Para facilitar a discussão que segue, traduzimos o resumo do artigo de Sudduth:
De acordo com a interpretação da sobrevivência da mediunidade, a existência de individualidades desencarnadas é a melhor explicação para os dados associados a mediunidade física e intelectual. Outros - defensores do que é frequentemente chamado de 'hipótese super-psi' - garantem que os dados da mediunidade podem ser explicados, ao menos igualmente bem, em termos de uma agente vivo (ESP ou psicocinese). Muitos defensores da interpretação da sobrevivência tentam esvaziar as virtudes explicativas da hipótese super-psi argumentando que ela é infalsificável e não tem apoio independente nas evidências. Minha linha argumentativa central neste artigo é que as críticas dos adeptos da sobrevivência à hipótese super-psi são auto-destrutivas à defesa da sobrevivência a partir da mediunidade. Para mostrar isso, primeiro argumento em detalhes que a interpretação da sobrevivência da mediunidade está comprometida de tal forma com psi que ela é indistinguível da hipótese super-psi. A partir dessa perspectiva, pode-se mostrar que qualquer tentativa de se negar virtudes explicativas à hipótese super-psi com base em certo grau de psi que isso exige também acaba por enfraquecer o próprio argumento da sobrevivência.
O conceito de psi
Para compreender a linha argumentativa de Sudduth é importante também conhecer o significado de 'psi' como conceito frequentemente usado na parapsicologia. 'Psi' seria um tipo de habilidade da mente humana que daria a ela capacidade para produzir diversos fenômenos que, na linguagem típica da parapsicológica, se confundem com os fenômenos mediúnicos - tanto de natura 'física' como 'intelectual' (ou mental). Psi seria, de fato, a fonte desses fenômenos (agentes vivos), enquanto que a informação deles produzida teria como origem a mente de outras pessoas.
Esvaziada de uma teoria (4), a parapsicologia tenta construir uma linha de explicação para os fenômenos psíquicos que, em sua maior parte, tem horror à qualquer 'hipótese' externa considerada 'anti-científica' (5). Por causa disso, a parapsicologia se esforçou em construir uma linha meramente empírica de argumentação, onde alguns fenômenos são elevados à categoria de princípios fundamentais. Haveria assim 'fenômenos básicos' (6) como blocos unitários em termos dos quais a explicação de outros fenômenos anômalos seria feita. A consequência disso é que as explicações parapsicológicas soam como tautologias para muitos fenômenos (ver tautologia).
É preciso compreender que as coisas ficaram assim por causa da própria dificuldade em se justificar psi (7) com base na física conhecida de um lado, o horror a hipóteses adicionais e, de outro, ao ambiente francamente hostil aos fenômenos psíquicos do mainstream acadêmico.
Diferenças entre a interpretação da sobrevivência e a teoria espírita para a mediunidade.
De fato, a interpretação da sobrevivência a que se refere Sudduth apenas diz que a fonte da informação oriunda dos fenômenos psíquicos está na existência dos Espíritos. Não se detalha o mecanismo através do qual isso seria possível. Por isso, a linha argumentativa do autor de (2) é válida:
1. A hipótese super-psi faz uso de psi em certo grau;
2. A interpretação da sobrevivência usa psi em um grau indistinguível de super-psi;
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2. A interpretação da sobrevivência usa psi em um grau indistinguível de super-psi;
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C: Portanto, todas as críticas dirigidas a super-psi também valem para a sobrevivência.
Porém, é importante enfatizar que existem grandes diferenças entre a 'interpretação da sobrevivência' a que se refere Sudduth em seu artigo e a teoria espírita elaborada por A. Kardec (8) para a mediunidade. No caso de Kardec, diversos elementos explicativos (existência de fluidos imponderáveis, perispírito, diferenças de densidade entre corpos etc) existem e interagem para explicar uma variedade de fenômenos psíquicos de uma forma bem mais complexa do que a simples assunção da existência dos Espíritos na interpretação da sobrevivência em questão. Por causa disso, a crítica que Sudduth tece à falta de imunidade da tese da sobrevivência em relação à hipótese de 'super-psi' não se aplica à teoria de Kardec como é fácil perceber.
Obviamente, o debate entre a 'sobrevivência' e 'super-psi' passa longe de Kardec, já que grande parte dos pesquisadores modernos dos fenômenos psíquicos (e que são favoráveis à sobrevivência) desconhecem a teoria de Kardec em detalhes.
Um problema ainda maior para super-psi
Os leitores não terão dificuldade em perceber a limitação do argumento de Sudduth a partir do próprio título de seu artigo: 'Super-psi e a interpretação da sobrevivência para a mediunidade' (grifo nosso). Em suma, seu argumento só se aplica à mediunidade. Entretanto, existem inúmeras ocorrências que são fenomenologicamente diferentes da mediunidade:
- Lembranças e fenômenos associados a vidas anteriores em crianças (9);
- Lembranças de vidas anteriores em adultos submetidos à regressão de memória;
- Experiências de quase morte, EQM (10);
- Visões no leito de morte (11);
Aplicar a ideia de super-psi nesses casos seria proibitivamente desonesto como é fácil perceber. Seria esticar em demasiado uma explicação customizada para um tipo de fenômeno. Inúmeros detalhes concorrem para demonstrar que a ideia da sobrevivência se sustenta de forma independente:
- Por exemplo, no caso das lembranças de vidas anteriores em crianças, o que 'sobreviveu' de uma existência para outra? Como explicar marcas de nascença associada a vidas anteriores usando super-psi?
- No caso de experiências de quase morte, o que continua a existir enquanto o cérebro está sem oxigênio?
- Porque a imensa maioria das lembranças em EQM diz respeito ao encontro com pessoas já falecidas? Nas visões de leito de morte, porque são reportadas imagens de pessoas falecidas?
O leitor interessado identificará facilmente outros detalhes na fenomenologia psíquica 'não mediúnica', que permite facilmente perceber a simplicidade e amplitude explicativa da tese da sobrevivência. Dessa forma, invocando-se a 'Navalha de Occam' (simplicidade), a tese da sobrevivência apresenta-se como a teoria que deve ser escolhida.
Esse é um assunto interessante que merece ser melhor explorado futuramente, principalmente no que diz respeito às consequências da tese da sobrevivência com base em evidências não mediúnicas.
Esse é um assunto interessante que merece ser melhor explorado futuramente, principalmente no que diz respeito às consequências da tese da sobrevivência com base em evidências não mediúnicas.
Notas e Referências
(1) Ver post "Geografia(s) do mundo espiritual" de Chrystian Lavarini.
(2) M. Sudduth (2009) "Super-Psi and the Survivalist Interpretation of Mediumship", Journal of Scientifi c Exploration, Vol. 23, No. 2, pp. 167–193.
(3) Ver tradução comentada do texto de M. Prescott "As duas opções".
(4) Sobre isso ver a tradução do artigo de P. Churchland, "Como a Parapsicologia poderia se tornar uma ciência" que foi publicada em uma série de quatro posts.
(5) A existência dos Espíritos é uma dessas hipóteses.
(6) ESP ou a chamada 'percepção extra sensorial' e psicocinese são esses blocos constituintes.
(7) Ou seja, como seria possível explicar 'psi'? A interação entre mentes (no caso, por exemplo, da telepatia) não pode ser explicada com base em nenhum elemento mais fundamental. Tentativas foram feitas, porém, o fenômeno não se deixa controlar a ponto de se poder testar facilmente.
(8) Uma boa parte dessa teoria, no que diz respeito à mediunidade, pode ser encontrada em "O Livro dos Médiuns".
(9) J. B. Tucker. (2008). Life Before Life: Children's Memories of Previous Lives. St. Martin's Griffin, primeira edição.
(10) Ver post: Reflexões sobre o contexto de experiências de quase-morte. Artigo de Michael Nahm (2011).
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