20 de junho de 2013

1/2 - Memória Genética e Reencarnação


Artigo publicado na Revista Espiritismo & Ciência nº. 90, São Paulo: Mythos Editora, nov/2011, páginas 34 a 42. Todas as referências estão no segundo post a ser publicado na sequência.

Acesse a parte 2/2 aqui.

1 - Introdução

É comum que, nos grandes debates entre ideias concorrentes, não se dê suficiente atenção para as consequências 'secundárias' (ou colaterais) da adoção de certas posturas, por causa do afã dos debatedores em se ver reconhecido o mais rapidamente possível como do lado da verdade. Tal é o caso das inúmeras explicações que encontramos do lado dos que criticam a reencarnação. O objetivo principal deste texto, entretanto, não é defender a ideia de reencarnação, mas chamar a atenção para a precariedade de um tipo de argumento que é lançado contra essa ideia.

Reencarnação, de forma muito simples, é entendida como o retorno da 'personalidade' à vida corporal. O Espírito é, na verdade, o ser verdadeiro que tem apenas uma vida: a espiritual. Entretanto, para que possa progredir, é preciso que ele se una à matéria, de onde extrai suas experiências e realiza seu aprendizado.  Assim, a reencarnação não é uma lei fundamental, mas uma consequência de um princípio anterior e mais fundamental que ela. Porém, antes de se aceitar a ideia de reencarnação, pressupõe-se um conjunto de outros princípios tais como: a sobrevivência de 'algo' no ser humano além da morte do corpo físico, que esse 'algo' carrega consigo informação a respeito de sua vida pregressa, mas não só isso, que carrega também toda sua personalidade e memórias de sua vida anterior. É natural que muitos rejeitem a reencarnação como princípio, por falta de uma visão inicial de todos esses conceitos auxiliares.

Para se gerar conhecimento científico de qualidade é preciso, antes de tudo, definir termos e esclarecer conceitos. Ora, nada é mais complexo e difícil de ser definido do que a personalidade humana, sua psicologia, seus traços morais, suas inclinações e sua memória. Ninguém conseguiu até hoje criar um 'medidor de personalidade' por uma razão simples: a personalidade humana é um objeto que não se presta a mensurações por equipamentos ou aparelhos, como é o caso da matéria. Portanto, na discussão e tratamento de fenômenos relacionado a memórias profundas e outras anomalias psicológicas, estamos diante de um assunto para o qual não é tão simples defender determinados pontos de vista a partir, única e exclusivamente, de evidências empíricas. Mesmo assim, muitos pretendam lançar mão de provas conclusivas que, segundo eles, resolveriam o debate.

Existem vários caminhos para se conhecer o princípio da reencarnação:
  1. Via 'filosófica': trata-se da via adotada pela Doutrina Espírita (Kardec, 1991). A reencarnação é aceita como um postulado através do qual é possível prever certas consequências para a vida humana e sua relação com noções de Justiça Divina. É bastante claro que essa via não será aquela trilhada por quem sequer aceita a existência de Deus. Entretanto, os maiores opositores deste caminho são, na sua maioria, religiosos que fundamentam suas crenças na autoridade, tanto da tradição quanto em interpretações particulares de livros considerados sagrados; 
  2. Via 'Empírica'. Diante da fragilidade e falta de concordância (universal) entre especialistas sobre definições do que seja a personalidade humana, trata-se da tentativa de se obter evidências comprobatórias para existência ou não de vidas anteriores. Por essa via se estabelece um debate, entre pesquisadores reencarnacionistas e seus opositores, em sua maior parte materialistas. O materialismo não prevê que algo deva sobreviver à morte do corpo físico. Portanto, as evidências clamadas para a reencarnação, segundo eles, devem ser explicadas a partir de uma variedade de hipóteses tais como: fraude, alucinação, coincidência, clarividência, criptomnésia ou 'memória genética' - termo que será objeto de análise neste texto.
  3. Crença pura: é a via religiosas, ancorada na tradição de textos antigos como os do Hinduísmo e no Budismo, com interpretações diversas daquela expressa pela Doutrina Espírita. 
No século 20, o maior expoente do caminho 2 descrito acima foi o Dr. Ian Stevenson. Ele reuniu uma quantidade fabulosa de casos considerados anomalias psicológicas, sobre pessoas que se lembram de vidas anteriores. Em seus quase meio século de pesquisas, conseguiu juntar 2.600 casos de crianças que se lembraram espontaneamente de outras vidas, tendo publicado várias obras, entre elas: 20 Casos sugestivos de Reencarnação (Stevenson, 2010a, 2010b) e os ainda sem tradução para o português (Stevenson,1997a, 1997b, 1997c; Andrade, 2002; Côrtes, 2002). Essas obras de Stevenson em 2 tomos tem 1200 e 1100 páginas, respectivamente, e representam compêndios com muitos dados sobre evidências de reencarnação.  Obviamente, muitos de seus críticos julgam-se no direito de criticar os trabalhos de Stevenson sem dar nenhuma atenção a essa montanha de dados, o que não é uma atitude razoável e, muito menos, científica. Também fazem parte do grupo 2 inúmeros terapeutas de vidas passadas (TVP). Para consultar diversos casos, ver "Casos" em "Web (blogs)" e o artigo de Paulo Neto Reencarnação e as pesquisas científicas. 

Frequentemente, opositores da reencarnação invocam argumentos de grupos de 'mesmo objetivo' para refutar a reencarnação. Assim, vamos encontrar grupos cristãos sectários que fazem uso de ideias materialistas para refutar a reencarnação, sem se dar conta da postura absurda que acabam envergando.

2 - Memória genética e Eugenia

Da mesma forma que existe claramente descendência de caracteres morfológicos e funcionais entre todas as espécies de seres vivos (incluindo plantas), a memória genética é concebida como uma suposta capacidade de se herdar não só memórias dos antepassados, mas também traços de suas personalidades. Afinal, quem herda a memória, também haveria de herdar o resto, segundo a visão puramente material do ser humano. Não há como separar as duas coisas, o ser humano é um todo integral.

Como dissemos, existe uma dificuldade intrínseca no objeto de estudo: a personalidade humana. Por si só, tal fato seria suficiente para eliminar qualquer tentativa de se explicar o comportamento humano com base em equivalentes de laboratório como ratos ou mesmo planárias (Di Bernardi, ver blog 'Portal do Infinito'). Mesmo assim, a tradição de pesquisa em laboratório e o positivismo costuma extrapolar comportamento de ratos e outros animais para os seres humanos. Mesmo diante de tais dificuldades, alguns biólogos e geneticistas acreditam (Dawkins, 1990; Wilson, 2000) que seria possível relacionar tais traços a informação gravada em nível atômico nos genes. Tal postura tem sua razão de ser na crença materialista para a qual o ser humano, assim como todos os animais, é apenas produto da organização genética. Os genes, segundo essa visão, carregariam toda informação necessária para se 'fazer' um ser humano, o que inclui eventuais 'memórias' passadas, que poderiam induzir determinados comportamentos. Obviamente, essa herança genética seria a responsável não só pela perpetuação de supostas memórias armazenadas nos genes como também traços da personalidade e explicaria as evidências encontradas a favor da reencarnação.

É preciso relembrar a história da ciência frequentemente esquecida, que nos instruí a respeito de debates semelhantes ocorridos no passado não muito distante. Na década de 1970 ficou famosa a teoria de E.  Wilson conhecida posteriormente como Darwinismo Social ou Sociobiologia. Ela pregava um determinismo estrito pelos genes e foi acusada de levar ao racismo científico. Não é difícil ver que, se o ser humano é produto de seus genes, então a competição entre populações de espécies leva inexoravelmente à perpetuação dos mais aptos em todos os sentidos. Assim, não só caracteres físicos e funcionais essenciais para a manutenção da vida são perpetuados, mas também caracteres não físicos tais como: traços da personalidade, caráter, inteligência e até cultura.

A Sociobiologia parte do princípio de que deveriam existir genes que programem os seres humanos para tais traços não físicos.  Assim, existiriam genes para a bondade ou maldade, para a perseverança ou falta de caráter, para o espírito ditatorial ou democrático, ou seja, para toda e qualquer tipo de personalidade, nas mais variadas gradações e disposições.  Esses genes seriam herdados dos antepassados e utilizariam o ser humano como um 'recipiente', fazendo valer seus interesses de perpetuação (Dawkins, 1990).

Se caracteres não físicos podem ser herdados, então existem, de fato, 'raças superiores e inferiores' por uma questão de definição: as 'superiores' seriam aquelas que teriam, em seu conteúdo genético, a maior carga de genes considerados superiores. Tais raças seriam as mais aptas por terem maior inteligência e cultura.  Sociobiologia, Darwinismo Social e memória genética são todos conceitos irmãos que levam diretamente à Eugenia e ao racismo científico (Blanc, 1994). Não são teses aceitas hoje no meio acadêmico, embora possam ser encontrados defensores isolados que tentam abrandar as críticas com um discurso de que a evolução 'é cega' para superioridade ou inferioridade entendida como conceitos com raízes culturais. Discutimos a situação atual na Seção 4.

Continua no próximo post.

12 de junho de 2013

Entrevista com Ricardo Monezi (Parte I)


Para acessar a segunda parte da entrevista, clique aqui.
Apresentamos a partir deste post, a primeira parte em áudio de uma entrevista com o Dr. Ricardo Monezi, conhecido pesquisador dos efeitos da imposição de mãos, em particular do uso do Reiki. 

Ricardo defendeu recentemente sua tese de doutorado "Efeitos Psicofisiológicos da Prática do Reiki em Idosos com Sintomas de Estresse: Estudo Placebo e Randomizado" pela Universidade Federal de São Paulo (Escola Paulista de Medicina). Para um resumo do trabalho ver (1).

O trabalho do Ricardo é um divisor de águas no Brasil quanto ao estudo de efeitos de técnicas de imposição e mãos por meio de métodos sistemáticos. Nesta primeira parte da entrevista, ele fala sobre o trabalho de sua tese de doutorado, sobre os seus principais resultados e dificuldades, o que pode ser importante para aqueles que quiserem iniciar nessa área de investigação.

Já tivemos a chance de discutir anteriormente as dificuldades envolvidas na investigação de efeitos do tipo "imposição de mãos" (ver post: "Algumas considerações sobre o passe"). Sem dúvida, elas são enormes e vão desde a própria definição de "doença" até os procedimentos experimentais que devem ser usados para sua investigação, que tem como escopo o elemento humano. Em que pese os estudos com animais, a validação dos efeitos de imposição de mãos em humanos é particularmente delicada, por causa de inúmeros efeitos adversos e particularidades do ambiente de investigação (necessidade de se aplicar repetidamente procedimentos que, muitas vezes, não são de fácil aceitação pelos humanos, dificuldades na análise dos dados, variações incontroláveis no ambiente etc).  

Junte a isso tudo o preconceito generalizado existente no ambiente acadêmico e temos literalmente uma das áreas de pesquisa mais difíceis que existem no campo das ciências médicas. Por isso, consideramos o trabalho do Ricardo Monezi um marco.

Primeira parte da entrevista (áudio).

Alguns trechos da entrevista
"Ambos os grupos tiveram alguns resultados positivos. Mas, a performance do Reiki foi superior, demonstrando que existe uma diferença entre o simples tocar e o tocar com a técnica".
 "Um resultado que chama muito a atenção é o resultado em relação à Espiritualidade, onde a gente viu o comportamento do grupo Reiki extremamente diverso do grupo placebo; mas me chamou bastante a atenção os resultados relativos à temperatura e a eletromiografia do músculo frontal".
 "A dificuldade principal é a dificuldade metodológica...A questão de se fazer um grupo placebo é que é uma coisa complicada....Como, por exemplo, fazer um grupo placebo para meditação? Simplesmente pedir para a pessoa esvaziar a mente, ou focar o seu pensamento em um determinado ponto? Isso é muito complicado...E na questão da imposição de mãos um grande desafio é ajustar a metodologia, o desafio é o controle das variáveis..."
"A questão de você entender que o modelo de cuidado não é unidimensional, ele é multidimensional..., você está lidando com um ser humano que tem dimensões e aspectos biológicos, psicológicos, sociais e espirituais, ele tem os seus próprios paradigmas, os seus dogmas, ele tem um vida e uma estória de vida".

Na segunda parte: recomendações de Ricardo Monezi para futuros investigadores do efeito da imposição de mãos, projetos futuros e espiritualidade na visão do entrevistado. Aguardem!

Nota

(1) Resumo: O estresse é como um desvio da homeostase, podendo contribuir para o desenvolvimento de uma série de sintomas que podem representar um prejuízo à saúde do idoso. Essa crescente parcela da população mundial tem procurado práticas integrativas e complementares como o Reiki, técnica de imposição de mãos, para o controle de doenças crônicas e melhora do bem estar. Com o objetivo de avaliar se a terapêutica Reiki poderia produzir alterações psicofisiológicas em idosos com sintomas de estresse, este estudo, que durou oito semanas, mensurou, em um grupo de voluntários que receberam Reiki e um grupo que recebeu um tratamento Placebo, respostas psicológicas como níveis de estresse, ansiedade, depressão, percepções de tensão, bem estar e qualidade de vida, além de respostas fisiológicas como temperatura periférica, tensão muscular e condutância elétrica da pele. O conjunto dos resultados obtidos sugere que a terapêutica Reiki produz alterações psicofisiológicas em idosos compatíveis com uma redução significativa de estresse. (tese de Doutorado "Efeitos Psicofisiológicos da Prática do Reiki em Idosos com Sintomas de Estresse: Estudo Placebo e Randomizado", UNIFESP, 2013 )

Ver também:

31 de maio de 2013

Os objetivos do Espiritismo


Espíritas, eis desses milagres de que vos deveis orgulhar, que todos podeis operar, e para os quais não necessitais de nenhuma faculdade excepcional, porque basta o desejo de fazer o bem. (A. Kardec, Revue Spirite, Novembro de 1863. Exemplos da ação moralizadora do Espiritismo)


O Espiritismo é uma doutrina de tríplice aspecto que trata de uma ampla gama de tópicos ou assuntos de interesse para a Humanidade. Mas, qual seria o seu principal objetivo?

A cultura humana foi capaz de criar um grande número de religiões e doutrinas para satisfazer a ânsia maior do indivíduo ou das coletividades de se ligar a Deus. Algumas dessas doutrinas pregam uma via de conhecimento, pela adoração simplesmente de variadas formas de representação da Grande Causa. 

Outras, insistem na necessidade de se adotar posturas e atos para garantir a necessária salvação até o último dos dias. 

Há culturas religiosas que pregam a busca por uma iluminação interior do indivíduo, ciosas de que apenas através de uma modificação radical na maneira de se enxergar o mundo a sua volta é que ele será capaz de atingir a Divindade. 

Todas essas maneiras de praticar a ligação com Deus refratam os raios que emanam da Grande Verdade que permanece inacessível aos olhos e entendimento humanos. Embora as manifestações diferentes e os inúmeros aspectos que tratam a Grande Realidade, todas se fundamentam na verdade.

Um aspecto, entretanto, permaneceu muitas vezes esquecido na grande viajem que os humanos têm empreendido na Terra há milhares de anos: o de que essa jornada traz em si a marca de uma grande aprendizagem para todos. É por isso que o Espiritismo insiste que somente teremos acesso a Grande Verdade, inacessível ainda, se a base de uma religião ou doutrina se fundamentar na educação integral de seus membros. Portanto, a proposta espírita também é uma proposta de educação pela qual o conhecimento pode ser usado para aprimorar moralmente o ser humano. E,  o indivíduo aprimorado dessa forma é um indivíduo mais próximo de Deus.

Ainda que esse objetivo maior tenha sido explicitado por Kardec de forma tão clara, por ser tão amplo, muitas vezes ocorrem confusões entre os espíritas por dificuldades de se entender seu maior objetivo: a educação moral da criatura humana. 

Assim, vemos os que imaginam que, pelo fato de discorrer sobre questões éticas e sociais, o Espiritismo deve servir como pano de fundo para elaboração de propostas utópicas no campo da política e da administração, seja pública ou privada. 

Outros vêem o Espiritismo elevado à categoria de ciência acadêmica, competindo de igual para igual com as várias disciplinas científicas que foram criadas para pesquisa de fenômenos da Natureza. 

Há grupos consideráveis que gostariam que o Espiritismo fosse
tratado como novo recurso terapêutico para o corpo, como se o Espiritismo fosse uma nova modalidade de tratamento médico.

Há quem pense que o Espiritismo deveria contribuir para grandes revelações na área da cultura, da história e mesmo das ciências em geral, esquecendo-se a grande distância e as diferenças de densidade que nos separam do Mundo Maior que nos assiste de inúmeras outras formas. 

O conhecimento das realidades do Espírito nos é dado na medida certa em que esse conhecimento nos torna melhores e não com um fim em si mesmo...

O conhecimento como forma de ascensão moral é utilizado pelo Espiritismo no seu processo de educação, a base que haverá de elevar aqueles que melhor souberem compreendê-lo. Mas, há os que enxergam diferente. Em vão buscarão acomodar aquilo que o Espiritismo ensina aos seus próprios pontos de vista, pois as forças do tempo se encarregaram de estabelecer aquilo que realmente importa para a alma humana.

A mensagem de esperança e da Vida Futura é tema de interesse de todos. A verdadeira educação que liberta e traz felicidade também é. Esses são, pois, os maiores objetivos da Doutrina Espírita.



22 de maio de 2013

Uma capacidade especial: o caso de Nandana Unnikrishnan

"O perispírito irradia ao redor do corpo, formando uma espécie de atmosfera impregnada das qualidades boas ou más do Espírito encarnado. Duas pessoas que se encontram, experi­mentam, pelo contato desses fluidos, a impressão sensitiva, impressão que pode ser agradável ou desagradável; os fluidos tendem a confundir-se ou a repelir-se, segundo sua natureza semelhante ou dessemelhante. É assim que se pode explicar o fenômeno da transmissão de pensamento. Pelo contato desses fluidos, duas almas, de algum modo, lêem uma na outra; elas se adivinham e compreendem, sem se falarem." (A. Kardec, O que é o Espiritismo? Capitulo III, O homem durante a vida terrena, questão #125 )

Frequentemente, é através da oclusão ou limitação severa de certas faculdades físicas que outras, ainda desconhecidas, acabam se manifestando. O caso de Nandana Unnikrishnan, uma menina indiana chama bastante a atenção. Diagnosticada inicialmente com uma desordem de espectro autista e com severo déficit de atenção, sua mãe Sandhya logo percebeu que havia uma correlação forte entre o que ela pensava e o comportamento de sua filha (1):
Não sabemos como isso pode acontecer, mas, ela pode sentir minhas emoções e ler meus pensamentos. 
Eu me sentia estranha quando ela costumava se aproximar de mim e dizer o nome de um alimento que eu estava ainda pensando em preparar para ela. Da mesma forma, se meu marido e eu estivéssemos decidindo levá-la em algum lugar, ela aparecia e, sem perguntarmos nada, começava a reagir a esse planejamento. 
Inicialmente, foi difícil para mim ensiná-la mesmo as concepções mais simples de objetos. Tinha realmente que me esforçar para fazê-la entender que uma xícara era uma xícara. Levei um mês para conseguir que ela entendesse isso. Mas, recentemente, o aprendizado tem sido mais fácil. Ela é boa em matemática. Mas, algumas vezes, acho que, quando ela se sai bem nos deveres escolares é porque estou pensando neles, o que a leva a terminá-los bem rapidinho. 
Durante seus exames de rotina, o diagnóstico confirma que ela tem progredido muito pouco na atenção, o que contrasta com as questões que ela consegue responder quando Sandhya está por perto. Por isso, sua mãe desconfia que os acertos que ela faz se devem a sua influência mental (1):
O autismo de Nandana e uma severa limitação
de atenção não impedem que ela consiga 
ler os pensamentos de sua mãe.
Agora, eu suspeito fortemente que é por causa da minha presença que ela consegue se sair bem em testes nos últimos dois ou três anos. Ela então costuma responder a questões de forma bem inteligente, o que não é esperado para uma criança da idade dela e com a disfunção que ela carrega. Acho que isso é porque as respostas estão inicialmente na minha mente que ela consegue fazer isso.
Essa relação de transmissão de pensamentos e sentimentos só acontece entre Nananda e sua mãe Sandhya. Ou seja, a faculdade da menina está ligada a uma sintonia que existe entre ela e sua mãe. Essa faculdade foi demonstrada de uma forma extraordinária conforme narrado abaixo (1):
Um time de especialistas da Clínia de Assistência à Criança em Sharjah no mês passado testemunhou a capacidade de Nandana, de 9 anos de idade, de ler a mente de sua mãe. 
O psiquiatra no Centro de Especialidade Médica Sunny in Sharjah, Dr. Jeena Fiji, que é chefe do grupo, certificou que "Nandana tem a capacidade de ler os pensamentos da mãe, assim como seus desejos e intenções".  
Em uma carta em que certifica isso, uma cópia da qual está disponível no Khaleej Times, o Dr. Fiji narra o caso de Nandana como segue:
"Nandana foi avaliada na clínica em 2008 como uma desordem de espectro autista. Ela está sob terapia contínua de auxílio à fala e mostrou um bom desenvolvimento nessa parte. Mas, Nandana ainda tem dificuldades com palavras e em manter a atenção. A mãe de Nandana notou que ela tem capacidade de ler a sua mente. Essa capacidade da criança foi demonstrada no dia 21 de Fevereiro último. Um time composto de um especialista em psiquiatria, um assistente social, um pedagogo e pessoal da enfermagem testemunhou essa demonstração.  
Nandana veio com sua mãe, Sandhya Unnikrishnam. Um poema de nível 2 foi escrito e dado à Sandhya. Depois que sua mãe leu mentalmente o poema, foi pedido a Nandana digitar no teclado que foi a ela dado. 
Nandana pode digitar o poema sem dificuldade. Um número de seis dígitos foi escrito e dado a Sandhya, o qual pode ser digitado por Nandana depois que sua mãe o leu mentalmente.  
 Um número de um dígito foi dado à Sandhya, número que ela olhou brevemente antes de deixar a sala. Foi pedido, então, à Nandana que ela digitasse o número, o que ela fez, indicando sua capacidade de ler a mente da mãe, ainda que essa não estivesse fisicamente ao seu lado. O Dr. Fiji afirmou isso em sua carta, desejando o melhor possível a Nandana." 
Um Espírito cujas faculdades naturais estão severamente restritas no corpo.

O teste da Clínica Sunny: Nandana foi capaz de digitar um
poema composto no momento que sua mãe leu mentalmente.
As faculdades dos Espíritos são, em geral, superiores em grau e abrangência que seus equivalentes físicos. Isso acontece porque o corpo espiritual é feito de substância diferente do corpo físico, seus "sensores" provavelmente empregam princípios de acesso à realidade diferente daqueles do corpo físico. Na condição de encarnado, o Espírito sofre o aprisionamento e cerceamento dessas capacidades, ainda em desenvolvimento, mas que, de certa, ficam latentes. 

As doenças mentais representam limitações ainda mais severas, porque afetam as estruturas do cérebro físico responsáveis pela cognição. Incapaz de se expressar corretamente, as faculdades cognitivas permanecem "emudecidas", como se não existissem. A realidade é que, como dissemos, elas se encontram em estado latente, aguardando a libertação do Espírito (o que somente ocorre, definitivamente, com a morte ou desencarnação, ou em grau menos extensivo, em processos de desdobramento). 

Entretanto, é plenamente possível que parte dessas estruturas se mostrem desenvolvidas na direção de ressaltarem outras faculdades já existentes no Espírito, que, não obstante as limitações das outras capacidades mais triviais, acabam  se manifestando. Esse parece ser o caso de Nandana, que não parece ser único (2).

O caso de Nandana é bastante significativo, pois sanciona o que os Espíritos, de forma clara, explicaram a Kardec (3). Se a faculdade de "telepatia" ou "transmissão de pensamento" de Nandana fosse algo que dependesse exclusivamente dela, talvez ela também pudesse ler pensamentos de qualquer pessoa, inclusive do pai. Mas, isso não ocorre. Ela está "sintonizada" às influências de sua mãe por afinidade psíquica.

Referências e notas

(1) S. Saseendran (Março/2013). Miracle Girl: Nandana has access to mother’s memory.  Khaleej Times. Acesso em Maio de 2013.
(2) No final do artigo (1), há o comentário do editor:
Savvy Kisani, mãe de um adolescente autista que também se tornou educadora especial assim como a mãe de Nandana, acredita que algumas crianças autistas, as vezes, parecem demonstrar percepções extra sensoriais: "Embora eles não possam falar, podem perceber que algo está para acontecer. Meu filho Krishna se comportou de forma estranha quando meu pai estava para falecer. Ele começou a gritar alto e correu para o quarto onde seu avô estava, começando a bater a cabeça na porta. Minha mãe sugeriu que isso indicasse que o momento do falecimento estava próximo. E estava. Assim, eu acredito que eles podem prever coisas. Mas, nada sei sobre a capacidade telepática deles, de ler a mente das pessoas como acontece no caso de Nandana."
(3) Além da questão de "O que é o Espiritismo?" que é citada na introdução deste post, o leitor deve também consultar as questões #285, #420, #421, # de "O Livro dos Espíritos" e o artigo "Meu Fantástico", da Revista Espírita de Outubro de 1864.