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18 de julho de 2013

Deus, o Universo e o Princípio Antrópico.


"Atribuir a formação primária das coisas às propriedades íntimas da matéria seria tomar o efeito pela causa, porquanto essas propriedades são, também elas, um efeito que há de ter uma causa." (Comentário de A. Kardec à questão #7 de "O Livro dos Espíritos")

Anteriormente (1), vimos que a teoria do "Big Bang" não é uma descrição completa da origem do universo, embora ela seja a teoria mais aceita. Isso porque, além de explicar o aparecimento e evolução da matéria em nosso universo, ela teria que explicar como as leis que observamos nele apareceram. Isso seria resolvido se dispuséssemos de uma explicação auto consistente do Universo, onde não só a matéria, mas também suas leis aparecessem naturalmente.

É uma princípio frequentemente adotado em teorias e hipóteses científicas de que a Natureza não exibe nenhum tendenciosismo especial em relação as suas causas ou na produção de seus efeitos. Leis cegas governam o universo onde vivemos, sem nenhum tipo de preferência, qualquer que ela seja. Sendo um princípio, ele não pode ser provado, mas é amplamente aceito como orientador para o desenvolvimento de muitas teorias científicas. Sua validade não é contestada, porque os fenômenos onde ele se aplica são observados como obedecendo as suas consequências: a da não existência de causas adicionais  responsáveis exatamente pelas propriedades observadas nesses fenômenos.

Curiosamente, esse princípio está em contradição com algumas observações de natureza cosmológica, ou, mais particularmente quanto à liberdade que o universo primordial teria em decidir quais leis físicas que iriam nele imperar. Se o universo se deve a nenhuma causa, não há razão para acreditar que suas leis teriam que  ser "específicas" ou "especiais". Acontece que, pelo menos no Universo em que vivemos, muitas leis são exatamente o oposto disso. 

Elas são "leis especiais". O que sabemos dessas leis é suficiente para afirmarmos que elas são o que são justamente para favorecer a química dos átomos de carbono e, como corolário, o aparecimento da vida na Terra que, por enquanto, é a única vida reconhecida ordinariamente.

O princípio Antrópico

Essa constatação é frequentemente conhecida como "princípio antrópico" e permanece como uma das poucas "pontes" entre a religião e a ciência. Segundo J. M. Fink (2), foi Alfred Russel Wallace, um dos pais do evolucionismo e grande espiritualista, quem primeiro observou que o grau de complexidade observado no Universo não era mera coincidência, mas algo necessário para que Humanidade aparecesse e evoluísse. Na sua forma fraca ele é enunciado (2) como:
Os valores observados em todas as quantidades físicas e cosmológicas não são quaisquer, mas assumem valores submetidos à exigência de que existam lugares no universo onde vida baseada no carbono possa evoluir e que o universo seja antigo o suficiente para que essa vida possa existir.
Como bem observado por Fink em (2), esse enunciado não exige que todas as leis do universo tenham sido ajustada para que a vida aparecesse, mas que algumas delas, necessariamente, foram. Isso porque não dispomos de uma descrição totalmente exaustivas das leis (muitas ainda devem ser descobertas) e outras não guardam relação com a vida. Entretanto, como há uma conexão entre o "micro" e o "macro", o principio antrópico tem um peso grande na escolha das principais leis físicas que deveriam vingar no universo.

Uma imagem do céu profundo tirado pelo telescópio Hubble. O Universo é exatamente o que ele é (nem velho demais, nem novo demais) para que a vida nele possa existir.
O princípio antrópico também tem uma forma forte, pela qual se afirma que necessariamente as leis foram "escolhidas" de forma que vida biológica surgisse no universo. Isso torna a existência de Deus praticamente uma necessidade, o que é suficiente para irritar muitos cientistas, levando-os a negar a validade do princípio antrópico.

O problema é que as evidências acumuladas apontam para sua validação. E quais são elas? Em 1954, com base no Princípio Antrópico, Fred Hoyle foi capaz de prever um nível de energia desconhecido do núcleo do carbono. Outras coincidências incríveis são encontradas nas razões entre as forças físicas, que parecem ter sido "sintonizadas" para  permitir estabilidade de moléculas orgânicas, na razão entre a taxa de expansão do universo e a gravitação (2). Ou seja, modifique a intensidade dessas forças em muito pouco, e o universo como um todo sofrerá variações dramáticas em sua idade, dimensão e taxa de expansão. Há, assim, a questão sobre a idade do universo; se ele tivesse evoluído muito rapidamente, a vida nele não teria aparecido. Finalmente, há relações restritas entre os processo de evolução das estrelas e a própria idade do universo, que garantem que planetas abrigando vida possam existir.

Um ponto de vista espírita para o Princípio Antrópico.

Além de matéria, campos e leis que regem a interação entre os elementos no universo, sabemos que ele é apenas a contraparte material (o chamado "mundo corpóreo") de um "universo" ainda maior. As questões #84, #85 e #86 de "O Livro dos Espíritos" discorrem sobre a distinção entre o mundo dos Espíritos e o mundo corpóreo. Em particular, chamamos a atenção para a questão #86:
86. O mundo corporal poderia deixar de existir, ou nunca ter existido, sem que isso alterasse a essência do mundo espírita? 
“Decerto. Eles são independentes; contudo, é incessante a correlação entre ambos, porquanto um sobre o outro incessantemente reagem.(4)
Isso explica porque a "sintonização" observada na intensidade das forças físicas (e na própria estrutura das leis escolhidas no princípio) ocorreu de fato: para que o princípio inteligente (o espírito) pudesse interagir com o mundo material. Essa simbiose que ocorre entre o mundo corpóreo e o mundo espírita precisa existir para que o princípio inteligente evolua. Essa evolução não se processa, porém, exclusivamente através do mundo corpóreo, mas é intercalada em estágios separados dele.

Portanto, em nossa opinião, o princípio antrópico é uma manifestação da Inteligência Divina e da necessidade do universo abrigar a vida inteligente como manifestação do espírito e aponta para o fracasso da ideia de arbitrariedade e de um universo sem uma causa primária em seu princípio.

A fraca defesa dos céticos

Sendo uma ideia que leva imediatamente a uma causa primária inteligente (que teria "sintonizado" as leis para que a vida aparecesse), ateus e céticos fazem uma defesa precária, afirmando que o princípio é uma tautologia (3), ou seja, uma afirmação garantidamente verdadeira e auto-referente. Como estamos aqui e observamos o Universo do jeito que ele é, somente este universo poderia abrigar vida e, portanto, o princípio é auto evidente. Em outras palavras, se o Universo não fosse exatamente como é, não estaríamos aqui discutindo essa questão (5).

Não é difícil ver que esse recuo a tautologia foge completamente da questão inicial sobre a origem não causal do universo e da aleatoriedade que teria imperado no seu início.

Ao se usar um raciocínio cosmológico e se buscar equacionar o problema da escolha dos tipos de leis que deveriam aparecer no universo primordial, as consequências de se rejeitar o princípio como uma tautologia vem acompanhada da constatação embaraçosa de que o universo que conhecemos e nossa presença nele não passam de uma gigantesca coincidência. De fato, como, de acordo com o princípio do universo sem causa, não haveria nenhuma "sintonização", somente poderíamos estar aqui porque, "por um gigantesco acaso", exatamente as leis que observamos imperaram.

Tenta-se salvar as aparências ao se invocar a ideia de que muitos universos teriam existido e apenas um deles, o nosso, vingou, mas não estamos autorizados a avançar além com essas especulações. O universo que observamos é o único conhecido (como muitos céticos insistem em dizer), aquele que provavelmente já existia desde o princípio e, portanto, na hipótese de ter sido criado de forma aleatória, uma colossal coincidência nos fez aparecer nele, segundo o raciocínio cético.

Referências

2 - Fink J. M. "The Anthropic Principle". Ver: 
3 - Do grego 'tautos', a mesma e 'logos' palavra ou ideia;
4 - Texto segundo IPEAK.
5- S. Hawking (1994) "Uma Breve História do Tempo, do Big Bang aos Buracos Negros". pp. 180, Gradiva, 3º edição.