3 de junho de 2012

O que se deve entender por 'fenômenos espirituais'.


Exemplo de 'música psicográfica' por Rosemary Brown atribuído ao Espírito de F. Chopin. Este é um exemplo genuíno de 'fenômeno espiritual' que demonstra a possibilidade de intercâmbio entre dois mundos.  

Em um post anterior (1), discutimos com algum detalhe as dificuldades que existem na compreensão de palavras relacionadas a Espírito, perispírito, aura e 'corpo bioplasmático'. Por razões didáticas, é interessante detalhar ainda mais as questões semânticas, a fim de que fique claro o que seria o objeto de estudo de interesse principal da ciência espírita.

Também vimos em (2), obstáculos comuns que se impõem à pesquisa da realidade da sobrevivência e da existência do Espírito. Dentre eles estão as tentativas de se 'detectar' ou 'medir' o Espírito. Em que pese a possibilidade de se encontrar rastros materiais para o terceiro corpo que forma a individualidade humana, há que se considerar que o Espírito, por definição, não pode ser observado diretamente pelos sentidos e, portanto, não está sujeito, para sua apreensão, às dificuldades inerentes do elemento material. Esse ponto crítico está na raiz do desenvolvimento das ciências psíquicas e no reconhecimento do Espírito como um princípio independente da matéria.

Por outro lado, como devemos interpretar isso diante de inúmeros 'efeitos físicos' que são apresentados como evidências de 'fenômenos espirituais'? Seria isso um erro? Aqui temos uma dificuldade inerentemente conceitual e ilustramos isso por meio de um exemplo.

Escrita direta e psicografia

As manifestações mediúnicas que se tornaram conhecidas desde o fenômeno de Hydesville em 1840 apresentaram-se sempre como processos de comunicação par excellence. Dentre elas, a escrita direta e a psicografia destacam-se como método através do qual mensagens de variado conteúdo são transmitidas por meio de médiuns sejam de efeitos físicos em um caso (escrita direta) ou de efeitos intelectuais (psicógrafos) em outro.  

Já apresentamos um exemplo de escrita direta feita por Tom Harrison (3) através da médium de materializações Minnie Harrison. Por meio desse fenômeno um lápis, caneta ou giz é movimentado no ar (seja no interior de uma caixa ou de forma livre) escrevendo mensagens. No início das manifestações, o fenômeno era obtido também quando o lápis era preso a uma cesta (4). A escrita direta também foi chamada de pneumatografia por A. Kardec (5)

Já o fenômeno de psicografia representa uma evolução do processo de comunicação (4) que se iniciou pela tiptologia simples ou a linguagem das pancadas ('raps'). Na psicografia, o médium escreve diretamente a mensagem sob influência de um Espírito. Embora as diferenças marcantes no processo de obtenção da mensagem, está claro que se trata de um processo de comunicação através do qual uma mensagem (então inexistente) é transmitida ao meio de sua recepção.

Exemplo

Diante da possibilidade de se obter mensagens tanto por meio da escrita direta como por meio da psicografia, podemos nos perguntar: qual a diferença do ponto de vista de quantidade de informação entre um processo e outro? Imaginemos dois médiuns, um de efeitos físicos e outro psicógrafo que transmitem sucessivamente frases em determinada ordem que, juntas formam um texto. O conteúdo 'espiritual' da mensagem estará no contexto da mensagem, nas suas várias características linguísticas: idioma em que é produzida (o que implica em uma sintaxe e numa semântica específica desse idioma), de sua pragmática (significados dependentes do contexto extralinguístico) e  intenção (muito mais que uma mensagem, mas a representação de um ato linguístico).






Porém, muitos se deixaram levar pelo caráter 'espetacular' (6) e desprezaram a espiritualidade também presente nas  manifestações puramente físicas (ver nossas conclusões abaixo). O que queremos dizer é que há que se separar os dois aspectos do fenômeno: i) o caráter espiritual ligado à proferência de um conteúdo semântico que revela sentimentos, intenções e informações de seu emissor (o Espírito) e ii) o fenômeno físico que ocorre por ação de forças que - embora 'invisíveis' tem origem física (e, portanto, na matéria). Podemos certamente afirmar a origem física dessas forças porque elas operam sobre a matéria (o lápis ou o giz).

A mensagem musical que apresentamos no início deste texto, Ballade in D-flat Major psicografada por Rosemary Brown (7) e atribuída a Frederic Chopin, também não teria seu conteúdo estético reduzido, a menos de  diferenças na performance do pianista - caso fosse executada diretamente por um piano que 'tocasse sozinho' (8) - ou por qualquer outro pianista minimamente capacitado. Seria um erro desprezar o conteúdo musical dessa peça para se interessar tão somente pelo aspecto físico do instrumento que toca aparentemente sozinho. Também aqui percebemos que podemos separar a aparência do fenômeno, o que impressiona a vista e os ouvidos do conteúdo musical e estético que tem sua origem na fonte de informação, o Espírito.

Conclusões

É fácil ver que a dificuldade em se separar esses dois aspectos é um dos obstáculos à pesquisa da sobrevivência e reconhecimento da realidade do Espírito. Os que confundiram efeitos físicos com manifestações espirituais falharam em perceber a diferença. Cientistas como W. Crookes e outros sábios da SPR de Londres (Society of Psychic Research), além de toda 'escola' da Metapsíquica, insistiram em  tratar eventos psíquicos como se fossem experimentos de bancada de Física ou Química (Fig. 1). A mesma tendência se viu nos desenvolvimentos da Parapsicologia. Com isso, o conteúdo de informação que esses fenômenos traziam foi desprezado em detrimento de aspectos puramente físicos. Por outro lado, a insistência de céticos em 'provar' que tais fenômenos são fraudulentos ou ilusórios é um ataque inapropriado ao aspecto espiritual deles, justamente porque desprezam o conteúdo de informação que transcende ao que é concebível nos círculos em que são produzidos.
Fig. 1 O médium D. D. Home e o experimento de Crookes do acordeon que toca sozinho, ref. (8). A supervalorização de aspectos físicos de fenômenos como esse tem sido feita pelas diversas 'ciências psíquicas' em detrimento do conteúdo de informação que traziam.
Assim, seriam os 'efeitos físicos' fenômenos espirituais? Se eles contribuem para transmitir uma mensagem e revelar uma intenção transcendente ao meio de sua produção, certamente o são. O lado espiritual está no caráter inteligente da mensagem que ele transmite, caráter que revela uma causa inteligente independente, como bem observou Kardec.

Notas e Referências

(1) Sobre fotos Kirlian e o corpo bioplasmático dos soviéticos.
(2) Doze obstáculos ao estudo científico da sobrevivência e à compreensão da realidade do Espírito.
(3) Vídeo III - 'Visitantes da outra margem' - Fenômenos de Materializações descritos por Tom Harrison (Inglaterra)
(4) A. Kardec.(1858) 'Instruções Práticas sobre as Manifestações Espíritas',  Capítulo 4, Diferentes modos de comunicação:Psicografia.
(5) A. Kardec. (1861) 'O Livro dos Médiums', 2a Parte, "Das manifetações espíritas, Capítulo 12: Da pneumatografia ou escrita direta". Referência: IPEAK. 146: "A pneumatografia é a escrita produzida diretamente pelo Espírito, sem intermediário algum; difere da psicografia, por ser esta a transmissão do pensamento do Espírito, mediante a escrita feita com a mão do médium".
(6) Não podemos deixar de concordar que, do ponto de vista físico, um lápis que escreve aparentemente 'sozinho' não deixa de ser um fenômeno não só anômalo, mas mais interessante que alguém que o segure e escreva a mensagem com a mão.
(8) Não são raras descrições desses casos na literatura psíquica. Um exemplo de teste conduzido por W. Crookes com o médium D. D. Home demonstrou a execução de uma música por um acordeon que tocava 'sozinho' (Fig. 1). Crookes não se interessou pelo tipo ou natureza da música produzida. Ver: Crookes W. (1874), Researches in the phenomena of spiritualism. London: Lowe and Brydone, 1953. Ver também: 
Estudando o Invisível (por Juliana M. Hidalgo Ferreira)



26 de maio de 2012

Deus e suas Causas II - Causas primárias e secundárias

Permite-se que satélites, planetas, sóis, em uma palavra, sistemas inteiros no Universo sejam governados por leis. Mas, com o menor dos insetos, pretende-se que ele tenha sido criado de uma vez só, por um ato especial único. Charles Darwin.

Nosso pequeno estudo aqui endereça especialmente a disputas entre 'Criacionistas' e 'Evolucionistas' em torno da origem das espécies e da própria vida. Esse suposto conflito Darwin X Deus é desprovido de argumentações justas, constituindo um conflito fabricado e oriundo de posturas cristãs fundamentalistas de ver o mundo e da maneira como a Ciência veio a se estabelecer, em antagonismo com noções arcaicas desse mesmo mundo. Hoje, os últimos resquícios da teologia dogmática se aquartelaram nas controvérsias em torno da evolução da vida, imaginando que, se os seres vivos, tal como se apresentam hoje, não puderam nascer de um ato único por um Criador feito à imagem e semelhança dos homens, ao menos poderia ter dado origem a eles em seus fundamentos de forma direta.

Vamos analisar algumas ideias que podem ajudar a formar uma imagem justa da questão e de como a ideia de Deus como 'causa primária' pode resolver satisfatoriamente a questão, eliminando esse suposto conflito com a autoridade científica.

Causas primárias e secundárias

1) A Ciência só existe através de uma 'teoria', do grego antigo teoria (θεωρία) que significa "visão, consideração", que é uma maneira de se generalizar ou sistematizar princípios de forma que seja possível explicar causas para determinados fenômenos. O problema com certas noções religiosas antigas é justamente o que se entende por 'explicação'. Para essas, Deus criou tudo: a água, a Terra, os animais, as plantas conforme está literalmente escrito em algum texto considerado sagrado. Muitos, sem nenhuma cerimônia, afirmam que isso é uma 'teoria' ou explicação que se contrapõe às teorias mais aceitas pela Ciência (ver artigos de Wernher Gitt);

2) Entretanto, a Ciência está em busca do que chamamos aqui de 'causas secundárias' para a maioria dos fenômenos. Essas são as causas fenomenologicamente ligadas à ocorrência de eventos naturais. Para entender essa noção consideremos a Fig. 1.

Fig. 01
Determinadas causas (1 e 2) resultam em um fenômeno (1). Esse fenômeno, por sua vez, serve de causa para outro fenômeno (2). Por sua vez, esse último é causa de outros dois fenômenos distintos,  3 e 4. Nesse exemplo, qual é a 'causa secundária' dos fenômenos 3 e 4? Embora os fenômenos 3 e 4 não possam ocorrer sem as Causas originais 1 e 2, de um ponto de vista 'suficiente' para explicá-los, apenas o fenômeno 2 - denominado Causa 3 - é necessário. A Causa 1 e Causa 2 (primárias) não são, assim, 'causas necessárias'  para explicar diretamente os fenômenos 3 e 4, embora sejam necessárias como 'causas que determinam as causas'. Assim, pode-se considerar uma boa explicação para os fenômenos 3 e 4 uma teoria que postule apenas o fenômeno 2 (causa 3) sem se referir às causas primárias 1 e 2. Uma nova teoria mais aprimorada deverá descobrir as causas 1 e 2. Há inúmeros exemplos - inclusive bem simples - na Natureza que demonstram a existência desse tipo de relações causais entre fenômenos. 

3) Exemplo da dinâmica entre causas e efeitos conforme a figura acima podem ser encontradas em diversas ciências, basta pensar em economia, biologia ou mesmo nos processos de patologia estudados pelas diversas ciências médicas.

4) Uma teoria não é mais 'verdadeira' por ser mais simples - de fato não há explicação mais simples do que admitir que Deus criou tudo - mas no sentido de se explicar ao máximo, de forma eficiente, o maior número de fenômenos possível; 

5) Para isso, podemos entender a questão da 'eficiência' pela possibilidade de 'falsificação' de uma determinada teoria. Façamos isso pela própria ideia dogmática que nos impõem: como é possível mostrar que a noção de Deus, como criador de todas as coisas, é falsa? Com isso queremos dizer, 'como é possível mostrar que essa ideia é falsa da mesma forma como poderíamos querer mostrar ser falso, por exemplo, que água e óleo se misturam?' Uma resposta simples é: realizando um experimento. Um experimento permite que se observem não só que determinado efeito resulta de uma causa, mas também as condições para que determinados efeitos ocorram, diante de determinadas causas (secundárias). 

6) A idéia de Deus como criador de tudo não pode ser refutada porque não é uma teoria, mas um princípio que pode ser admitido verdadeiro, mas que não se pode provar por estar fenomenologicamente distante de nossa capacidade de apreender o mundo (1). Faz parte dos atributos da divindade, da noção de Deus conforme entendida em "O Livro dos Espíritos" (2), que ele seja a causa primária de todas as coisas. Assim como é possível constatar que, na Natureza, muitos fenômenos ocorrem segundo leis específicas, não é razoável admitir que Ele, por mero capricho (que parece ser uma condição humana, sugerida por textos considerados sagrados por influência de ideias arcaicas), desrespeite essas leis e se ponha a realizar atos arbitrários? Tais atos implicam em aceitar muito facilmente que Deus atue sobre o mundo como uma causa secundária, coisa que ainda há que se demonstrar, ainda que isso seja totalmente desnecessário diante das Leis Universais. Sabemos que essas leis existem e que, na verdade, elas se constituem nos mecanismos de atuação da Divindade. Dessa forma, inexiste qualquer limitação a Deus, argumento que é frequentemente colocado, mas compreensão mais precisa da maneira como ele atua no mundo.   

7) Ainda que fosse possível admitir e mostrar na Natureza que Deus atua no mundo como causa secundária em algumas circunstâncias (temos que admitir que o movimento das menores partículas do Universo são regidos por leis bem determinadas e não demonstram nenhuma arbitrariedade de princípios), muito menos defensável é imaginar que toda a criação dos seres vivos (o que inclui não só animais e plantas desse nosso planeta, mas também de muitos outros que a ciência descobrirá eventualmente) pudesse ter ocorrido a partir de um ato arbitrário direto.

Fig. 2 Visão antiga do Universo: os povos antigos do oriente médio conceberam a Terra como circundada pelas 'águas  inferiores' (por causa da geografia circundada por águas onde habitavam). No alto estava o firmamento que suportava o Sol, a Lua e as estrelas a girar em torno da Terra. Acima do firmamento havia também águas (razão porque chovia), e, além das águas superiores, estava o 'Reino de Deus'. O 'submundo' - que iria dar origem ao conceito de 'inferno' - estava abaixo da Terra.

8) Olhando do ponto de vista histórico, é muito fácil ver que os povos antigos não distinguiam direito a diferença entre causas primárias e causas secundárias. Por isso, narrativas antigas sobre a criação, assim como sua cosmologia (Fig. 2), podem ser descartadas, não como uma 'alegoria da verdade', mas como uma visão particular de povos antigos em determinados momentos de sua história. Os que insistem em interpretar literalmente textos que propõem tais imagens, não se dão conta do ridículo a que se expõem, já que o processo de geração de conhecimento (ciência) continuará a desvendar a Natureza como algo muito diferente das concepções e ideias humanas, principalmente aquelas que hoje se nos figuram arcaicas e pueris.

9) Mas, da mesma forma como não é lógico descartar as causas secundárias, nos distanciamos da verdade ao querer descartar as causas primárias. De acordo com essa visão, um efeito é uma sucessão de várias causas, a se iniciar com as primárias e, depois, com as secundárias que são efeitos das primeiras. Desta forma, não se pode dizer que a teoria da evolução das espécies ou qualquer outra que se proponha para dar conta das causas secundárias levem à negação da ideia de Deus como causa primária. Simplesmente as duas causas existem, uma sendo consequência da outra, mas, para objetivo de explicação ou racionalização sobre eventos naturais, as causas secundárias são suficientes. Veja que é possível se conceber boas teorias a respeito do mundo tão só admitindo causas secundárias. Entretanto, isso não significa que, com a evolução do conhecimento e da integração de vários outros fenômenos, novas causas possam ser descobertas sustentando a existência de causas secundárias. É isso que ocorre com a ideia de Deus e seu papel na criação dos seres: não precisamos de Deus (como causa secundária) para explicar a evolução dos animais e, talvez, o surgimento da vida, mas isso não significa que Ele não exista (causa primária).

Conclusão

Do ponto de vista lógico, não há nenhum conflito entre a ideia de Deus (desde que admitido como causa primária) e a evolução das espécies, nem com quaisquer mecanismos que a Ciência venha postular para explicar e desenvolver nosso conhecimento a respeito dos seres vivos. O conflito é oriundo exclusivamente da maneira peculiar com que certas teologias dogmáticas veem o mundo. Ao se insistir nessa postura, o fosso entre o conhecimento científico e as religiões dogmáticas irá se tornar cada vez maior e irreversível. O resultado não pode ser senão um aprofundamento do materialismo e uma aumento na crença generalizada de que 'Deus está morto'. 

A Doutrina Espírita (tal como entendida pelos ensinos em 'O Livro dos Espíritos' de A. Kardec) endossa e apoia abertamente todas as descobertas e teorias científicas, entendendo-as como conhecimentos de causas suficientes (embora secundárias) para a correta explicação dos fenômenos naturais relativos à vida e a evolução dos seres. Forças adicionais, entretanto, podem ser necessárias para a compreensão desses fenômenos, principalmente no que diz respeito à criação da vida e ao aparecimento dos seres, forças que a Ciência revelará, pelos seus métodos, em tempo oportuno, através dos especialistas dessas ciências.

Notas e Referências

(1) É interessante considerar a resposta à questão do LE (2) #10:
10. Pode o homem compreender a natureza íntima de Deus?
"Não; falta-lhe para isso um sentido."
Por isso, a integração de Deus em explicações puramente racionalistas do mundo ainda é algo distante.  Para referências ao LE, ver IPEAKVer também: Deus e suas Causas I. (post anterior da série)

(2) A. Kardec (1857). 'O Livro dos Espíritos'. Ver questão #1. Obra fundamental de caráter profundamente racionalista que forma as bases da Doutrina Espírita. 

19 de maio de 2012

8º Encontro Nacional da LIHPE


Espiritismo na atualidade: das práticas cotidianas ao meio acadêmico”.
18 e 19 de agosto de 2012
São Paulo-SP 

O grande êxito alcançado com as edições do Encontro da Liga de Pesquisadores do Espiritismo* reforçou o propósito de seus integrantes e colaboradores em promover anualmente este evento científico.

O encontro tem se constituído em um espaço privilegiado para apresentação e discussão de conhecimentos na área e tem contado com a participação de pesquisadores de todas as regiões do país, interessados na divulgação e avaliação dos seus estudos científicos.

Instruções aos autores de trabalhos

Por meio de artigos completos e poster (apresentação oral).

A avaliação dos trabalhos será feita utilizando-se o sistema revisor por pares, por membros do Comitê Científico do encontro. Artigos aceitos podem ser eventualmente publicados no formato de livro.

Todos os trabalhos deverão ser submetidos, exclusivamente, por meio da página eletrônica: www.lihpe.net.

A data final para submissão é 15 de junho de 2012. A confirmação do recebimento e aprovação do artigo também será enviada eletronicamente ao email do remetente.


Informações:

Sobre a apresentação dos trabalhos: acesse www.lihpe.net ou envie uma mensagem para:


Sobre inscrições, hospedagem, alimentação: acesse www.ccdpe.org.br.

(*) Até a edição de 2009, o evento se denominava Encontro da Liga dos Historiadores e Pesquisadores Espíritas. A partir de 2010, o evento passou a se denominar Encontro da Liga de Pesquisadores do Espiritismo, mantendo-se a sigla Enlihpe.

12 de maio de 2012

Sobre fotos Kirlian e o corpo bioplasmático dos soviéticos.

Cortesia: www.o8ode.ru
Tenho sido questionado por diversos colegas sobre a relevância empírica das chamadas "fotos Kirlian" no campo da pesquisa psíquica. Descobre-se facilmente que são inúmeras as referências e citações espíritas a esse tipo de fotografia elétrica que fez muito sucesso na década de 80. Diz-se, por exemplo, que esse tipo de fotografia revela a contraparte não física dos seres vivos e, até mesmo, que seria uma maneira de se observar o 'perispírito' (vejam, por exemplo, J. Herculano Pires ou Hernani G. Andrade [1]).

Essas fotos são popularmente conhecidas como sendo da 'aura' (do latim "brisa, sopro, hálito, brilho") do objeto fotografado. É comum associar esse nome à 'manifestação energética' [2] de algo relacionado aos seres vivos. Já discutimos antes o conceito de energia e seu significado no contexto da Física. Isso demonstra a existência de uma ampla variedade de significados associados à palavra 'energia' na literatura espiritualista recente que não corresponde ao seu significado original. 

Entretanto, o conceito de 'aura' não existe nos princípios espíritas. Também podemos nos perguntar se a ligação de princípios tais como 'perispírito' a algo como 'aura' pode ser sustentado. Talvez seja possível, por algum processo de associação, vinculá-la a ideia de 'fluido' ou emanações de natureza mais sutil, inobserváveis ordinariamente. Tais emanações podem operar nos processos mediúnicos na forma de subprodutos de processos de metabolismo alterado. Mas, certamente, isso é uma associação indevida, já que o Espiritismo não trata diretamente de questões relacionadas a processo metabólicos,  doenças ou bem estar físico que são popularmente creditados aos chamados 'padrões de aura', supostamente observados por meio das fotos Kirlian. A base empírica do Espiritismo concentra-se na questão da mediunidade e reencarnação é ao redor desses conceitos que a maior parte das explicações e previsões são formuladas. 

Por isso,  fazemos aqui alguns comentários sobre esses conceitos e noções frequentemente mal compreendidas por conta, principalmente, de falhas na definição dos conceitos, falta de clareza na linguagem e dificuldades de compreensão dos diversos objetos de estudo envolvidos.

O que é uma foto Kirlian

O casal Valentina e Semyon Kirlian.
Foi Semyon D. Kirlian (1898-1978), um técnico de eletrônica na extinta União Soviética, quem teve, pela primeira vez em 1939, a ideia de fotografar o efeito corona  presente em corpos condutores sujeitos a elevadas tensões elétricas. Para entender o efeito corona, é preciso entender primeiro o que é uma 'descarga elétrica' [3]. 

Uma descarga elétrica é um caminho luminoso formado pela abertura, no meio transparente (no caso, o ar) de uma via de condução para íons (partículas carregadas). Tais íons são formados e conduzidos pelo campo elétrico presente no ar e imposto por algum gerador (pode ser por separação de cargas na atmosfera durante as tempestades). Esse campo elétrico provoca dissociação de átomos (ou seja, átomos do ar perdem elétrons) e formam, além dos elétrons arrancados, os íons responsáveis pelo transporte da corrente elétrica. O fenômeno é luminoso, pois ocorre recombinação dos íons, o que gera luz. Tanto que, da análise espectral da luz, é possível conhecer a constituição química do ar onde a descarga ocorre. O fenômeno é complexo, pois depende das propriedades do ar ou gás onde ocorre a descarga: assim, há forte dependência com a pressão do ar, por exemplo, além de outros fatores.

Fig. 1 Diagrama esquemático do arranjo para fotos Kirlian.

Campos elétricos podem existir não somente como tensões estáticas, mas também na forma alternada (chamado campos de corrente alternada), com uma frequência característica (período de oscilação). Portanto, é possível obter o efeito corona tanto com campos estáticos como alternados que se comportam de forma diferente (por conta da oscilação da corrente elétrica) dos campos estáticos. Kirlian trabalhava com geradores de alta tensão com frequências entre 75Khz e 200KHz (tais geradores podem, por exemplo, serem usados na transmissão de rádio). Ao se interpor um objeto 'vivo' entre uma placa condutora energizada e um filme fotográfico, os campos elétricos produzidos pelas descargas na 'interface' entre o objeto e a placa irão produzir o efeito corona que poderá ser registrado em filme. Acontece que os mesmos efeitos (principalmente de cores) também podem ser obtidos com objetos inanimados, contanto que eles sejam condutores. Também aqui há dependência com vários fatores: com a pressão exercida pelo objeto, com a constituição do gás (de que espécie química ele é feita), se for ar, se há presença de oxigênio ou não, se há presença de umidade etc.

A utilização de um vidro transparente condutor (em substituição à placa na Fig. 1) permite a filmagem do efeito corona produzido pela descarga (uma técnica já usada por Kirlian), dispensando o uso de filmes químicos. Esse arranjo é suficiente para demonstrar o desaparecimento das cores, indicando que a obtenção dessas, além da dependência com os gases e pressão exercida pelos dedos, está ligada à presença do filme. 

O 'corpo bioplasmático'

Foi Kirlian quem afirmou, pela primeira vez, que os padrões de forma e cor obtidos estavam relacionados com o estado do indivíduo que se submeteu à fotografia. Ele chamou esse de 'efeito psicogalvânico' [4]. Entretanto, ele também forneceu uma explicação bem física para o fenômeno: trata-se de uma manifestação da mudança de condutividade da pele com o estado psicológico.  Como dissemos, o resultado dos padrões depende de um conjunto grande de fatores (além do próprio ar e da presença do filme), em especial a condutividade elétrica da pele e, talvez, a emissão de gases na cercanias do corpo - fenômenos relacionados com o estados fisiológicos e psicológicos (todos conhecemos o umedecimento das mãos com o nervosismo).

Entretanto, as imagens foram frequentemente exploradas para revelar aspectos muito sutis da personalidade em um processo suspeito de extrapolação da ideia original de Kirlian. Aspectos comerciais motivaram também a exploração. Assim, estamos diante de um fenômeno que apresenta duas faces: o de realidade e o de extrapolação. É realidade que os padrões de efeito corona, em tese, podem estar fortemente correlacionados com o estado fisiológico dos indivíduos submetidos ao processo da fotografia Kirlian. Entretanto, o 'quão forte' essa correlação pode ser afirmada, ainda está sujeita a exploração teórica e experimental, constituindo um genuíno campo de pesquisa.


Mas é uma extrapolação incorreta assumir qualquer ligação do efeito Kirlian como uma evidência fotográfica de conceitos espíritas tais como o perispírito, mesmo na sua interpretação de 'corpo bioplasmático' [1]. O que seria esse corpo? O 'corpo bioplasmático' pode ser entendido no sentido original dado pelos então soviéticos: como conjunto de propriedades elétricas associadas ao organismo humano e que é alterado por estados psicológicos. Quanto ao perispírito, ele é o corpo que reveste o Espírito e é composto de um tipo de substância muito mais sutil, não evidenciada de forma simples por nenhum tipo de equipamento, por enquanto. São conceitos expressos em doutrinas e linguagens totalmente diferentes, o que torna difícil a absorção apropriada de um no outro.

A que se deve este estado de coisas?

Em um posto anterior, discutimos brevemente doze obstáculos ao estudo científico da sobrevivência e a existência do espírito. Esses obstáculos devem ser entendidos como problemas na compreensão do objeto de estudo dessa nova ciência, que já se batizou de 'ciência espírita'. O obstáculo que numeramos 5 e 6:
  • (5) Tentar "detectar" o espírito por meios diretos: há uma quantidade enorme de pessoas que acreditam que manifestações físicas (efeitos físicos) são 'manifestações espirituais'. Outros dizem que, se o Espírito existe, ele necessariamente deve deixar rastros mensuráveis. Aqui, a falha é na compreensão do objeto de estudo:  a matéria se deixa apreender por determinados tipos de sinais (cores, sons, formas, gostos etc). O Espírito tem pensamento, vontade e sentimentos, todos atributos inacessíveis do ponto de vista sensorial (ver novamente a referência [5]). Não é difícil perceber que a questão não pode também ser decidida apelando-se para uma amplificação no nível de acuidade ou 'precisão' do equipamento.  
  • (6) Tentar "mensurar" o espírito: uma variante do erro anterior;
A tentativa de se usar a fotografia Kirlian insere-se nesse problema. Torna-se um obstáculo, pois gera mais uma falsa impressão de que, caso não puder ser resolvido por esses meios de observação 'direta', então as propostas espíritas necessariamente encontrarão dificuldades em se afirmar como verdades. A insistência em querer manter o 'corpo bioplasmático' como um interpretação do perispírito, longe de ajudar, torna menos clara a proposta espírita, inserindo variáveis e dependências que o problema real (do espírito) não tem. Além disso, gera outra falsa impressão em céticos que compreendem bem o significado puramente físico desse 'corpo' proposto pelos então soviéticos.

Assim, os espíritas devem avaliar de forma cuidadosa - o que envolve o contexto dos princípios espíritas - propostas experimentais de se 'medir' coisas que, em tese, não estão sujeitas à apreensão direta, mesmo usando-se aparelhos. 

Referências e notas

[1] Para tanto, basta consultar: "Parapsicologia Hoje e Amanhã", Capítulo 9, de J. Herculano Pires (8a Edição, Edicel), onde encontramos a seguinte frase:

"É evidente que a designação de corpo bioplasmático, geralmente simplificada para corpo bioplástico, resultou precisamente das séries de experiências realizadas pelos cientistas para verificar as funções específicas do corpo energético. Essas funções fundamentais correspondem exatamente às do perispírito na teoria espírita."
[5] S. S. Chibeni (2010), A Pesquisa Científica do Espírito.