveis do vácuo : "efeito Casimir" [14].  Esse efeito é uma força mecânica de atração que aparece quando placas metálicas são colocadas face a face. O vácuo quântico é responsável pelo aparecimento dessa força. Esse novo vazio é, na verdade, uma nova substância, que, se modificada ou excitada de forma particular, pode gerar a enorme variedade de partículas e campos que compõe a matéria tangível. Nosso despretensioso estudo conduz naturalmente assim para uma possível interpretação do "fluido cósmico" de que fala o autor de "Uranografia Geral" para essa nova noção de vácuo. Ainda assim, é preciso cautela porque é bem possível que não tenhamos conhecimento científico "final" sobre esse estado primitivo da matéria cósmica fundamental. 

11

Esta seção se apresenta como uma conclusão da exposição sobre "as leis e as forças": a síntese  se encontra na unidade observada das leis universais (algo que, modernamente, tem relação com a possibilidade de "unificação" das leis da Física) que são eternas. É um sonho antigo - ainda não plenamente realizado - descrever todas as leis e forças a partir de uma única lei. A causa dessa incapacidade em se chegar até a lei mais fundamental de todas é que "são restritas e limitadas as forças que a representam no campo das vossas observações". Há, portanto, outras manifestações de força ainda ocultas à observação da ciência da época e, provavelmente, mesmo da nossa. 

Além da dualidade "unidade-variedade", o texto também faz referência ao princípio de conservação: "Percorrendo os degraus da vida, desde o último dos seres até Deus, patenteia-se a grande lei de continuidade". A aplicação das leis universais "secundárias" (em oposição à lei primária "universal") é descrita como agindo:
...necessariamente em tudo e em toda parte, modificando suas ações pela simultaneidade ou pela sucessividade, predominando aqui, apagando-se ali, pujantes e ativas em certos pontos, latentes ou ocultas noutros, mas, afinal, preparando, dirigindo, conservando e destruindo os mundos em seus diversos períodos de vida, governando os maravilhosos trabalhos da Natureza, onde quer que eles se executem, assegurando para sempre o eterno esplendor da criação.
Então, a partir de modificações e gradações de aplicação dessa, surgem "leis secundárias" e outros princípios que atuam como causas para a enorme variedade de manifestações observadas no Universo. Essa conclusão corresponde à ideia moderna de que podemos "reduzir" as variedades de fenômenos observados a causas mais fundamentais. Porém, nossa incapacidade em reconstruir essa redução repousa em nossa limitação de observação. Como nossos sentidos são limitados, não temos acesso a todo conjunto de fenômenos que existem. Portanto, não temos informação suficiente para se remontar à causa mais fundamental da lei universal. 

Continua no próximo Post com "A criação primária".

A conclusão de nosso estudo será publicada no último post. 

Referências

[12] Wright, J. H. (1906). The origin of Plato's Cave. Harvard Studies in Classical Philology, 17, 131-142.
[13] Moreira, M. A. (2009). O modelo padrão da física de partículas. Revista Brasileira de Ensino de Física, 31(1), 1306-1.
[14] M. V. Cougo-Pinto, C. Farina e A. Tort (2000). O Efeito Casimir. Revista Brasileira de Ensino de Física, v. 22, n. 1.





15 de janeiro de 2021

Comentários sobre "Uranografia geral" de "A Gênese" de A. Kardec - I

Cometa de Donati sobre uma Paris sem luz elétrica como visto em 1858.

Obra completa contendo todos os comentários e a conclusão.

Fazemos aqui alguns comentários sobre o Capítulo VI “Uranografia Geral” de "A Gênese" de A. Kardec. Nosso objetivo é comentar o conteúdo desse capítulo no contexto de sua época, e indicar algumas mudanças que aconteceram nas concepções científicas de Astronomia e Cosmologia desde que o texto desse capítulo foi publicado.

Não nos move nenhum interesse em “atualizar” a Gênese, o que seria algo absurdo, mas apenas informar o leitor sobre o que teria eventualmente mudado em nossas concepções científicas desde o Século XIX. O uso da 5ª edição não afetará quaisquer conclusões a respeito do que apresentamos aqui sobre a Uranografia. Isso porque o referido capítulo tem como base em textos de C. Flammarion (como médium) que foram produzidos na Sociedade Espírita de Paris entre 1862 e 1863.

No que segue, pare evitar que o texto do post fique muito longo, comentamos as passagens identificando-as conforme o parágrafo em que aparecem na referência [4]. Quando necessário é feita citação expressa da passagem. É importante dizer que o relato da "Uranografia Geral" se refere a detalhes que pouco afetam o caráter da Revelação Espírita e sua importância. Entretanto, Kardec provavelmente resolveu incluir esse capítulo, pois ele seria uma "síntese" do que se conhecia na época no tema em consonância com a nova doutrina então nascente.


Comentários sobre “O Espaço e o tempo”

1

Atenção: chamamos de "seção" os itens numerados conforme a denominação de "parágrafos".

Essa seção se inicia com uma definição e alguns comentários sobre concepções antigas de espaço na forma da “extensão que separa dois corpos”. O autor do texto declara que o espaço é “infinito, pela razão de ser impossível imaginar-se lhe um limite qualquer”. O argumento é que é mais fácil imaginar um espaço em que se avança “eternamente” do que algo que chegue a um fim, o que seria a “fronteira do Universo” além da qual nada existiria. Essa concepção de espaço (que tem implicações para o tamanho do Universo) é, de fato, bem antiga e já aparecia aos antigos gregos. 

O que sabemos hoje: do ponto de vista científico apenas podemos afirmar que o Universo observável é limitado, mas não fazemos ideia se ele é finito ou não. Alguns teóricos, movidos pelas novas concepções de “curvatura do espaço” da Relatividade Geral acreditaram ser possível dizer que o Universo é “finito, mas ilimitado”. Com isso, um caminhante jamais atingiria limite algum ao percorrer uma superfície curva (fechada sobre si), que, apensar disso é finita. A realidade é que não sabemos a resposta para essa questão porque ela depende de forma crucial do avanço do conhecimento em Cosmologia. 

A partir do 4º parágrafo da seção, o autor usa de uma analogia para explicar o que ele entende por infinitude do espaço. Nessa figura, a “velocidade da centelha elétrica” é usada para descrever o movimento de um observador a “milhões de léguas por segundo”. Hoje sabemos que essa velocidade é da ordem de 100 mil quilômetros por segundo (ou 1/3 da velocidade da luz) [5]. A palavra “légua” refere-se a uma unidade antiga usada antes do sistema métrico e que correspondia a uma distância entre 5 ou 6 quilômetros (a légua imperial tem 4,82 quilômetros). Ou seja, nessa unidade, a velocidade do relâmpago seria algo como 16 mil léguas por segundo. 

A velocidade mais rápida que existe é a velocidade da luz no espaço livre: cerca de 300 mil quilômetros por segundo. Esse valor, ou algo próximo dele, já era conhecido desde, pelo menos, 1676 quando Olaf Römer [6] mediu o valor de 211 mil quilômetros por segundo. E, já em 1848, H. Fizeau [7] foi capaz de medir um valor mais próximo do atual. 

Chama a atenção este trecho:
Ora, há apenas poucos minutos que caminhamos e já centenas de milhões de milhões de léguas nos separam da Terra, bilhões de mundos nos passaram sob as vistas e, entretanto, escutai! Em realidade, não avançamos um só passo que seja no Universo.
Mesmo viajando a velocidade da luz, para “passar de vista” bilhões de mundos, seriam necessários centenas ou milhares de “anos-luz” e não “poucos minutos” (pelo menos para os encarnados...). Embora a imprecisão na descrição (?), o autor teve como objetivo passar a ideia de que, por mais que se caminhe em qualquer direção no Universo (isotropia) a partir de qualquer ponto (homogeneidade) muito pouco se avança diante de um universo infinito. Se o Universo for realmente infinito, essa conclusão é correta.

2

O autor do texto repete nessa seção por três vezes a definição: “o tempo é apenas uma medida relativa da sucessão de tempo das coisas transitórias”, o que o torna indistinguível da ideia de “duração”. Numa época em que espaço e tempo não poderiam ser vistos com aspectos de uma mesma realidade, o autor conclui acertadamente que, se o espaço é infinito, então o tempo também deve ter duração infinita. A infinitude do espaço exige a eternidade do tempo: “Imensidade sem limites e eternidade sem limites, tais as duas grandes propriedades da natureza universal”. 

Para a noção de eternidade o autor usa da mesma figura da infinitude do Universo:
O inconcebível amontoado de séculos que nos passaria sobre a cabeça seria como se não existisse: diante de nós estaria sempre toda a eternidade.
Junto a tal conclusão, a Seção 2 descreve uma imagem para a origem do tempo que nos lembra uma descrição bíblica:
Mas, silêncio! soa na sineta eterna a primeira hora de uma Terra insulada, o planeta se move no espaço e desde então há tarde e manhã. Para lá da Terra, a eternidade permanece impassível e imóvel, embora o tempo marche com relação a muitos outros mundos.
Com isso o autor quis dizer que a noção de tempo se prende a um local, o tempo terreno (como medida de sucessão das coisas) começou assim que a Terra se formou e terminará quando ela tiver o seu último dia. Isso não impede que existam “outros tempos” em outros mundos: “tantos mundos na vasta amplidão, quantos tempos diversos e incompatíveis”. Essa ideia diferia da concepção então vigente na época – a noção clássica de simultaneidade universal porque o tempo era considerado absoluto. Para ver isso, relembramos a definição de Newton [8]:
O tempo absoluto, verdadeiro e matemático, por si mesmo e da sua própria natureza, flui uniformemente sem relação com qualquer coisa externa e é também chamado de duração.
Hoje sabemos, com a teoria da Relatividade Restrita, que a noção de tempo “como sucessão das coisas” é, de fato, uma medida local e que não há compatibilidade entre as “medidas de tempo” entre referenciais diferentes que não estão “sincronizados”.  

Comentários sobre "A matéria"

3

Essa seção se inicia chamando a atenção para a diversidade de aparências da matéria. Disso concluímos que, “à primeira vista”, matéria é aquilo que sensibiliza diretamente aos sentidos humanos. Mas, logo no segundo parágrafo, o autor anuncia um “princípio absoluto” pelo qual:
Todas as substâncias, conhecidas e desconhecidas, por mais dessemelhantes que pareçam, quer do ponto de vista da constituição íntima, quer pelo prisma de suas ações recíprocas, são, de fato, apenas modos diversos sob que a matéria se apresenta; variedades em que ela se transforma sob a direção das forças inumeráveis que a governam. 
Para entender isso, é preciso rever a questão, p. ex., 30 de “O Livro dos Espíritos” [9] onde se lê que a matéria é formada “de um só elemento primitivo”. Esse é um conceito fundamental no Espiritismo de Kardec, que contrastava com o conhecimento da Química e da Física do Século XIX. Sua origem está na definição de matéria, que é dada na questão 22a em “O Livro dos Espíritos” e no desenvolvimento subsequente que podemos ler nas questões 32 e 33. 

4

O texto chama a atenção para as descobertas recentes da Química, de que se poderia reduzir a matéria a combinações de elementos. Na p. 110 de [4], há uma nota com a relação dos elementos conhecidos então. Na época em que “A Gênese” foi lançada, os estudos sobre pesos atômicos já indicavam a “natureza quantizada” das massas dos elementos químicos, o que era uma indicação de que eles seriam formados por unidades discretas. Mas, tão só pela manipulação química, nunca foi possível decompor ainda mais nenhum dos elementos. A intenção do autor foi indicar possíveis “reduções adicionais” uma vez que declara que:
(a ciência da época)...os considera primitivos e indecomponíveis e que nenhuma operação, até hoje, pode reduzi-los a frações relativamente mais simples do que eles próprios. 
O ponto fundamental, que deve prender a atenção o leitor, é que ainda não havia sido descoberta a radioatividade. Essa nova área da Física permitiria a “redução a frações mais simples” dos elementos químicos então conhecidos. A história da radioatividade [10] se iniciou com a descoberta por H. Becquerel em 1895 de raios específicos gerados por determinados materiais, a partir da busca por “novos raios” como o Raio-X feita por W. Röntgen em 1895. Destacam-se ainda as descobertas do elétron (por J. J. Thomson em 1897) e da fissão nuclear (por L. Meitner e O. R. Frisch em 1938). 

Imagem de um antigo laboratório de farmácia. Na época de "A Gênese", a química tinha reduzido a matéria a um conjunto de "elementos químicos" irredutiveis. Nossa situação presente é a mesma: a matéria foi reduzida a um conjunto de "partículas e subpartículas elementares" (quarks, elétrons etc) que também são "irredutíveis".

Hoje podemos afirmar que todos os elementos químicos são de certa forma redutíveis a combinações de: o hidrogênio ionizado H+ (também conhecido como próton, que é o elemento mais leve e abundante no Universo conhecido), o nêutron (sem carga e com massa equivalente ao próton), além do elétron, de carga negativa, necessário para dar estabilidade ao conjunto. Cada elemento químico seria então formado por combinações dessas "substâncias mais primitivas". 

Mas prótons, nêutrons e elétrons não podem ser decompostos? A ideia de continuar a decomposição teve que esperar inúmeros outros desenvolvimentos na física de partículas. Chegamos hoje, por exemplo, à “teoria dos quarks” (de Gell-Mann e Zweig em 1964 [11]) que seriam os blocos fundamentais dos “hádrons” (prótons e nêutrons). Entretanto, essas partículas não podem ser “isoladas” e seus efeitos são inferidos indiretamente. 

Portanto, voltamos à mesma situação da Química do século XIX que não conseguia decompor os elementos então conhecidos em unidades ainda menores...Em certo sentido, isso é um retorno à "teoria dos quatro elementos" de que fala o autor de "Uranografia Geral". Embora os conceitos sejam muito diferentes e não possam ser comparados, a ideia é reduzir todas as variedades possíveis de matéria à combinações de elementos primitivos, no caso presente, partículas e subpartículas atômicas.

5

O autor reafirma a crença de que a matéria é formada de apenas um elemento: a "matéria cósmica primitiva" que participa, por associação aos corpos, da constituição desses. Como toda matéria, para existir, precisa de certa energia para se formar, a afirmação pode hoje ser interpretada como uma referência à energia primordial de que o Universo foi dotado desde sua criação, sem a qual não seria possível ter todas as variedades de matéria. Para "formar o Universo" não seria suficiente dotá-lo de matéria apenas, mas também de energia. Por causa das transformações nucleares, as duas coisas - matéria e energia  - acabam se confundindo. 

Hoje sabemos que essa energia existe disseminada em todo o espaço e, de suas flutuações, a matéria é  "criada".

6

O autor espiritual confessa o estado de ignorância em que ele se encontra para emitir opiniões sobre determinadas questões (de caráter científico). Isso é uma demonstração de sua humildade, talvez a razão de Kardec ter incluído a  "Uranografia Geral" em "A Gênese". Ele reafirma então sua crença na "unicidade da matéria", no sentido que ele conferiu anteriormente.

7

Outros argumentos são fornecidos para a ideia da matéria cósmica primitiva: a de que as diversidades observadas da matéria tangível se devem a um "número ilimitado de forças" que atuam transformando seus constituintes, o que foi plenamente verificado pelo desenvolvimento científico. 

A referência aos "fluidos propriamente ditos" não diz respeito somente aos "fluidos magnéticos" ou de natureza "espiritual" que encontramos em "O Livro dos Espíritos" e que fundamentam o Espiritismo, mas também a outros, que, no século XIX eram responsáveis pela atuação de "forças a distância" (como o fluido elétrico e o magnético propriamente dito). 

Hoje sabemos que, o Universo, mesmo onde ele é considerado "vazio", está repleto de um tipo de matéria que nos escapa à apreensão direta. Das flutuações nesse vazio, a matéria pode nascer, o que não era conhecido na época em que "A Gênese" foi lançada.

Não sabemos, entretanto, se os constituintes das partículas elementares podem ser decompostos ainda mais. Recentemente, inúmeros outros problemas - como o da "matéria escura" [12] - apareceram e desafiam as teorias vigentes. Entretanto, todos esses fluidos, para existir, necessitam de energia, o que é uma razão para associar esse elemento primitivo à energia primordial. Como o espaço considerado "vazio" (o vácuo) está cheio de energia [13] de onde pode nascer a matéria, talvez possamos dizer que a afirmativa do autor se concretizou em certo sentido.

Continua no próximo Post com "As leis e as forças".

A conclusão de nosso estudo será publicada no último post. 

Referências

[4]  A. Kardec (1991). A Gênese, os Milagres e as Predições segundo o Espiritismo. 34ª Edição, Trad. G. Ribeiro a partir da 5ª Edição de 1868. FEB. 

[5]  Idone, V. P., Orville, R. E., Mach, D. M., & Rust, W. D. (1987). The propagation speed of a positive lightning return stroke. Geophysical research letters, 14(11), 1150-1153.

[6]  Van Helden, A. (1983). Roemer's speed of light. Journal for the History of Astronomy, 14(2), 137-141.

[7] Aparelho de Fizeau-Foucault - Wikipedia Fizeau–Foucault apparatus 

[8] I. Newton (1990). Principia: princípios matemáticos de filosofia natural - Vol.I (Trad. Trieste Ricci et al.), São Paulo: Nova Stella / EDUSP,pp. 6-7.

[9] A. Kardec (1991). “O Livro dos Espíritos”. 71ª Edição traduzida por Guillon Ribeiro. FEB.

[10] Xavier, A. M., De Lima, A. G., Vigna, C. R. M., Verbi, F. M., Bortoleto, G. G., Goraieb, K., ... & Bueno, M. I. M. S. (2007). Landmarks In The History Of Radioactivity And Current Tendencies [marcos Da História Da Radioatividade E Tendências Atuais]. Química Nova.

[11] Quark – Wikipedia https://pt.wikipedia.org/wiki/Quark

[12] Matéria escura - Wikipedia https://pt.wikipedia.org/wiki/Mat%C3%A9ria_escura

[13] Sidharth, B. G. (2005). The universe of fluctuations (pp. 73-115). Springer Netherlands.